Na casa de Vanessa Engelmann, 35 anos, a expectativa neste fim de semana é pelo nascimento da primeira filha, Catarina. Ela completou 40 semanas de gestação na sexta-feira e, apesar da iminência de entrar em trabalho de parto, a tranquilidade a acompanha na maior parte do tempo. Apesar de mãe de “primeira viagem”, ela é obstetra, e isso garante o elemento mais importante para que ela sinta-se segura: a informação. Vanessa sabe, no entanto, que, na hora do nascimento, tudo pode acontecer, e que a experiência não é igual para todas as mulheres.

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— O limiar da dor, por exemplo, muda muito, e não tem como medir isso antes. Já tive pacientes que chegaram sentindo dores de subir pelas paredes e outras que estavam rindo mesmo com nove centímetros de dilatação — recorda ela.

Ter especialização na área e a experiência de vivenciar a gestação e o parto de inúmeras mulheres todos os dias também não poupam Vanessa de ter que lidar com as sugestões e os questionamentos da própria mãe, da sogra, das amigas e de todas as outras pessoas que, diante da barriga de grávida, sentem-se no direito de opinar sobre as questões da maternidade. Entre elas, a mais recorrente é a escolha pelo parto normal, decisão que causou espanto até mesmo entre os colegas de profissão.

— No meio médico ainda existe uma cultura muito cesarista. Este perfil está mudando, mas ainda é comum, principalmente entre os profissionais mais velhos — comenta.

Ser obstetra deixa Vanessa imune em apenas uma angústia materna: o bombardeio de informações que o mundo atual proporciona sobre todos os assuntos, e que parece ter um peso maior quando trata-se do aprendizado de trazer uma criança ao mundo. Filtrar os dados, as indicações e os pontos de vista que chegam de forma voluntária, por meio de pesquisas; e espontaneamente, pelas redes sociais; entrou para o índice do guia de lições da mãe moderna. A pressão de ser a mãe perfeita, não apenas para si mesma ou para as pessoas da roda de convivência, mas também para o mundo, tem gerado angústia e pode desencadear até depressão na busca por um resultado impossível: na vida real, fora das redes sociais e das notícias sobre celebridades, a criança não está sempre sorrindo, a casa não está sempre arrumada e o abdômen dificilmente volta ao normal depois de dois meses.

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No consultório da psicóloga Monize Gabriela Santos, é comum entrar mulheres que acreditam estar falhando no papel de mãe, ou em crise com o próprio corpo.

— Elas chegam dizendo “Todo mundo consegue, menos eu. Olha essa mulher, dando de mamar e tirando foto, toda maquiada. O que tem de errado comigo?” — conta a psicóloga.

O parto que ela quiser

Na Maternidade Darcy Vargas, que realiza cerca de 500 partos por mês, há visitas para grupos de gestantes que querem conhecer o local e entender o procedimento onde viverão um dos momentos mais importantes de suas vidas. Além de observar as salas e se familiarizar com os corredores, é a oportunidade de tirarem as principais dúvidas.

— Normalmente, elas querem saber sobre o parto humanizado e perguntar sobre amamentação. E percebemos que conhecer o local antes as deixa mais seguras — afirma a enfermeira-obstétrica Shirley Nunes Tarouco.

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Nos últimos anos, tornou-se comum que as futuras mães cheguem à maternidade com um plano de parto humanizado. Isso significa também que, cada vez mais, a decisão pelo parto normal está ganhando força, depois que as cesáreas tornaram-se uma espécie de “epidemia” – a Organização Mundial de Saúde recomenda que cesáreas sejam apenas 25%, mas ela chegava a 40% no sistema público e 84,6% no serviço privado de saúde. No entanto, esta mudança não é totalmente positiva.

— Tem mulher que queria cesárea, mas, agora, porque todo mundo está falando do parto normal, elas entendem isso como uma cobrança — revela Monize.

Para a obstetra e futura mãe, Vanessa, o importante é a mulher sentir-se segura para vivenciar o parto e ter a opinião respeitada. Segundo ela, há extremistas tanto nos defensores do parto normal quanto entre os da cesariana, a ponto de condenar a escolha. Este tipo de pressão chega a frustrar algumas mães justamente no momento em que estão mais fragilizadas. Pelas experiências na maternidade Darcy Vargas, a enfermeira Shirley concorda.

— Explicamos às mães que estão se preparando para o parto normal para que não venham cheias de expectativas. Se precisar fazer cesárea porque o bebê precisa nascer e não pode mais esperar, ela não pode ficar decepcionada — diz a enfermeira.

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Criação em crise

— Eu gostaria que as mães se preparassem mais antes das coisas acontecerem, mas acho que é impossível, porque é muita informação — comenta a fisioterapeuta Karin Rodrigues, especialista em desenvolvimento infantil.

Ela percebe que a maior preocupação dos pais é com os marcos do crescimento, que tem como base, principalmente, a comparação com as outras crianças. Além disso, as leituras e pesquisas que costumam ocorrer durante a gestação não continuam depois que o bebê nasce. Por isso, a angústia nasce quando os filhos dos outros parecem ter um desenvolvimento mais rápido. Segundo ela, é importante que o estudo sobre a criação dos filhos não só continue, mas também seja mais aprofundada do que as leituras de postagens em redes sociais.

— Um exemplo pontual é a história do “criança não pode namorar” [campanha iniciada recentemente nas redes sociais]. Existe todo um contexto por trás disso, mas a maioria das pessoas não se aprofundou e não compreendeu o que ela significa. E passar a proibir a criança a ter um tipo de comportamento, quando ela tem por natureza reproduzir o que vê em casa, nas ruas — afirma Karin.

Para a psicóloga Monize, o que atrapalha é a fase de modismos, criados principalmente pela cultura consumista de lançar e extinguir ideias em semanas. Diante de tantas dietas restritivas e técnicas de educação apresentadas em sites, blogs e páginas de personalidades, é comum que as mães de primeira viagem fiquem confusas em relação ao melhor caminho a seguir.

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— Nas redes sociais, tudo é muito lindo, mas é apenas uma parte do que o bebê é, do que a família é. Ninguém tira foto para postar no Instagram quando o bebê faz cocô e o cocô vem até o pescoço. Acho que há uma gama de informações que nunca chegariam na gente e isso ajuda mas, ao mesmo tempo, boa parte delas é superficial — lamenta a psicóloga.

O conselho da fisioterapeuta Karin vai de encontro ao que também pensam Monize, Vanessa e Shirley. É importante desenvolver, antes de tornar-se pai e mãe, o equilíbrio de saber que haverá pressão por todos lados e é necessário lidar com ela.

— Você precisa lembrar como foi na sua infância, o que pode reproduzir e o que pode melhorar, mas, para isso, você tem que estar bem. Assim, independemente do tipo de informação que vai receber, não vai se deixar afetar — analisa Karin.