Chico Samara recebe a bola de costas e, antes que seu marcador esboce qualquer sinal de reação, toca de três dedos para Fontan. Os locutores de rádio vibram com o espetáculo.

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Em outra jogada, ele avança pela linha lateral e cruza. Em todos os jogos, ele cruza do mesmo lugar – uma placa ao lado do gramado é a sua referência -, e o lance, mesmo que previsível, geralmente tem o mesmo triste desfecho para o adversário: Tonho, o cabeça de fé, sobe mais alto que todos e manda um torpedo para as redes.

O Estadual de 1976 – quando lances como este deixaram a torcida maravilhada – foi o mais importante da história do JEC. O time nasceu campeão e fez a cidade acreditar que a fusão entre Caxias e América foi a jogada certa para deixar Joinville em evidência no futebol estadual.

O estádio do América – palco dos jogos do Catarinense porque o Ernestão estava sendo reformado – ficou pequeno para tanta gente.

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“O homem da curva”, apelido que Chico Samara ganhou por causa dos petardos de três dedos, lembra bem da época. Até hoje, aos 64 anos, ele carrega o mesmo sorriso dos tempos de jogador. E foi com essa alegria estampada no semblante que ele brincava com a bola nos gramados.

-Eu era muito rápido. Eu colocava a bola na frente e era difícil alguém me pegar na corrida-, lembra, enquanto pesquisa a memória.

-Menos o Beto Fuscão, zagueiro que jogou no Figueirense. Eu vi aquele cara barrigudo e barbudo e pensei que seria o meu dia, mas ele foi um dos únicos que conseguiu me acompanhar-, ri Samara, recordando dos confrontos de quando ainda jogava no América.

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Baixinho e atrevido, que deixou o futebol, mas se aprimorou na arte de contar histórias, lembra que no seu tempo o esporte era diferente. Os atletas não ostentavam riqueza. Eram simples – muitos até moravam nos alojamentos embaixo das arquibancadas. Pelas suas contas, calcula que ganhava R$ 3.500 por mês. Mas dinheiro nunca foi um problema para quem encara a vida com simplicidade.

Viajar mais de 20 horas para jogar em São Miguel Do Oeste era cansativo – era preciso atravessar uma balsa para chegar na cidade, mas Samara recorda com alegria das aventuras pelo Estado. O dia em que a torcida fez uma caravana com dezenas de ônibus para assistir a um jogo em Lages é uma das memórias que mais ficaram marcadas no coração do ex-jogador.

O único momento em que o riso dá lugar a um olhar sério na feição de Samara é para falar sobre a final de 1976. O JEC venceu o Estadual em cima do Figueirense, mas uma decisão no tapetão fez com que o Tricolor tivesse que jogar uma nova final contra o Juventus, de Rio do Sul. Aí vem a bronca.

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-Só fizeram aquilo porque era o Joinville. Se o Figueira tivesse ganhado, isso não teria acontecido. Era uma grande politicagem-, reclama, para dez segundos depois abrir o sorriso novamente e falar sobre como era bom jogar futebol.