*Por Dennis Overbye

Setecentos e quarenta milhões de anos atrás, uma estrela desapareceu em uma explosão de raios X.

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Em 2006, dois satélites, o Observatório de Raios X Chandra da Nasa e o Multimissão de Raios X da Agência Espacial Europeia (XMM-Newton, para abreviar), detectaram o ocorrido como um ponto fraco de radiação vindo de um canto distante da Via Láctea.

Para Dacheng Lin, astrônomo da Universidade de New Hampshire que caça buracos negros, esses sinais eram os restos de uma estrela que havia sido engolida por um buraco negro: sobrava um arco de fogo, como a baba nos lábios da bocarra cósmica.

Tais eventos tendem a ser perpetrados por buracos negros supermassivos, como o que ocupa o centro da nossa Via Láctea. Mas esse sinal de raio X não vinha do centro da nossa ou de outra galáxia.

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Em vez disso, os raios X – o tênue sorriso do Gato de Cheshire de um buraco negro – talvez estivessem vindo da borda de uma galáxia em forma de disco a cerca de 740 milhões de anos-luz da Terra, na direção de Aquário, mas muito além das estrelas que compõem essa constelação.

Isso significava que Lin tinha todos os motivos para suspeitar que havia encontrado uma das criaturas mais raras e mais procuradas do bestiário cósmico – um buraco negro de massa intermediária.

A palavra "intermediária" pode ser um equívoco. Se Lin estiver certo, ele (ou, mais precisamente, aquela estrela azarada) tinha tropeçado em um buraco invisível com a sucção gravitacional de 50 mil sóis. Ele é o principal autor de um artigo, publicado em março no "Astrophysical Journal Letters", que descreve uma perseguição cósmica.

Os buracos negros são a consequência indesejada da teoria geral da relatividade de Albert Einstein, que explica a gravidade como a deformação do espaço-tempo por massa e energia, assim como alguém pesado afunda em um colchão. Muita massa em um lugar específico faz com que o espaço-tempo ceda além do seu limite, prendendo até mesmo a luz em um túnel unidirecional para a eternidade.

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Einstein não gostou da ideia, mas os astrônomos descobriram que o universo está cheio de buracos negros. Muitos são os restos de estrelas massivas que entraram em colapso depois de queimar sua reserva termonuclear. Às vezes colidem, ondulando o espaço-tempo e chacoalhando antenas como os detectores de ondas gravitacionais LIGO. Esses buracos – os sobreviventes estelares – normalmente têm algumas vezes a massa do sol.

No outro ponto das extremidades cósmicas estão os buracos negros supermassivos – pesando milhões de bilhões de massas solares – no centro das galáxias. Seus arrotos produzem os fogos de artifício que chamamos de quasares.

Ninguém sabe de onde esses buracos vieram ou como eles ficam tão grandes. Dois anos atrás, os astrônomos australianos descobriram um buraco negro 20 bilhões de vezes mais massivo que o Sol, que se formou quando o universo tinha apenas alguns bilhões de anos.

Os astrônomos há anos buscam o "elo perdido" nessa linha de monstros mitológicos: buracos negros "apenas" milhares ou centenas de milhares de vezes mais massivos que o Sol.

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"Os buracos negros de massa intermediária são realmente fascinantes, e em certo sentido estão se tornando a fronteira dos estudos sobre buracos negros", disse em um e-mail Daniel Holz, astrofísico da Universidade de Chicago que não fazia parte da equipe de Lin.

"Por que o universo só faria buracos negros grandes e pequenos, e não os medianos? Cachinhos Dourados não ficaria satisfeita. O que torna isso particularmente preocupante para os astrônomos tem a ver com nossas histórias de origem."

Há uma correlação sugestiva entre a massa de uma galáxia e a massa do buraco negro em seu centro: quanto maior a galáxia, maior seu buraco. Isso levou os astrônomos a uma teoria básica de como o universo é construído no escuro: pequenas galáxias com seus buracos "pequenos" se acumulam em organizações cada vez maiores de estrelas, com buracos negros cada vez maiores no centro de tudo isso.

Buracos negros de massa intermediária, pesando centenas ou dezenas de milhares de massas solares, poderiam talvez ancorar o centro de galáxias anãs menores. Mas, como tal, seriam difíceis de encontrar.

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Só notamos buracos negros quando eles se alimentam. Buracos negros de tamanho estelar chamam a atenção para si mesmos enquanto canibalizam seus companheiros em sistemas de estrelas duplas. Seus primos supergigantes se alimentam no centro de grandes galáxias. Mas buracos negros intermediários, que vivem em galáxias anãs, normalmente teriam pouco para comer.

"Só conseguimos encontrá-los quando gás e poeira caem neles. Quando isso acontece, eles brilham menos do que os buracos negros supermassivos, mas geralmente são muito distantes (se não mais), por isso geralmente são fracos demais para nossos observatórios", explicou Natalie Webb, astrônoma do Institut de Recherche en Astrophysique et Planetologie em Toulouse, na França, membro da equipe XMM e coautora do artigo.

Na verdade, eles só são visíveis quando engolem uma estrela, um evento que ocorre apenas uma vez a cada dez mil anos em alguma galáxia qualquer, disse Webb.

