Amor. Ah, o amor. Ingrediente de tantas histórias, inspiração para poesias e letras de música, combustível para os relacionamentos mais prazerosos. Uma pitada dele e parece que tudo fica bem. No caso da culinária, no entanto, o recomendável é que seja despejada uma boa dose de amor. Isso mesmo, nada de economizar.
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Seja na elaboração de receitas, na escolha dos alimentos, no cozimento dos produtos, na composição dos pratos, enfim, amor é indispensável. E quem diz são eles, os comandantes, os pilotos, os motoristas das cozinhas: os chefs.
Gastronomia, afinal, é a vida de Fabio Mattos, 37 anos. Nas palavras dele, uma combinação de amor pelo que faz e a vontade de fazer. Chef do Restaurante Poco Tapas, em Joinville, ele pensa em comida 24 horas por dia.
Não é muito diferente de Fabiano Mira, 36 anos, da Adega Don Maximiliano. Inspirado pela mãe, desde garoto passava o máximo de tempo que conseguia entre panelas e talheres. Hoje, cozinhar é uma paixão ainda maior.
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Samir Haidar, proprietário do Kib’s Cozinha Árabe, divide a criação dos menus com outra chef, que acompanha a casa desde sua fundação. Para ele, gastronomia é sinônimo de preocupação e afinco, por isso o segredo não pode ser outro que não o amor.
No comando do L’Antipasti Massas, Ludmila Marques, 45 anos, enxerga a culinária como muito mais do que o preparo de uma comida gostosa:
– É o perfume, a aparência do prato, a celebração do ator de comer.
Além da dedicação e carinho pela profissão que escolheram seguir, esses quatro chefs estarão mais próximos do público a partir desta semana, quando inicia a edição de verão do Festival Gastronômico de Joinville.
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Com outras 21 casas, os restaurantes nos quais trabalham ofertarão cardápios diferenciados ao preço de R$ 34,90 por pessoa. As especialidades são variadas, mas eles prometem ao menos uma coisa em comum. O quê? Amor. Ah, o amor.
Especialidade: culinária oriental
Zouhair Haidar sempre cozinhou. Libanês, a culinária oriental é sua especialidade. Nos eventos familiares, em encontros com amigos, é comum que o comando do fogão fique sob sua responsabilidade. Ou pelo menos era assim.
Agora, quem também se encarrega da função é seu filho, o brasileiro Samir. Há doze anos, a dupla abriu o Kib’s Cozinha Árabe e já faz sete que o jovem chefia o restaurante em Joinville. No espaço, há apresentações de dança do ventre, fumo de narguilé e toda a harmonia e alegria árabe. Além, é claro, de pratos típicos da culinária sírio-libanesa.
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– O público dança junto, interage, a gente quer que se sintam em casa – diz Samir.
Em parceria com outra chef, é ele quem elabora o cardápio. Sua principal preocupação é se manter fiel às tradições, respeitando as receitas familiares que deram origem à casa.
Uma vez por ano, em média, ele viaja ao Líbano para visitar a família e aproveita para conhecer o maior número de restaurantes possível. Sua caça por adaptações que possam dar certo no Brasil não para, então a troca de dicas com as tias também é frequente. Neste ano, ele tem ainda viagens agendadas para Dubai, Jordânia e Abu Dhabi.
Por não parar de trabalhar mesmo quando está em férias, fica evidente que seu envolvimento com a profissão é enorme. Um evento como o Festival Gastronômico de Joinville, então, torna-se motivo para mais pesquisas e dedicação.
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Samir enxerga o crescimento do setor na cidade de modo extremamente positivo e aposta com todas as fichas que essa seja uma ideia que veio para ficar.
– Recebíamos muitos turistas. De uns quatro anos pra cá, notamos que o joinvilense está começando a sair mais. Joinville não tinha nada expressivo voltado pra gastronomia, então o festival propiciou a integração entre os proprietários e a divulgação de pratos. Também começamos a sofisticar a gastronomia local: o perfil do município era pizzaria e buffet, e agora ofertamos opções com entrada, prato principal e sobremesa – explica.
Pratos que aguçam os sentidos
Inspirado pelo próprio estômago, Fabio Mattos compra aquilo que lhe parece bom. Se uma mistura soa saborosa a seus ouvidos, corre para a cozinha criar uma nova receita. Se a época do ano é propícia para determinado ingrediente, ele é favorecido entre os pratos do chef que dirige o Restaurante Poco Tapas.
