Há uma correlação forte entre doenças e as condições socioeconômicas da população. A frase pode parecer uma obviedade. E é. A partir dela, profissionais joinvilenses da área da medicina e de outras atividades afins chegaram a uma conclusão inescapável: é nos bairros mais periféricos que acontecem episódios de acidentes vasculares cerebrais, os AVCs, mais popularmente chamados de derrames. A constatação, tanto empírica quanto obtida a partir de dados coletados em regiões distintas do município, é de levantamento de informações liderado pelo neurologista Norberto Cabral. Aponta, por exemplo, que nos bairros Paranaguamirim, Adhemar Garcia e em outros seis, a incidência de casos é três vezes maior do que em bairros de região central, como América e Atiradores. Sim, a desigualdade socioeconômica é fator importante no desencadeamento da doença.
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A equipe que levantou os números entregou documento, com as conclusões, à Secretaria da Saúde do município. De posse do conteúdo, a pasta vai colocar em campo profissionais para atuarem preventivamente. Inclusive com participação de agentes de saúde e enfermeiros. O objetivo é agir no combate ao problema antes de eclodir e crescer.
Indicador atual revela que há 90 casos de AVC por 100 mil habitantes em Joinville. Há 20 anos, o número era maior: 110 a cada 100 mil habitantes. Inequívoco sinal de melhora no período. O que preocupa é o aumento de casos com pessoas até 55 anos de idade. Outro fato percebido pelos médicos é o aumento da obesidade entre os joinvilenses.
O grave problema de saúde pública foi analisado, nesta quinta e sexta-feira, num contexto bem mais amplo, de abrangência nacional. Médicos-pesquisadores de Joinville, Canoas (RS), Sertãozinho (SP), Campo Grande (MS) e Sobral (CE) reuniram-se, por dois dias, em Joinville, para trocar informações técnicas e verificar como se pode avançar nas ações voltadas à prevenção da doença e, ao final, reduzir o número de casos. O neurologista Norberto Cabral, de Joinville, anfitrião do encontro de pesquisadores, é claro:
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– O AVC é a doença que mais mata no Brasil. A compreensão da gravidade fez com que alguns profissionais se dedicassem intensamente a analisar a realidade. A persistência fez de Joinville referência nacional no assunto. O município dispõe de registros contínuos desde 1995. Está dado que, ao longo de 18 anos, houve queda de 30% na ocorrência de AVC isquêmico e de 60% do AVC hemorrágico.
O tema merece máxima atenção. Pesquisa realizada pela Organização Mundial de AVC (World Stroke Organization) afirma que uma a cada seis pessoas no mundo terá um acidente vascular cerebral durante a sua vida. O número alarmante é reforçado pelo Ministério da Saúde. Brasília aponta que a cada cinco minutos um brasileiro morre após sofrer um derrame. Isso significa mais de 100 mil mortes por ano.
Neste contexto, fica fácil compreender a importância e a complexidade da situação, e de como tem implicações sobre empregabilidade e produtividade. A melhor maneira de evitar-se o AVC é a contínua prevenção. São conhecidos os fatores clássicos desencadeadores e que potencializam o eventual surgimento da doença: sedentarismo, obesidade, alimentação inadequada, excesso de sal na comida, pressão alta entre outros.
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A partir dos debates e reflexões desta semana, os especialistas das diferentes regiões do País farão coleta de dados com o objetivo de ajustar o fluxo das informações apuradas para confrontar realidades. Uma das vertentes dos estudos a serem desenvolvidas pelo grupo de pesquisadores é compreender se, e em que medida, as origens étnicas (japonesa, indígena, parda etc.) se relacionam ao aparecimento do AVC. Laboratório da Unicamp, de Campinas, fará, depois, a análise das informações obtidas.
Há empenho, mas há dificuldades. O aprimoramento de pesquisas por bolsistas está paralisada porque o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), não repassa recursos, como efeito da contenção de gastos do governo federal.
Se há problemas, também há boas notícias. Retomo a fala do médico Norberto Cabral:
– É fundamental a continuidade do Programa Farmácia Popular por parte da União. As farmácias que funcionam nesse modelo oferecem medicamentos essenciais à população, que precisa tomar remédios para tratar a doença. É um programa de grande impacto social positivo e deve ser mantido a todo custo.
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