Depois da consagração com Entre os Muros da Escola (2008), o diretor francês Laurent Cantet foi aos EUA – na verdade, ao Canadá, onde reproduziu as ruas da pequena Hammond, Estado de Nova York, nos anos 1950 – para rodar seu primeiro filme inteiramente falado em inglês. Mas Foxfire – Confissões de uma Gangue de Garotas, que estreia hoje, é um projeto autoral, de caráter político e protagonizado por atrizes estreantes, não profissionais em alguns casos – tudo aquilo que já se podia ver em sua obra pregressa.
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Se não é um filme hollywoodiano, Foxfire também não é daqueles títulos herméticos em sua elaboração formal. É de maneira convencional que Cantet narra a história da irmandade feminina, usando a narração de uma de suas integrantes, Maddy (Katie Coseni), como fio condutor da trama. Foxfire, na verdade, é a segunda adaptação do romance homônimo que Joyce Carol Oates dedicou ao grupo (a primeira, de 1996, tinha Angelina Jolie no elenco), formado com propósitos nobres, mas desvirtuado por suas ações criminosas.
Cantet é intencionalmente provocativo ao mostrar o grupo, inicialmente um quinteto, depois um septeto, sendo vítima de abusos diversos, típicos de uma sociedade em transformação como aquela dos Estados Unidos da década de 1950. Há bullying na escola, preconceitos de gênero, até um estupro no qual a vítima sequer se sente à vontade para contar aos outros a agressão sofrida, tamanho machismo vigente.
Quando elas se reúnem buscando conforto uma na outra, é como se o cineasta tirasse o tapete do espectador. Lideradas por Legs (Raven Adamson), garota órfã de mãe que foi abandonada pelo pai, as meninas passam a cometer pequenos crimes, como furtos de homens mais velhos que elas próprias seduzem – o que serve ao mesmo tempo como vingança e forma de subsistência, sobretudo depois que elas são expulsas do colégio em que estudam e se isolam em uma casa como se fossem uma comunidade alternativa pré-movimento hippie.
Graças à empatia das personagens e à disposição oportuna de informações contextualizadoras (o diálogo com o padre veterano da I Guerra Mundial, a maneira como relações familiares são apresentadas), a ambiguidade de sentimentos despertados não afeta o tom denuncista do filme. Além do humanismo admirável, Foxfire é belo visualmente, com sua fotografia de tons pastéis a registrar a falta de luz daquele contexto de tanto obscurantismo. Fosse formalmente menos careta, Cantet teria feito um trabalho tão marcante quanto seu longa anterior.
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Foxfire – Confissões de uma Gangue de Garotas
(Foxfire)
De Laurent Cantet. Com Katie Coseni, Raven Adamson, Alexandria Ferguson, Ali Liebert, Claire Mazerolle, Joris Jarsky e Lindsay Rolland-Mill.
Drama, Canadá/França, 2012. Duração: 143 minutos. Classificação: 16 anos.
Estreia nesta sexta-feira em Porto Alegre.
Cotação: 3 estrelas (de 5).