Eterno tributário de seus mestres, de Grouxo Marx a Ingmar Bergman, Woody Allen também coleciona discípulos que pagam tributo a sua obra. Sophie Lellouche, por exemplo. A diretora estreante assina a comédia romântica francesa Paris-

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Manhattan, em cartaz desde o fim de semana no país e uma verdadeira declaração de amor à obra do autor de Zelig, A Rosa Púrpura do Cairo e Match Point.

Começa pela ideia central, inspirada em Sonhos de um Sedutor. Como no filme de 1972, no qual o personagem de Allen recebe conselhos de um fantasma do ator Humphrey Bogart, a protagonista Alice (Alice Taglioni) dialoga com seu ídolo olhando para um pôster dele. Farmacêutica, bonita e inteligente, porém confusa e sem sorte no amor, ela tem um perfil semelhante ao das figuras que desfilam nos longas do diretor nova-iorquino. Tem dificuldade em aderir a certas convenções sociais. Fala com a imagem da parede de seu quarto como se só o sujeito que está naquela fotografia em preto e branco fosse capaz de entender suas angústias.

As “respostas” de Allen às questões suscitadas por Alice são colagens com o áudio de frases de seus filmes habilmente inseridas na narrativa pela jovem diretora. Porém, se esta premissa, bem como as primeiras e inspiradas conversas entre fã e ídolo, são animadoras, o decorrer da narrativa trata de frustrar o espectador com piadas pouco ou nada engraçadas e citações absolutamente forçadas. A principal delas talvez seja aquela em que Alice, seu pretendente Victor (Patrick Bruel) e seus pais (Michel Aumont e Marie-Christine Adam) invadem a casa de sua irmã (Marine Delterme) à procura de provas da suposta infidelidade do marido dela (Louis-Do de Lancquesaing): a cena emula uma sequência de Misterioso Assassinato em Manhattan na qual Allen e Diane Keaton entram escondidos no apartamento de um vizinho, mas sua funcionalidade dramática e sua capacidade de fazer o espectador rir do que vê são ínfimas.

As “conversas” com a imagem de Allen também acabam escasseando com o passar do tempo. Quando parece que Paris-Manhattan vai se afundar num emaranhado de referências que só quebram o ritmo narrativo e tentativas frustradas de se aproximar do humor característico do realizador de A Era do Rádio, no entanto, eis que surge uma libertação. Duas libertações, na verdade: a de Alice, que lá pelas tantas resolve dar uma chance às pessoas reais a sua volta (não se preocupe, isso não é exatamente contar o fim do longa), e a de Sophie Lellouche, que filma com qualidade e, principalmente, com estilo próprio o seu passeio de patinete e vestido vermelho esvoaçante pelas ruas de Paris.

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O final é bom (e aqui igualmente não se entregará o desfecho da história) também por conta de uma aparição de Woody Allen em carne e osso. Para além do impacto de sua presença, seu conselho final é ao mesmo tempo engraçado e emocionante. Pena que, para chegar até ele, o caminho percorrido tenha tantos percalços.