Pesquisa realizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), divulgada nesta semana, mostra que 5,8% da população brasileira sofrem de depressão. E 9,3% dos 210 milhões de brasileiros vivem com ansiedade. As duas doenças são características da contemporaneidade aflita, de sociedades mal resolvidas, de coletividades incapazes de se darem por satisfeitas com o que têm ou como vivem. Nos dois casos, os índices apurados para o Brasil são os mais altos entre todos os países da América Latina. No caso da depressão, o índice é 18% superior ao de dez anos atrás. Supera, com folga, os do Paraguai, da Colômbia e Uruguai, também nações doentes.
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Desarranjos familiares, desemprego, má qualidade de vida, ambientes sociais desfavoráveis e crescente exigência por cumprimento exemplar de papéis sociais múltiplos nos deixam impacientes. E, em meio a uma sociedade que faz inúmeras cobranças e centra seu comportamento competitivo via desejos por padrão de consumo elevado, e na imitação do alheio, a falta de perspectiva para o futuro imediato aguça sintomas e /ou desperta a incidência dos problemas psicossomáticos.
O Brasil é, desde a concepção de seu processo (in)civilizatório, um mundo de desigualdades. Castas, estamentos, donatários, exploradores, latifundiários, famílias poucas _ e bilionárias _ nos conduzem há 500 anos. Isso aconteceu no começo do Império, seguiu pela era da Primeira República, reorganizou-se a partir de processo de industrialização e transformou-se, mais ainda, com a urbanização e a inserção da Nação no modelo capitalista de vida nos últimos 50 anos.
Se você, leitor, me acompanhou até aqui e está se perguntando o que isso tudo tem a ver com a realidade joinvilense, peço um pouco mais de atenção para o que segue. Essa digressão toda, claro, tem um propósito. Serve para dar substrato aos argumentos subsequentes.
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Sim, Joinville está inserida neste ambiente de forte pressão por desempenho nas atividades profissionais que cada um exerce. A situação econômica adversa, experimentada ao longo dos últimos quatro anos, tanto por empresas, como, em especial, pelas famílias de trabalhadores, deixa no ar felicidades rarefeitas. E desencantos cotidianos. O endividamento galopante é apenas um dos aspectos práticos que explicitam maus humores e instabilidades emocionais percebidas nos olhares e na forma de as pessoas se comunicarem.
Atenho-me a este ponto do endividamento por uma razão bem simples: dever sem poder pagar é uma dor que, no acumulado do tempo, deixa raízes profundas de desassossego na alma. E isso, rapidamente, evolui para atitudes irascíveis no dia a dia. Também cria todas as condições para a chegada da desesperança. Como sabemos, a desesperança é o lado sombrio da alma a evocar emoções negativas. Um elemento explosivo a nos guiar, como sociedade, para rumos obscuros.
Vejamos tão somente um comparativo numérico.
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Em janeiro de 2017, no mês passado, portanto, havia 22.879 famílias joinvilenses sem condições de pagar suas dívidas. Em fevereiro de 2016 – um ano antes – eram 20.792 famílias sem dinheiro para honrar seus compromissos financeiros. O aumento é de 10% de um ano para outro!
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Os números são de levantamento da Federação do Comércio do Estado de Santa Catarina – a Fecomércio-SC. E nos dão a pista de como o sofrimento pessoal tem crescido, abalando estruturas sociais que, à primeira vista, e antes das ruínas provocadas pela falta de trabalho, pareciam minimamente sólidas.
Há mais números. Números ruins. O IBGE revelou, na quinta-feira, dia 23, o estudo da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), retrato mais completo da realidade socioeconômica brasileira. Extraio de lá informações preciosas que nos indicam, oficialmente, a quantas anda o nível de desemprego em Santa Catarina.
Já eram 230 mil ao final do ano passado, contra 118 mil em 2012. Isso quer dizer que dobrou, no período de quatro anos, o total de catarinenses que perderam o emprego. O estudo oficial do governo federal nos diz, ainda, que na base de comparação mais curta, de 2015 para 2016, o acréscimo de desempregados no Estado foi de 55% num só ano. Saiu de 148 mil em 2015 para 230 mil doze meses depois. Tem mais: a taxa de desocupação duplicou desde janeiro-março de 2013 (era de 3,1%, atingindo 6,2% no trimestre outubro-dezembro de 2016.
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No Brasil, o percentual é o dobro, de 12%. Analistas da cena e economistas, com suas réguas econométricas, preveem que o percentual suba mais um ponto, chegando, neste ano, a 13%.
É, a maré não está boa. Em Joinville, os céus escureceram por completo às 15h30 de quinta-feira, com temporal raramente visto e enchente que alagou todas as regiões da cidade, indistintamente. O clima nos deu avisos. Em meio a intempéries variadas – climatológicas, econômicas e psicossociais – os joinvilenses, os catarinenses e os brasileiros precisam mais do que olhar para os céus para sair do sufoco de dívidas impagáveis e superar as desesperanças. Precisamos, como coletividade, resgatar a autoestima perdida com o fim dos milhares de empregos. Enquanto isso não acontece, as farmácias vão vender mais e mais medicamentos antidepressão.