Em 2016, os fundadores de uma cervejaria inglesa, a Toast Brewing, em Londres, decidiram recuperar uma receita milenar suméria, que levava não apenas os ingredientes tradicionais da cerveja, como cereais, levedura e água. Ela também levava pão. O ativista ambiental Tristram Stuart, e a especialista em sustentabilidade Louisa Ziane pensaram em reaproveitar fatias de pão desperdiçadas por fábricas e supermercados para venderem garrafas de cerveja produzida com resíduos de pão das padarias londrinas. As informações são do g1.
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O lançamento da Toast Brewing foi recebido calorosamente, transformando a cerveja em uma forma inovadora de despertar as pessoas para uma questão planetária. Em todo o mundo, estima-se que 900 mil toneladas de pão industrializado acabem no cesto de lixo todos os anos. São 24 milhões de fatias de pão jogadas fora todos os dias.
Além disso, cerca de um terço de todos os alimentos produzidos no mundo são perdidos ou desperdiçados. E este desperdício representa até 8-10% das emissões globais de gases do efeito estufa.
— Para nós, esta é uma forma muito interessante de ajudar a indústria britânica da panificação a combater o desperdício de alimentos e a aumentar a consciência entre os consumidores de cerveja —afirma Ziane.
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Os desafios da cerveja feita de pão
Fabricar cerveja com pão também traz os seus desafios. O método exigiu um pouco de adaptação, incluindo um triturador industrial para picar as fatias de pão e cascas de arroz para evitar que o pão se transformasse em uma esponja impenetrável dentro do tanque.
— As primeiras cervejas provavelmente eram um pouco granuladas e talvez se parecessem com um mingau alcoólico — explica Ziane.
A receita final da Toast substitui 25% dos grãos por pão. Com isso, ela economiza 25% do carbono, água e terra necessária para cultivar os cereais. Cerca da metade do impacto ambiental da cerveja ocorre durante a produção do cereais. E o uso de resíduos de pão reduz este impacto.
O professor Stefan Schaltegger, fundador do Centro de Gestão da Sustentabilidade da Universidade Leuphana de Lüneburg, na Alemanha, afirma que o cultivo de cereais prejudica o meio ambiente de diversas formas.
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— Uma categoria importante de impacto é a contribuição para as mudanças climáticas, com as emissões de gases do efeito estufa. Outra categoria de impacto importante é o uso da água e a terceira é… a perda da biodiversidade — explica Schaltegger.
A Toast calcula que, entre 2016 e 2022, o uso de resíduos de pão na sua fábrica evitou emissões equivalentes a 61 toneladas de CO2 (CO2e). O processo de produção é outro fator importante para o impacto ambiental da cerveja.
A redução de energia na produção da cerveja
A cervejaria da Toast usa gás e eletricidade pública, mas a migração para fontes renováveis é uma prioridade imediata da empresa. Sua pegada de carbono em 2022 foi de 206 toneladas de CO2e, que eles pretendem reduzir para zero até 2030.
— A principal questão é o uso de energia, tipicamente de combustíveis fósseis. São quantidades imensas, pois são necessárias temperaturas muito altas e você precisa resfriar a cerveja com relativa rapidez, dependendo do tipo que estiver produzindo — explica Schaltegger.
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Evitar que o pão vá para os aterros sanitários também evita a emissão de metano, que é produzido quando o pão (ou qualquer outro alimento) se decompõe em ambientes com baixo teor de oxigênio. A Toast encaminha todos os cereais e resíduos de pão usados para uma fazenda no sudeste da Inglaterra. Lá, eles são consumidos como ração animal.
— Se você examinar os tempos pré-industrialização, quando você tinha diversos pequenos negócios em locais próximos, você costumava ter um cervejeiro local e uma padaria na porta ao lado. A padaria usava a levedura excedente do cervejeiro e o cervejeiro podia usar sobras de cereais da padaria. Hoje em dia, é muito mais difícil operar desta forma. Mas existe algo realmente encantador no potencial de resiliência criado por esses relacionamentos. diz Ziane.
Veja fotos da cerveja
Caminhos para a sustentabilidade
Ainda há trabalho a ser feito para reduzir essa pegada de carbono. A embalagem, por exemplo, é responsável por uma boa parte do impacto ambiental das cervejas – cerca de 19 a 46% no Reino Unido. E a Toast não é exceção. A embalagem é responsável por até 56% da pegada de carbono da empresa.
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Por isso, a Toast está em processo de substituir suas garrafas de vidro por latas no Reino Unido. Segundo a companhia, a mudança irá reduzir pela metade a pegada de carbono das suas embalagens. A melhor opção de embalagem de cerveja depende das opções de reutilização e reciclagem disponíveis em cada local.
A Toast também elaborou uma receita de fermentação doméstica, que está disponível online para qualquer pessoa interessada em fazer experimentos com o pão velho da sua cesta. Mas o principal avanço será convencer as grandes cervejarias comerciais a incluir pão nas suas receitas.
Com a Toast e seus parceiros tentando fazer com que a cerveja produzida com pão passe a ser o padrão, talvez a cerveja do futuro venha a se parecer mais com a do passado. Menos granulosa, um pouco mais gelada, mas tão adorada quanto a bebida dos sumérios.
— O motivo que nos leva a desperdiçar tanta comida é porque perdemos essa conexão às origens dos nossos alimentos, essa consideração pela natureza e por tudo o que entra na produção da nossa comida, antes de tudo — afirma Ziane.
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*Sob supervisão de Andréa da Luz
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