A cidade de Rodeio, hoje com pouco mais de 10 mil habitantes, foi fundada em 1875, no Vale do Itajaí, por imigrantes italianos vindos do Tirol Trentino. Naquele ano, de acordo com a Prefeitura do Município, 114 famílias italianas chegaram ao local, depois de uma longa jornada em navios, trens e carroças.
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Há mais de duas décadas, o médico proctologista Amauri Cadore, natural de Brusque, tenta explicar como um quadro feito por um dos maiores mestres do Renascimento Italiano, há mais de cinco séculos, teria chegado ali. A história, que aparece em reportagem da revista Veja desta semana, se transformou no romance A Descoberta, que Cadore lança na próxima quarta-feira, em Blumenau.
A obra em questão é a Madonna Colonna, pintada por Rafael Sanzio em 1508, na cidade de Florenza. O original reconhecido está exposto no museu Gemäldegalerie, em Berlim, na Alemanha, mas Cadore jura que a tela verdadeira está em sua posse -bem guardada em um cofre de banco.
Em 1987, quando visitava Rodeio durante uma festa italiana, o médico teve seu primeiro encontro com o quadro, então nas mãos de descendentes de italianos. A pintura, ainda que mal cuidada, lhe causou um profundo encantamento, permanecendo viva em sua memória até que, meses depois conseguiu comprá-la por US$ 2 mil, sem ter a menor ideia de que se tratava de uma imagem famosa.
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Pouco depois, no início dos anos 1990, o médico recebeu um cartão de Natal com uma reprodução idêntica à da tela que mantinha em seu quarto. Ligou para a companhia que havia enviado o postal, até descobrir que se tratava de uma imagem da obra de Sanzio. Teve início, então, uma pesquisa incessante por respostas, opiniões, encontros e descobertas, cercada por incertezas e toques de misticismo, que dura até hoje.
– Desde o início da pesquisa, soube que vários museólogos contestavam a autenticidade do quadro que estava em Berlim. Quando encontrei o Pietro Maria Bardi, então diretor do Masp, ele me disse logo de cara, antes mesmo de ver o meu exemplar: aquele que está em Berlim não é Rafael. Depois, veio a dizer que o meu tinha chances de ser original. Hoje, depois de muito exames, laudos técnicos e opiniões, digo que, entre os dois, o que está comigo é o verdadeiro – diz Cadore.
Em posse do médico catarinense, o quadro passou por duas restaurações. A primeira, feita no Brasil, serviu para descobrir a letra R – supostamente de Rafael – em um dos cantos da obra. No segundo restauro, feito pelo italiano Gianmario Finardi, a pintura passou por testes de laboratório para descobrir a época em que havia sido feita.
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Durante os exames, foi detectada a presença de azurita, pigmento amplamente utilizado pelos pintores renascentistas. Mas também foi encontrado o uso do azul da prússia, material popular entre pintores do início do século 18.
A Colonna de Cadore
Em 1993, o médico Amauri Cadore morou durante sete meses da Alemanha, a conselho de Pietro Bardi, para investigar mais de perto a questão da autenticidade da obra Madonna Colonna. Lá, descobriu que o próprio livro do museu menciona críticos que não reconhecem o exemplar berlinense da Colonna. No entanto, é difícil explicar a origem exata do quadro.
Segundo a pesquisa do médico, a pintura teria chegado a Rodeio em 1870, nas mãos de um italiano possivelmente relacionado a uma família de marchands da Europa. Mas o cenário é incerto, já que os imigrantes da Itália que aportaram em Santa Catarina eram em sua maioria trabalhadores, e não membros da alta classe.
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Para a marchand e galerista Helena Fretta, é possível chegar a uma conclusão sobre quem é o autor da pintura, com base no exame feito por avaliadores especializados em detectar técnicas, procedimentos, materiais e outros elementos comprobatórios. Porém, há divergências quanto aos critérios de avaliação, entre os especialistas.
– Alguns peritos internacionais aceitam como prova de autoria apenas alguns retoques, mesmo que o início da tela tenha sido pintado por um discípulo. Outros só consideram originais os quadros de um grande pintor quando é ele quem começa e termina toda a pintura. Nisso consiste, para alguns, uma das maiores importâncias da Monalisa, pois foi comprovado que Da Vinci a pintou integralmente. E Rafael Sanzio está dentro dessa categoria de artistas consagrados, sendo um dos mais importantes pintores da história da arte – explica.
Embora a incerteza oficialmente permaneça, Cadore não tem dúvidas de que possui um tesouro: o último Sanzio pintado em Florenza, exatamente na época do apogeu técnico do pintor renascentista. Caso venha a ser comprovada a autenticidade do quadro, ele diz que pretende compartilhar tamanha beleza com o restante do mundo.
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– Acho este um dos quadros mais lindos da humanidade. Não é justo terminar dentro da casa de um particular. Tem que ir para um museu, mas gostaria que ficasse no Brasil, porque faz parte da história da imigração do país.
Se a Colonna de Cadore, que vive em Blumenau, for realmente um Sanzio, é provável que o médico tenha em mãos não apenas uma relíquia imaterial, mas uma peça cujo preço de mercado exorbitaria qualquer multiplicação dos US$ 2 mil pagos em 1987. Em setembro deste ano, um desenho de Rafael Sanzio foi anunciado para leilão pela Sotheby’s com um valor estimado que ultrapassa US$ 40 milhões.
Agende-se
O quê: Lançamento de A Descoberta, de Amauri Cadore
Quando: dia 5 de dezembro, às 20h
Onde: Teatro Carlos Gomes, em Blumenau ( Rua XV de Novembro, 118 – Centro)
Quanto: evento gratuito
Editora ComPactos
320 páginas, R$ 50 (preço médio)