Esther de Figueiredo Ferraz foi ministra da Educação e de Cultura entre 1982 e 1985. Nomeada pelo general João Figueiredo ainda durante o regime militar, ela deu início à representatividade feminina na Esplanada dos Ministérios, em Brasília. Depois dela, outras 34 mulheres foram nomeadas em sete governos.

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Mas essa tradição foi quebrada 37 anos depois: o presidente interino Michel Temer (PMDB) nomeou nesta quinta-feira 21 homens para ocupar as pastas de seu governo.

– A preocupação dele foi a de criar uma situação para tocar o Brasil para frente. Ele não pensou na qualidade de gênero. Em um segundo momento, vamos ocupar esses espaços, porque temos bastante mulheres competentes. Ele é um homem bastante sensível e acessível. Mas seria hipocrisia da minha parte dizer que não fiquei frustrada de não ter sido contemplada [enquanto mulher representada] nesse primeiro momento – justifica a deputada estadual catarinense Dirce Heiderscheidt, companheira de partido de Temer e que compõe a bancada feminina na Assembleia Legislativa de Santa Catarina.

Para a pesquisadora de gênero do Departamento de História da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Cristina Scheibe Wolff, a medida vai impactar na representatividade das mulheres nos governos — tanto nas cidadãs comuns, quanto em cargos representativos eletivos, como prefeitas, deputadas ou senadoras:

— É um retrocesso. Desde Ernesto Geisel (presidente militar de 1974 a 1979) que não tínhamos um ministério só de homens. Me parece que é um manifesto, que tem impacto educacional. Meninas e mulheres não vão se sentir estimuladas a participar da política. E nós queremos que as mulheres também possam ocupar esses espaços. Para que possam chegar ao alto escalão, ser nomeadas ministras e presidentas — avalia.

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Menos de 10% de parlamentares

A primeira campanha de incentivo à participação das mulheres na política foi feita em 2014 pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Desde o ano passado, com a minirreforma eleitoral, a ação passou a ser obrigatória. Ainda assim a presença é baixa: menos de 10% de parlamentares mulheres, conforme o TSE.

Em Santa Catarina, de 2010 para 2014, houve aumento de 62,6% na candidatura feminina aos cargos do legislativo estadual e federal: de 107 para 174. Mas o Estado nunca ultrapassou a marca de cinco deputadas eleitas.Mestre em Direito Eleitoral pela UFSC, Aline Boschi elenca as razões para esse cenário.

— Mulheres já têm dificuldades de ascender dentro do partido político. Depois igualmente nas convenções partidárias, mesmo que a lei busque garantir maior presença feminina ao reservar pelo menos 30% do número de candidaturas. Mas muitas concorrem somente por formalidade e desistem logo em seguida. O financiamento de campanhas femininas, obrigatório apenas nos pleitos de 2016, 2018 e 2020, ainda tem brechas: não há sanções em caso de inobservância e permite que uma única candidata receba todo o percentual — contextualiza.

O QUE DIZEM

Ângela Amin (PP), ex-prefeita de Florianópolis

—Não há retrocesso. Se há, está na efetiva participação da mulher. Não é o fato de nomear uma ou duas ministras. Nós temos que participar em todos os níveis. O importante é implementar as políticas públicas para as mulheres.

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Luciane Carminatti (PT), deputada estadual

—Além de perder a presidente, perdemos várias ministras, que representavam a participação feminina no governo. É uma onda conservadora tomando conta de parte da sociedade. Estamos regredindo na conquista de espaço, na consolidação e no avanço de direitos.

Ângela Albino (PCdoB), deputada federal

—Acredito que Temer vai colocar alguma mulher em cargo periférico só para dizer que colocou. Mas já é possível afirmar que não haverá espaços de centralidade para mulheres. Essa baixa traz uma distorção na hora de construção de políticas públicas.

Dirce Heiderscheidt (PMDB), deputada estadual

—Eu temeria se fossem abortadas políticas públicas para as mulheres. Na realidade, a intenção é continuar e melhorar. Tem homem que também tem sensibilidade para tocar pastas importantes como a da Assistência Social.

Geovânia de Sá (PSDB), deputada federal

—Nós precisamos de ministros que venham mostrar uma saída para o país. Independente do sexo. Nós tínhamos uma mulher no maior escalão e hoje ela está sofrendo impeachment. Mas vamos tentar que sejam elas sejam incluídas em ministérios faltantes e secretarias.

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