Desde dezembro, cerca de 60 internos do Centro de Recuperação Nova Esperança (CERENE) de Palhoça, no bairro Praia de Fora, têm acesso a um luxo para os tempos modernos: verduras sem agrotóxico e colhidas na hora. A produção acontece a alguns metros das instalações, onde uma plantação orgânica tocada pelos próprios internos ajuda-os a manter a cabeça longe da dependência das drogas.

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O programa Hortas Comunitárias foi criado em 2003 pela Eletrosul. O propósito é utilizar áreas localizadas sob fios de alta tensão para evitar ocupações perigosas. Hoje, são 36 hortas em funcionamento nos quatro Estados de atuação da empresa (RS, SC, PR e MS), sendo quatro delas em Santa Catarina, presentes em Palhoça, Xanxerê e Joinville.

A iniciativa é voltada à produção familiar, com cerca de mil famílias atendidas nos quatro Estados, mas uma série de fatores fez a nova horta no Cerene, implantada em dezembro de 2013, se tornar uma das mais bem-sucedidas do projeto. Além do clima favorável e do trabalho coordenado, a presença de um técnico agrícola entre os internos na época da instalação turbinou a plantação: em menos de dois meses, a primeira colheita ultrapassava as expectativas e rendia 3 mil pés de alface.

– O dependente químico mais vulnerável perde referências do que é dia e noite, casa e rua, amor ou solidão. Quando ele volta a viver uma rotina com horários e tarefas diárias, fica mais aberto à socialização – afirma Dorival Oliveira Ávila, diretor do CERENE.

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A chamada “laborterapia” é seguida à risca no centro de recuperação e prevê o trabalho, a rotina e a ocupação criativa como forma de driblar futuras recaídas. A horta criada no Cerene costuma gerar alimentos que os internos cozinham ou vendem para ajudar na manutenção do próprio centro. Integrantes também aprendem a agregar valor à produção com compotas, geleias e conservas.

Uma chance de seguir em frente

Depois de cinco anos sem contato com nenhuma droga ilegal, o cozinheiro e morador de Palhoça de 46 anos ainda não havia conseguido se livrar do alcoolismo e cansou de tentar sozinho. Na época, consumia mais de três litros de uísque ou conhaque por dia. Embora tenha ocupado cargos de importância na região, perder o terceiro emprego consecutivo para a bebida foi o ponto final.

(Foto: Hermínio Nunes/Eletrosul/Divulgação)

Foto: Hermínio Nunes/Eletrosul/Divulgação

Há seis meses, ele chegou ao CERENE, de onde planeja sair até o meio de abril. Um colega e ex-interno, o técnico agrícola que se empolgou com a horta, foi quem incentivou o cozinheiro, hoje envolvido pelo projeto.

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– Foi um caminho longo até aqui, não quero refazê-lo – garante.

Embora pareça uma medida radical, o diretor Dorival Ávila acredita que a associação entre substâncias seja uma das maiores armadilhas para o toxicômano. O cigarro, por exemplo, é expressamente proibido dentro do CERENE por ser comum entre consumidores de cocaína, crack e álcool. Os internos que deixam o centro são aconselhados a não utilizar nada que possa levá-lo a uma retomada do antigo vício.

– Quem não quer, acha uma desculpa. Quem quer, acha um caminho – conclui Ávila.