Nos cálculos da oposição venezuelana, ao acatar a decisão judicial que legitimou o quarto mandato chavista mesmo sem a posse de Hugo Chávez, estava um número: 65%. Esse índice de popularidade já teria sido até superado por Chávez, em meio à comoção pelo seu estado de saúde – o presidente convalesce em Cuba depois da quarta cirurgia contra um câncer a respeito do qual pouco se sabe.

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Quem fez tal estimativa de popularidade, foi Luis Vicente León, presidente do principal instituto de pesquisas venezuelano, o Datanálisis. E é com respaldo nisso que León diz compreender a passividade da oposição em relação ao vice Nicolás Maduro, o “príncipe herdeiro” do chavismo.

Leia trechos da entrevista a Zero Hora:

Zero Hora – A atual situação de comoção nacional na Venezuela e a emoção que dela resulta repercutem em termos de popularidade para o presidente Hugo Chávez?

Luis Felipe León – Uma combinação de fatores levou Chávez a ser eleito com 53% dos votos em outubro e agora incrementar a popularidade. Sim, Chávez ficou mais popular. É uma situação clássica após uma eleição, e o momento emocional reforça isso. Há uma realidade subjacente: Chávez foi eleito pela maioria, e sua popularidade cresce. As pessoas estão emocionadas com o líder enfermo.

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ZH – O que se diz é que a popularidade de Chávez já é de 65%. É isso?

León – É mais que isso. Não temos uma medição exata, que poderia ser feita depois de todos esses eventos. Mas sabemos que a popularidade do presidente já supera os 65%.

ZH – A oposição optou por acatar a decisão judicial de corroborar a continuidade, com novo mandato de Chávez sem a necessidade de posse. Essa estratégia está correta?

León – É muito complicada a tomada de posição pela oposição. A margem de manobra é nula. Há três elementos críticos. Em primeiro lugar, o próprio Estado, que tem o dinheiro e o poder. Há, também, instituições que respondem a esse governo, mas que são instituições legais da Venezuela que precisam ser respeitadas dentro de um quadro democrático, não importa se são dominadas (Legislativo e Judiciário têm forte presença chavista). E, em terceiro lugar, a oposição enfrenta uma maioria. Não se trata de uma oposição majoritária que tenta chegar ao poder. Sendo assim, qualquer enfrentamento pode ser interpretado como tentativa de não reconhecer o que quer a maioria. E, além disso, haveria o embate da oposição com um presidente doente. E isso seria muito delicado, poderia ser um fato manipulado pelos adversários. Na Venezuela, há muito tempo não é importante quem tem razão, mas conseguir quem lhe dê razão. Poderia passar a imagem de que há uma tentativa de se aproveitar da situação, da enfermidade. Sentimentos poderiam ser feridos, sobretudo sentimentos do eleitor. Uma ação opositora, mesmo na defesa de direitos, poderia ser mal interpretada. Pareceria uma tentativa de ignorar a vontade popular e uma situação de doença do presidente. Poderia gerar bloqueios futuros a quem tentasse desafiar Maduro. A oposição pode protestar, mas suas possibilidades de ação são limitadíssimas.

ZH – Para muitos, a decisão do Judiciário era a mais adequada, jurídica e politicamente. Para outros, a Constituição foi violada, porque um mandato termina e precisa haver a posse para se iniciar o seguinte. A oposição acaba, apesar do discurso, acatando a primeira hipótese. Que imagem isso passa?

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León – O chavismo usou o direito do povo que elegeu Chávez como argumento e buscou respaldo na Corte Suprema, cuja sala constitucional não emite veredictos contrários ao governo há 10 anos. Então, usa o controle institucional e permite que Chávez permaneça em Cuba sem limite de prazo. Usa uma tese inédita de continuidade administrativa para ratificar a indicação do vice-presidente e do gabinete, apesar da ausência de Chávez. Mas, como eu disse antes, a oposição não tem margem de manobra, não tem muito para onde ir. O que ela pode fazer? O utilitarismo vai reforçar o poder de Maduro, que continuará dirigindo o país e vai se consolidar no poder.

ZH – Qual a estratégia do chavismo ao indicar Maduro como presidente interino e eventual candidato em caso de nova eleição?

León – A interpretação flexível da lei para manter Maduro no governo quando o correto seria que Diosdado Cabello (presidente da Assembleia Nacional Legislativa, que, em caso de ausência permanente de Chávez, assumiria interinamente com a convocação de novas eleições no prazo de 30 dias) ficasse como presidente interino até novas eleições se deve, principalmente, à vontade de fazer de Maduro o príncipe herdeiro de Chávez. A presença de Maduro, com o respaldo de Chávez, também evita que as fissuras internas apareçam. Se Cabello assumisse a presidência, elas poderiam aparecer.

ZH – Como o senhor analisa o futuro político da Venezuela?

León – Bem, a Venezuela tem uma democracia imperfeita que se baseia unicamente em eventos eleitorais. Anyway, teremos um momento eleitoral em breve, que pode ser atrasado, mas não evitado. E a oposição vai se apresentar novamente, mas as probabilidades vão favorecer o governo. Teremos uma continuação da revolução sem Chávez, um chavismo sem Chávez. Vamos ver como isso funciona.

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