As praias continuam sendo o destino preferido, mas as longas filas de argentinos nos shoppings e lojas do litoral são um bom termômetro de que o número de hermanos não foi a única coisa que aumentou neste verão. A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo de Santa Catarina (Fecomércio-SC) deve consolidar um levantamento no fim deste mês, mas já adianta que o poder de compra dos nossos vizinhos cresceu entre 45% e 50%, tendo impacto direto no balanço da temporada.

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A melhor condição econômica para gastos no exterior é creditada principalmente à desvalorização do real frente o dólar norte-americano, que tradicionalmente é a moeda usada nas reservas financeiras dos argentinos.

?- Eles têm deixado de gastar na Argentina pra vir comprar aqui e isso ajuda a recuperar nossa condição deficitária em função da crise nacional ? diz o vice-presidente da Fecomércio-SC, Célio Spagnoli.

Além do real em baixa, outras medidas tomadas pela Casa Rosada após a posse do recém-eleito Mauricio Macri também beneficiaram o turismo no Brasil. Entre elas está o não pagamento de taxas por parte dos argentinos pelo uso do cartão de crédito no exterior e o fim das restrições à compra de moeda estrangeira na Argentina, entre elas o dólar.

Movimentação histórica

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A expectativa da Secretaria de Turismo do Estado e do Ministério do Turismo é de que 1,1 milhão de argentinos passem por Santa Catarina até o fim de fevereiro ? mais da metade da estimativa de 2 milhões de hermanos em todo o país.

Por via terrestre, em Dionísio Cerqueira entraram mais 64 mil argentinos em janeiro, sendo que em todo o ano passado foram registrados 110 mil atendimentos na aduana, somando entradas e saídas. Pelas fronteiras gaúchas, de onde muitos sobem para curtir o litoral catarinense, foram 103 mil entradas só nos primeiros 15 dias do ano ? 36% a mais do que em 2015. A movimentação já é considerada histórica e tem peso significativo em resultados preliminares apurados por entidades do setor.

? A presença dos turistas argentinos no Estado, principalmente na Capital, se reflete no comércio. Em Florianópolis, por exemplo, o aumento nas vendas já é 25% maior do que em igual período do ano passado ? destaca o Presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas de Santa Catarina (FCDL/SC), Ivan Tauffer.

Nas compras, os visitantes argentinos têm buscado principalmente a confecção. O vestuário de praia é um item muito consumido por eles, conforme a FCDL. Há também procura por lojas de calçados e eletrônicos, além de movimentarem os restaurantes e lanchonetes.

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Filas e corrida às lojas

Filas de veículos, falta de vagas em estacionamentos de shoppings, mesas disputadas nas praças de alimentação e estoques se esvaziando em ritmo acelerado. Essas são algumas das cenas vistas pelas cidades litorâneas de SC nas últimas semanas, sempre com o sotaque espanhol por trás.

Em alguns casos, o movimento foi tão grande que as metas de vendas em janeiro não apenas foram superadas, mas dobradas, como na Decathlon, que vende artigos esportivos.

? Com certeza esse resultado é por causa dos argentinos, tivemos uma verdadeira invasão. Chegamos até a ter certo medo de que faltasse produtos no estoque, de tão grande que foi a procura, mas felizmente o nosso planejamento permitiu que as coisas funcionassem ? comenta José Artigas Cardoso Muslera, um dos gerentes da loja.

Para o cônsul adjunto da Argentina em SC, Otavio La Croce, relatos como este confirmam o recorde de movimentação de argentinos para o Estado e para o Brasil inteiro. Ele ressalta que o cenário já era esperado diante da situação econômica dos dois países e dos desdobramentos das medidas do presidente Mauricio Macri:

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? O câmbio favorável e a eliminação de impostos beneficiaram o turismo. E o perfil é o mais variado possível, desde os jovens procurando diversão ou mesmo um emprego temporário até famílias ricas que já conhecem Santa Catarina e voltam agora com essas condições mais favoráveis.

E não é exagero dizer que Florianópolis e Balneário Camboriú, só para ficar nos dois destinos mais procurados por eles aqui, fazem com que muitos não escondam a vontade de trocar o azul e branco pelo verde e amarelo. Uma recente pesquisa feita pelas empresas de consultoria WIN e Gallup International e divulgada pelo jornal argentino La Nacion mostra que o Brasil é o país preferido para onde os hermanos se mudariam se pudessem escolher qualquer lugar no mundo para viver.

Enquanto isso não acontece, o trade turístico agradece a preferência e a boa e velha tradição de fazer a poupança em dólares.

Crescimento de 15% a 20% nas vendas

Um levantamento da Associação Catarinense de Supermercados (Acats) com empresas associadas que têm lojas na região litorânea do Estado indica que a presença de turistas estrangeiros, principalmente argentinos e uruguaios, tem feito a diferença no resultado das vendas. Ainda não se fala em cifras, mas os estabelecimentos já calculam incremente entre 15% e 20% nas vendas.

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? Sem a presença dos estrangeiros nas praias o desempenho dos supermercados catarinenses seria igual ao ano passado, na melhor das hipóteses, ou até inferior ? destaca o Diretor Executivo da Acats, Antonio Carlos Poletini.

De acordo com a pesquisa da entidade, as categorias de produtos mais consumidas pelos turistas são produtos de padaria e fiambreria, congelados de comidas prontas ou semi prontas, frutas e verduras. A regra é a praticidade, com mercadorias que sirvam bem para refeições rápidas e lanches durante as férias.

Fora das categorias de alimentação, os produtos de higiene pessoal e perfumaria têm a preferência dos estrangeiros. Neste caso, o fator mais importante é o real desvalorizado e o custo-benefício disso para os argentinos, proporcionando compras vantajosas no Brasil para levarem de volta.

Impulsos ao turismo

Três fatores foram fundamentais para aumentar o fluxo de turistas argentinos no Brasil e elevar o poder de compra dos hermanos aqui no país:

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Real desvalorizado

O dólar cotado na casa dos R$ 4 (estava em R$ 3,9 ontem à tarde) foi o principal fator para a movimentação histórica de argentinos. Isso porque, historicamente, as reservas financeiras dos hermanos são na moeda norte-americana, em razão dos constantes temores com as crises econômicas e a inflação. Assim, os investimentos em pesos são sempre cautelosos.

Cartão de crédito

O recém-empossado presidente Macri anulou a sobretaxa de 35% nas compras no exterior com cartão de crédito. A medida de controle cambial foi instaurada em 2013 pelo governo de Cristina Kirchner para impedir a fuga de divisas do país e frear a desvalorização do peso. A mudança de Macri visa a abertura da economia argentina.

Controle do dólar

Logo que assumiu, Macri cumpriu uma das promessas de campanha e liberou a compra de dólares na Argentina. Desde 2011 havia controle das despesas em moeda estrangeira, estabelecido pelo governo Kirchner também com a intenção de evitar a fuga de divisas do país. Até dezembro de 2015, havia limites para compras em dólar e quem fosse viajar precisava pedir autorização do governo para adquirir a moeda estrangeira, entre outras restrições.