Cristopher Fernandes, de 26 anos, é um dos jovens que começa a ganhar visibilidade no cinema catarinense. Natural de Maringá, no Paraná, e formado em Cinema e Audiovisual pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UniSul), ele construiu a carreira em diferentes frentes: passou por produções acadêmicas, trabalhou no Florianópolis Audiovisual Mercosul (FAM), atuou no Encontro de Coprodução Mercosul (ECM) e estagiou no setor de Cultura do Sesc Palhoça, na Grande Florianópolis.

Continua depois da publicidade

A soma dessas experiências o levou à direção do próprio curta, O Abutre (2024), que alcançou premiações em festivais internacionais.

Primeiros passos no audiovisual

O interesse de Cristopher pelo mundo audiovisual começou ainda na infância. Desde criança, tinha acesso à televisão em casa, o que facilitou o contato com o mundo fantástico dos filmes.

— Eu assisti Blade Runner de 1982 e fiquei obcecado. Pensei: “Eu quero fazer isso aí” — relembra.

O início da realização do sonho veio dentro da universidade, em produções junto com colegas de curso. Cristopher, por exemplo, foi assistente de direção em Sangria (2024), curta dirigido por Henrique Schlickmann, que circulou em festivais e chegou ao catálogo da Amazon Prime.

Continua depois da publicidade

— Foi quando percebi como funciona o set na prática e a importância do trabalho coletivo. A experiência me marcou e ajudou a definir meu caminho na direção — diz Cristopher.

A partir dali, participou de outros trabalhos acadêmicos, acumulando funções de direção de arte, assistência de produção e assistência de direção. O contato constante com diferentes áreas foi importante para amadurecer o olhar e entender a dinâmica da produção audiovisual.

O Abutre: segundo curta e reconhecimento internacional

O segundo curta do jovem, chamado de O Abutre, foi produzido como trabalho de conclusão de curso e se tornou o primeiro inscrito em festivais. Inspirado em uma parábola de Franz Kafka, o filme acompanha José — interpretado pelo ator natural de Erechim, Welington Hors —, um homem perseguido por uma ave carniceira em meio a uma sociedade apática.

A ideia do filme veio de uma conversa com a professora Ana Carolina Cernicchiaro. Ao mostrar um livro com coletânea de textos de Kafka, ela destacou a narrativa do conto de mesmo nome do curta.

Continua depois da publicidade

— Nossa, essa história aqui é legal, dá para fazer um curta. Não sei quem poderia dirigir, mas eu acho que ficaria legal — disse a professora ao então aluno de cinema.

Filmado inteiramente na Grande Florianópolis, Henrique Schlickmann, que atuou como assistente de direção, destaca a construção visual da obra.

— As locações foram fundamentais para dar o clima que o Cris queria. A estética brutalista e a sensação de opressão urbana traduziram a proposta do filme — diz.

Já o ator Welington Hors reforça a intensidade do processo de atuação no curta:

— Eu nunca tinha lido Kafka e mergulhei no conto. Estar em cena, em espaços cinzentos e fechados, ajudou a criar o peso do personagem — conta.

Continua depois da publicidade

O ator também ressalta o cuidado com a preparação do contexto do filme para quem trabalhava nele, que contava, por exemplo, com uma playlist temática.

Do prestígio local aos prêmios internacionais

Na premiação da própria UniSul, o Fita Crepe de Ouro, Cristopher conquistou mais de 10 prêmios pela produção. Além disso, O Abutre conquistou cinco prêmios internacionais, incluindo Melhor Direção no Hallucinea Film Festival e Melhor Filme de Estreia no Krimzon Horyzon International Film Festival. Já o ator Welington Hors recebeu o prêmio de Melhor Ator também no Hallucinea pela interpretação do protagonista.

Quando receberam a notícia dos prêmios, o sentimento foi de descrença.

— Eu recebi a notícia e fiquei esperando vir um e-mail de engano ou algo assim. Foi bem surreal — conta Cristopher.

A mesma sensação aconteceu com Wellington, protagonista do curta:

— Deu uma importância muito positiva pro filme, porque eu assisti várias obras que estavam concorrendo e tinham umas produções ótimas. Tu ganhar no meio de outras coisas boas é muito legal — conta.

Continua depois da publicidade

Veja fotos de Cristopher Fernandes e do curta

Dificuldades do setor

Apesar do reconhecimento, a produção enfrentou limitações típicas do audiovisual catarinense. O orçamento girou em torno de R$ 19 mil, valor que permitiu pagar apenas os atores.

— A equipe não recebeu como deveria. Essa é a realidade local: temos profissionais qualificados, mas faltam recursos e melhores condições de trabalho — afirma Cristopher.

Para ele, o cinema universitário cumpre papel essencial como espaço de experimentação, mas a transição para o mercado é marcada por obstáculos. Henrique Schlickmann, assistente de direção do O Abutre, aponta uma falta de estrutura profissional.

Continua depois da publicidade

— As diárias muitas vezes passam do limite permitido. É muito diferente do que acontece em São Paulo, por exemplo, onde há atuação mais firme de sindicatos — fala.

Audiovisual catarinense

Na visão dos jovens realizadores, o cinema em Santa Catarina vive um momento de retomada após a pandemia, mas ainda aposta em narrativas consideradas “seguras”, ligadas à memória e ao afeto.

— Há espaço para histórias diversas, mas os recursos disponíveis acabam direcionando para produções menos arriscadas — analisa Cristopher.

Mesmo com os desafios, ele acredita no potencial do Estado:

— Temos paisagens únicas, profissionais qualificados e boas histórias para contar. O próximo passo é garantir que esse trabalho saia do ambiente acadêmico e chegue ao público em escala maior.

Continua depois da publicidade

*Sob supervisão de Luana Amorim

Leia também

O motivo inusitado que levou a BR-282, em Florianópolis, ser totalmente bloqueada

Entenda a polêmica envolvendo Fernanda Torres e “mal entendido” sobre filme brasileiro no Oscar

Chocolate fabricado em Florianópolis ganha prêmio nacional e entra para os melhores do país

As principais mudanças que ocorrerão na Ilha do Campeche, o “Caribe Catarinense”