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O que quer mesmo é aguçar os sentidos dos clientes, assim como, para ele, a gastronomia é uma extensão de seus sentimentos. Paciência e um excelente paladar são essenciais num chef, diz Fabio.
Embora trabalhe com culinária molecular, enxerga o peso forte que o regionalismo tem ganhado na preparação de alimentos. Apesar dessa tendência, no entanto, os profissionais são pouco valorizados no Brasil, acredita. A menos que sejam famosos, não ficam envoltos no glamour que se imagina sobre um chef de cozinha. São muitas horas de trabalho para pouco dinheiro, segundo Fabio.
Pesquisas, pesquisas e mais pesquisas, mesmo fora do restaurante se mostram necessárias. Fabio costuma procurar por fotos na internet e elaborar os próprios pratos com base no que parece conter a receita. Com criatividade, ele garante que é possível comer sem gastar muito.
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Na cozinha, não dispensa nitrogênio líquido, liquidificador, processador e batedeira, e diz que não tem como cozinhar sem cebola.
De olho no paladar do joinvilense
Prato inovador, que agrade a clientela, vá de encontro ao paladar do joinvilense e que caiba no orçamento. Pensar no Festival Gastronômico é um desafio, conforme Ludmila Marques, proprietária e chef do L’Antipasti Massas. Mas é justamente a necessidade de estar sempre se superando que a levou para a gastronomia nove anos atrás.
Formada em engenharia química, ela chegou a trabalhar com biotecnologia, depois cursou Publicidade e abriu uma agência. Numa rotina que a faz trabalhar entre 12 e 16 horas por dia, Ludmila se revela satisfeita com a decisão que tomou.
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Nos últimos anos, ela diz que Joinville teve um boom de crescimento, e o setor acompanhou. Hoje, não há espaço para aventureiros, por isso a mão-de-obra é tão escassa. Daqui cinco anos, acredita que poderão colher os frutos das primeiras turmas do curso superior em gastronomia da cidade, com profissionais verdadeiramente qualificados. Ainda assim, o sucesso do festival já é evidente.
– Janeiro e agosto são meses de baixa nos restaurantes, com pouca opção de lazer na cidade, por isso o evento ocorre nesse período. Temos uma média de 15 mil pratos vendidos por edição em todas as casas, mas o número de pessoas circulando pelos restaurantes é ainda maior. Acredito que o festival já entrou no calendário de Joinville e os moradores esperam por ele – diz Ludmila, que também é coordenadora da Câmara Setorial de Gastronomia.
Das viagens que fez, Ludmila conta ter tirado uma lição importante: um chef precisa conhecer a culinária da sua região. As comidas famosas do mundo, ela explica, são aquelas vindas do campo, do povo mais pobre. No Brasil, os pratos típicos não são valorizados, o que ela considera um erro.
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– O joinvilense não conhece o sabor do mangarito, não cria muitas receitas com caranguejo, que é daqui. Em Santa Catarina, poderiam ser mais explorados a ova da tainha, as ostras, o rollmops.
Comida com gosto de infância
Aquele restaurante escondidinho numa viela qualquer, com um cheiro irresistível saltando às narinas, onde não é preciso nem provar o alimento para saber que ele tem gosto de infância. É assim, nesses cantos do mundo que Fabiano Mira gosta de buscar inspiração para suas receitas.
Chef da Adega Don Maximiliano, uma casa de vinhos, ele procura aliar a sofisticação do ambiente ao paladar caseiro e regional. Essa tendência de buscar as origens costuma agradar. Afinal, quem não gosta de degustar aquela comidinha de mãe?
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Mas, para seguir nessa linha, ele precisa fazer mágica com os ingredientes disponíveis em Joinville. Nesse sentido, ele diz que a cidade está engatinhando, o que obriga os chefs a reinventarem pratos em cima do que já foi usado.
– Aqui, não há contato direto com feirante, com colonos. Sinto falta de feiras de rua, bandas de verdura. Produtos importados, especialmente, temos que buscar em São Paulo – relata.
Nesse clima familiar que tanto o cativa, Fabiano também gosta de transformar a cozinha numa grande casa. Apesar da postura profissional, ele se torna um palhaço e aposta nas brincadeiras para alegrar o dia a dia dos outros funcionários. E garante que não basta ser chefe, mas líder.
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– Estou aprendendo todo dia e quero continuar aprendendo. É importante estar aberto para ouvir os outros, ter humildade e não achar que sabe tudo – ensina.