Todos os dias, cerca de 100 mil veículos cruzam a ponte que liga a Ilha ao Continente, em Florianópolis. O homem que batiza a obra, no entanto, pouco a atravessa. A última vez foi em junho do ano passado, para ir à festa de Santo Antônio em sua Laguna natal. Prestes a completar 90 anos no próximo dia 20, ele reserva as raras saídas do apartamento onde vive com a mulher Daysi no centro da Capital para acompanhá-la a algum café ou saborear o filé com fritas no restaurante Lindacap. O passo é devagar, a memória às vezes falha, mas o humor permanece intacto.
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— Quando um estudante interrompeu a aula que eu estava dando em São Paulo dizendo que o rádio havia acabado de anunciar meu nome como o novo governador de Santa Catarina, pensei: eu? E me preparei para levar aquela vaia — lembra Colombo Salles de como soube de sua indicação para o cargo em 1970.
O então diretor do Departamento Nacional de Portos e Vias Navegáveis tinha razão em se surpreender – e não apenas com os aplausos recebidos dos alunos após a notícia. A política catarinense era dominada pelas famílias Konder Bornhausen e Ramos, ambas aninhadas no partido que dava sustentáculo ao regime militar vigente no país, a Aliança Renovadora Nacional (Arena). Pela lógica, para suceder Ivo Silveira na chefia do Executivo estadual seria nomeado alguém de um dos dois clãs, jamais um técnico que morava em Brasília e nunca havia ocupado cargo político.
O engenheiro escolhido porque (segundo as entrelinhas da história) os generais não queriam dar tanto guarida aos próceres locais saiu-se melhor do que a encomenda. Antes de tomar posse, em 1971, Colombo tratou de percorrer o Estado para se inteirar das demandas de cada região. O giro originou o Projeto Catarinense de Desenvolvimento, plano de governo apelidado de ¿carnê fartura¿ devido ao volume de recursos que sua concretização exigiria, incluindo a construção de uma segunda ponte para desafogar o trânsito já intenso demais para a velha Hercílio Luz.
Colombo deixou o governo em 1975, não sem antes antes inaugurar a travessia com capacidade para 60 mil veículos diários (nos dois sentidos) em 8 de março daquele ano. Mesmo contra sua vontade, a Assembleia Legislativa o homenageou dando seu nome à gigante de 1,2 quilômetros. Durante sua gestão foram implantadas também 85 mil linhas telefônicas no Estado, entre outras realizações como o aterro da Baía Sul (¿hoje totalmente descaracterizado do planejamento original¿, reclama) e as rodovias SC-401 e SC-404.
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Longe do poder, ele foi lecionar na Engenharia da UFSC, pela qual se aposentou. Da época de governador, restam as condecorações e diplomas que abarrotam paredes e prateleiras do escritório que mantém em casa. Proibido de trabalhar por recomendação médica, Colombo preenche o tempo com biografias, música clássica e os eventuais passeios com a esposa – a não ser em datas especiais, quando a família composta por três filhos, sete netos e dois bisnetos se reúne ao redor do patriarca, um sobrevivente de doenças que não gosta nem de mencionar.
— O segredo da vida é a simplicidade. Estou enganando o pessoal lá de cima — ensina, levando o indicador à boca em gesto de silêncio.