Portanto, Lin pode ter tido sorte de fato. A nova fonte, que sua equipe chamou de 3XMM J215022.4-055108, seria apenas o segundo bom candidato conhecido.

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Mas havia a possibilidade de que ele tivesse tido azar, tendo apenas detectado uma explosão em uma estrela de nêutrons densa que sobrou de uma explosão de supernova em nossa própria galáxia.

Usando o Telescópio Espacial Hubble e o XMM para mais observações, Lin e sua equipe rastrearam as emanações de raios X até um nó denso de estrelas de cerca de 80 anos-luz de largura que estava muito além da Via Láctea, nos arredores de uma galáxia distante chamada Gal1.

Por coincidência, os astrônomos que usavam o Telescópio Canadá-França-Havaí em Mauna Kea haviam registrado uma explosão de luz no mesmo local em 2005. Essa foi talvez a primeira mordida fatal.

Além disso, o nó das estrelas se assemelhava precisamente ao que os astrônomos pensavam que o núcleo de uma pequena galáxia se pareceria se tivesse sido engolida por uma maior. Encaixa-se na noção de que as galáxias se formam por fusões.

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"Essa é uma boa notícia, pois se acreditava que, provavelmente, os buracos negros de massa intermediária seriam encontrados em galáxias anãs", observou Webb.

Naquela época, o buraco negro era o centro de sua própria galáxia anã. Agora, era um ninho vazio, pois a maioria de suas estrelas se foi. E estava a caminho de um eventual casamento com o buraco negro maior no centro de Gal1.

"Portanto, as novas observações confirmam a fonte como uma das melhores candidatas a buraco negro de massa intermediária", escreveu Lin no artigo recente.

buraco negro
(Foto: Lin et al. Astronomy and Astrophysics, 2020 via The New York Times)

Este é apenas um dos poucos bons candidatos para os buracos negros considerados elos perdidos. Outro, o HLX-1, foi descoberto em 2009 – por muitos dos mesmos astrônomos – na borda de uma galáxia distante chamada ESO 243-49. Este também está em um pequeno grupo de estrelas que se parece com os restos de um núcleo anão, e pesa cerca de 20 mil massas solares.

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Porém, no caso do HLX-1, os raios X parecem estar vindo de um disco de acreção, o donut de material quente girando na borda de um buraco negro – material que é periodicamente arrancado de uma estrela orbitando o buraco negro.

Webb, que foi a principal descobridora do HLX-1, disse: "A estrela continua voltando para uma posição semelhante e um pouco mais de massa é arrancada e cai no buraco negro. Vimos agora oito feixes de raios X do HLX-1 e o observamos com vários tipos diferentes de telescópio."

A principal diferença com o novo candidato a elo perdido "é que nosso objeto está despedaçando uma estrela, fornecendo fortes evidências de que é um buraco negro massivo", disse Lin em um comunicado divulgado pelo Instituto de Ciência Telescópica Espacial.

Ainda não se sabe de onde vêm tais vórtices gigantescos de um nada faminto. O universo parece precisar de alguma montagem, e os buracos negros são fundamentais, mas os astrônomos ainda têm dificuldade para elaborar a lista de peças.

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Os astrônomos têm uma boa noção de como buracos negros "comuns", de três a cem vezes mais massivos que o Sol, resultam do colapso e das explosões de estrelas massivas. Mas não houve tempo suficiente na história do universo para que tais buracos negros se tornassem milhões ou bilhões de vezes maiores e se transformassem nos buracos negros supermassivos que vemos hoje.

"Eles devem ter se formado a partir de outra coisa", afirmou Webb, ou seja, buracos negros de massa intermediária. Tais buracos se uniram à medida que suas galáxias natais se agrupavam em galáxias cada vez maiores.

Lin concordou que era "popular" acreditar que os buracos negros supermassivos podem se formar a partir de buracos negros de massa intermediária, fundindo-se à medida que suas galáxias natais colidem e também se fundem.

Menos certo é de onde vieram esses buracos negros de classe intermediária – massivos demais para resultar do colapso das estrelas como as conhecemos hoje. Uma possibilidade, sugeriu Lin, era que eles foram criados por fusões desgarradas de estrelas massivas em aglomerados estelares.

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Outra ideia, disse Webb, é que eles são sobras da primeira geração de estrelas no universo. Os astrônomos calcularam que tais estrelas, compostas apenas de hidrogênio e hélio primordiais recém-saídos dos fornos do Big Bang, poderiam ter se tornado muito mais massivos do que as estrelas de hoje, produzindo buracos negros gigantes capazes de se transformar nos buracos negros de massa intermediária.

De fato, alguns astrônomos teorizam que nuvens extremamente densas de gás primordial ou matéria escura poderiam ter colapsado diretamente em buracos negros, pulando o estágio estelar por completo.

Independentemente disso, os buracos negros de massa intermediária são o elo perdido entre buracos negros estelares e supermassivos, explicou Holtz, de Chicago. "Se detectarmos essa população com confiança, ela fornecerá insights sobre como o universo faz todos os seus buracos negros."

Se não, acrescentou, "os teóricos precisarão trabalhar ainda mais para explicar como um universo bebê faz buracos negros monstruosos".

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