O velório da filha de Marlene Leite foi um dos últimos a acontecer no período noturno nas capelas mortuárias do cemitério São Cristóvão – Coqueiros, no bairro Capoeiras, em Florianópolis. A jovem morreu após um acidente de carro no mês de março, e três meses depois – na manhã desta quarta-feira – a família arrumava a lápide. Alertados por funcionários e conhecidos, mandaram gravar o nome direto no mármore, para não correr o risco de ter as letras de alumínio roubadas:
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– Ia mandar colocar um foto dela com a moldura, mas já sei que vão roubar se deixar aqui. No dia do velório, nos avisaram que era perigoso de noite, mas estávamos muito abalados e não pensamos em outro lugar. Todo mundo que passou a noite ficou se revezando, cuidando dos carros e vendo se não vinha gente estranha -contou.
O velório da filha de Marlene foi um dos últimos a acontecer no período noturno
Abandonado, sofrendo com a ação de vândalos, sem energia elétrica e servindo de dormitório para moradores de rua e usuários de drogas. Esta é a situação do cemitério municipal São Cristóvão-Coqueiros, onde descansam mais de 27 mil mortos em 3,7 mil sepulturas. Todos os dias quando chegam, por volta das 8h, os três funcionários precisam pedir para que os mendigos saiam das capelas, onde deixam lixo, vestígios do uso de drogas e depredação:
– Eles ainda reclamam que a gente é grosso. Mas esperam que eu vá acordar eles com café da manhã? A gente tem que se impor, é cada dia uma situação diferente, toda hora uma ameaça – comenta um funcionário que prefere não se identificar. ?
Furtos constantes
As antigas portas de alumínio na entrada das capelas e do acesso para os túmulos já foram roubadas há mais de dois anos, e o acesso ao cemitério é totalmente livre. Os funcionários trabalham até as 18h, e depois o local vira terra de ninguém. Somente em 2015, a fiação foi roubada duas vezes. A última, dias depois do velório da filha de Marlene, e desde então não foi reposta. O escritório da administração não tem mais janela desde que foi roubada há cerca de dois meses, mesmo com uma grade do lado de fora e outra do lado do dentro. No lugar, a parede recebeu tijolos. A luz funciona pois os funcionários fizeram uma emenda.
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– Já cansei de fazer boletim de ocorrência, enviar relatório para a Secretaria do Continente e chamar a polícia. Outro dia veio um aqui com uma arma de plástico tentar assaltar e tive que colocar ele para correr. A gente arruma e esse pessoal vem e rouba tudo de novo. Ouvi falar que vão fazer uma reforma geral, mas o jeito mesmo é colocar portas que não sejam de alumínio e ter segurança 24 horas – desabafou.
Janela recebeu tijolos depois que foi roubada
Foto: Betina Humeres/ Agência RBS
O coveiro André Luis Pereira de Almeida trabalha há 19 anos no cemitério, e diz que a situação tem piorado:
– Antes tinha mais respeito pelos mortos, não era assim. Além de enterrar os mortos, cuidar da manutenção, ainda temos que espantar esses caras. Até na nossa casinha dos funcionários levaram tudo. A gente tinha micro-ondas, televisão, até a torneira do banheiro foi roubada. Pra esquentar o almoço agora temos que improvisar um fogão – contou.
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Secretaria do Continente aguarda licitação para reforma
O secretário do Continente, Deglaber Goulart, diz que tem ciência dos problemas do cemitério, que infelizmente sofre com a ação de vândalos. Segundo ele, já foi encaminhado para a Secretaria de Administração o pedido de licitação no valor de R$ 318 mil para reforma:
– Vamos priorizar as questões de segurança, levantando o muro e colocando portões de ferro na entrada e capelas. Também estudam a possibilidade de instalação de câmeras de segurança. Depois disso, será feita e reforma geral do cemitério -explicou.
De acordo com o secretário, se tudo correr dentro da normalidade nos trâmites burocráticos, dentro de 70 dias já deve ter uma empresa trabalhando no local.