O comandante geral da Polícia Militar de Santa Catarina, coronel Paulo Henrique Hemm, defendeu nesta sexta-feira, 15, que “ataques organizados por facções” passem a ser considerados “ataques terroristas” pela legislação penal. A demanda foi apresentada em forma de questionamento em um vídeo institucional da corporação, veiculado nas redes sociais, em memória do soldado Vinícius Alexandre Gonçalves, assassinado em 15 de setembro de 2016 durante patrulhamento no Morro do Horácio, em Florianópolis.

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No vídeo, Hemm lembra que nesses 12 meses mais de 400 agentes de forças de segurança foram mortos no Brasil. Procurado pela reportagem, o coronel explicou que não foi a primeira vez que tratou do assunto publicamente e defendeu mudanças urgentes na legislação.

– O Código Penal precisa mudar num todo, para que venha ao encontro da população. Atualmente, o código não protege os aplicadores, no caso os policiais, nem a comunidade. Hoje quem comete furto, por exemplo, não é preso. É conduzido e logo está na rua novamente.

Questionado sobre de que forma classificar ataques de facções como terrorismo ajudaria o trabalho da polícia, Hemm respondeu que uma punição “mais severa” desestimularia as ações criminosas. O fato de o assassinato de um policial ser considerado crime hediondo pelo Código Penal, da mesma forma que lesão corporal dolosa de natureza gravíssima e lesão corporal seguida de morte, não é o bastante, segundo Hemm.

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– Sem dúvida, haveria uma pena mais severa. Porque daí um marginal vai pensar duas vezes antes de atentar contra as forças de segurança. Hoje, parece que existe uma normalidade para eles.

Confrontado com definições de terrorismo que aceitam a classificação apenas a ataques contra civis não envolvidos em qualquer tipo de combate, como a adotada pela Agência Central de de Inteligência (CIA), dos Estados Unidos, o comandante geral da PMSC discordou.

– Não entendo assim. E isso não é sou eu. Todas as forças policiais do Brasil pensam igual.

Para o advogado criminalista Leonardo Pereira, que integra o conselho da seccional catarinense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a proposta mistura conceitos diferentes e o Código Penal já contempla punição a todos os tipos de crimes.

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– Terrorismo é uma coisa conceitualmente totalmente diferente do que a gente vê nesses crimes cometidos por facções criminosas. Uma organização dessas é uma reunião de um grupo de pessoas que se associam de forma estável e permanente para praticar diversos tipos de crimes. Já o terrorismo é ligado a algo mais ideológico. A lei brasileira já dispõe de diversos mecanismos para combater crimes e atentados contra a vida, seja de policias, seja de civis.

Pereira concorda com o comandante no ponto de vista da sensação de impunidade, que estimula o cometimento de crimes, mas aponta outras soluções para resolver a questão. Segundo ele, é um erro considerar que alterações no direto penal sejam a solução para a questão da segurança pública.

– O que falta é realmente efetividade, as leis serem cumpridas de maneira rápida. Hoje a pessoa pratica um crime e sabe que não vai acontecer nada. A partir do momento que essa pessoa tiver uma reposta imediata do Estado, a situação muda. É uma visão equivocada achar que o direito penal vai resolver o problema da criminalidade, como se fosse um remédio para o que vemos nas ruas.

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Advogado diz que tratar como terrorismo superdimensiona facções

Para o advogado Sandro Sell, especializado em direitos humanos, a mudança de nomenclatura no momento de enquadrar facções criminosas não vai mudar a situação. Ele lembra que a pena máxima no Brasil já é de 30 anos e prevista para os crimes mais graves, e que a polícia vem fazendo o seu trabalho de combater as organizações.

– Do ponto de vista dos direitos humanos, apelar para termos como esse e generalizar é o primeiro passo para medidas de exceção. E contra isso temos de ser firmes. Temos facções criminosas, mas temos legislação para combatê-las e a polícia está fazendo isso. Não podemos é pensar que mudando de nome vamos modificar as coisas. Isso seria dar uma dimensão de contexto de medo internacional a um problema que é interno nosso, de má gestão do sistema prisional. É claro que alguns métodos podem ser análogos, mas daí a fazer essa comparação, acredito que só vai causar tumulto e justificar possíveis decretações de Estado de Exceção.

Sobre a sensação de impunidade apontada pelo comandante, Sell afirma que esta é uma “falsa polêmica”.

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– Quem prende é a lei, quem solta é a lei. Então, se a polícia não consegue apresentar razões suficientes dentro da lei do Estado Democrático de Direito para alguém ficar preso, não resta outra possibilidade se não soltar o detido. Mas tem outro ponto: o Brasil é o país com a maior taxa de encarceramento do mundo.

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