Aninhar o filho no colo e sentir de perto a respiração da criança é para muitas mães o elo invisível depois que o cordão umbilical é rompido. Ter os pequenos em casa correndo e brincando pelos cômodos representa para os pais tranquilidade e plenitude. Lorenir da Silva Nobrega conhece bem todos esses sentimentos e sempre os valorizou, mas neste mês eles foram potencializados depois de um susto.
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Carregar o Gabriel nos braços agora só é possível porque ele venceu uma batalha pela vida e reacendeu um alerta: a piscina que diverte também exige atenção, como mostra a pesquisa Sociedade Brasileira de Salvamento Aquático (Sobrasa), apontando que o afogamento é a segunda causa de morte de crianças no país.
O menino de apenas dois anos brincava na casa dos avós, em Gaspar, no dia do acidente – em 1o de julho. O olhar atento da mãe e a porta fechada não foram suficientes para evitar que ele caísse na água. Parece, nas devidas proporções, como quando o responsável vai pegar o xampu e a criança vira a banheira sobre si. No momento em que o grito foi dado, o pai, Alan Valney de Souza, saltou na piscina e tirou o menino submerso e desacordado. Começava ali uma luta pela vida do pequeno Gabriel.
Enquanto a ambulância estava a caminho, uma vizinha da família, técnica de enfermagem, fez o primeiro atendimento. Ela jamais tinha vivido uma experiência parecida, mas não hesitou em prestar os primeiros socorros.
– O que eu estava vendo é que ele não tinha mais vida – fala Susana da Silva Scos Daniel.
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Quando o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e o Corpo de Bombeiros chegaram, o garoto estava em parada respiratória. Foi estabilizado, entubado e levado ao Hospital Santo Antônio de Blumenau. Entrou direto na Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
– Se o primeiro atendimento não tivesse sido muito rápido e bem feito, não teria chance –recorda o pai.
Confira as recomendações de segurança do Corpo de Bombeiros
Risco de sequelas depende do tempo sem oxigenação
Três semanas depois do acidente, Gabriel está em casa. Ele ficou seis dias internado e passou por uma bateria de exames. Depois do susto de ver o filho entre a vida e a morte, o momento foi de enfrentar a possibilidade de sequelas. A pediatra intensivista Andrea Ceruti afirma que as implicações, quando ocorrem, são decorrentes da falta de oxigenação no cérebro. Dependendo da gravidade da lesão, a criança pode desenvolver até paralisia cerebral.
– É banheira dentro de casa, o balde. Tem outras situações de afogamento que podem acontecer, não é só a piscina – alerta a médica.
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O chefe de Comunicação Social do 3º Batalhão de Bombeiros Militares e Blumenau, Renan César Vinotti Ceccato, complementa que referências médicas indicam que o cérebro pode suportar de três a seis minutos. Acima desse tempo, os danos podem ser irreversíveis. Depois de 10 minutos, os danos são muito graves e acima de 15 minutos é provável que haja morte cerebral.
– Por isso a importância das compressões torácicas contínuas – massagem cardíaca – até chegada do socorro especializado, mesmo que a pessoa esteja inconsciente, pois estará bombeando sangue ao organismo – orienta.
O filho de Alan e Lorenir não teve sequelas e nem precisa de medicamentos. A confirmação para os pais de que ele estava bem veio no quarto dia de internação. Depois de ver várias fotos da família e não esboçar nenhuma reação, Gabriel reconheceu o irmão de quatro anos que foi visitá-lo. O pai conta que por causa da UTI, a visita não era possível, mas eles insistiram.
– Ele não sorria, não reagia, a gente não sabia se estava bem, mas quando viu o irmão, abriu um sorriso – lembra a mãe aliviada do momento pela recuperação.
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Os dados de ocorrência no Brasil assustam
Os perigos dos afogamentos são traduzidos em números pela Sociedade Brasileira de Salvamento Aquático (Sobrasa). O boletim de 2017 aponta que 17 brasileiros morrem afogados diariamente. Esta é a segunda causa de morte de crianças entre 1 e 9 anos. Aproximadamente 51% desses casos ocorrem em piscinas e residências. Em Blumenau, dois casos reforçam a importância da atenção redobrada para o tema. Em fevereiro de 2016, um menino também com dois anos se afogou em casa. Em novembro de 2017, outro caso. A vítima foi uma criança de um ano e oito meses.
Lorenir conhece histórias semelhantes e que não tiveram um final feliz. Por isso, o sentimento que fica para toda a família é gratidão a todos que auxiliaram no momento difícil.
– A gente começa a ter uma visão melhor da vida, aí você vê o que é importante e o valor das pessoas. A gente precisou e tinha tanta gente fazendo o melhor pelo nosso filho por um salário que às vezes é pouco – desabafa a mãe de Gabriel.
Apesar dos dados preocupantes, o chefe de Comunicação Social do 3o Batalhão de Bombeiros Militares César Vinotti Ceccato afirma que a piscina não deve causar medo nas pessoas. Pelo contrário, deve ser vista como um ambiente amigável, desde que se busque capacitação física para nadar e conheça suas limitações. A afirmação vai ao encontro do que pensa o pai de Gabriel. Para ele, ensinar os filhos a nadar é uma alternativa para prevenir ocorrências do gênero.
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– Com certeza é uma excelente prevenção, porém, sempre orientar sobre os riscos, pois a criança pode se encorajar – diz Ceccato.
O sentimento de culpa não deve ser levado adiante
A psicóloga Catarina de Fatima Gewehr explica que o sentimento de culpa que envolve as famílias envolvidas em situações do gênero é consequência de uma experiência cultural de responsabilização, que dificilmente é administrada da maneira correta.
Porém, enfatiza Catarina, levar adiante o remorso não é uma maneira saudável de tratar uma ocorrência traumática.
– A culpa é uma fixação no passado, no “eu deveria ter feito isso, deveria ter feito aquilo”. O passado já foi. Nada muda o que aconteceu. O único modo de tornar a vida possível é olhar o futuro de modo otimista, de se empenhar para que a vida funcione bem – recomenda a especialista.
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Para ela, muitos dos desconcertos acontecem em função de não ter tempo de olhar e ponderar com serenidade tudo o que precisa fazer:
– Em decorrência disso, a chance de situações “não boas” acontecerem aumenta bastante.
Recomendações do Corpo de Bombeiros em casos de afogamento
A Sobrasa disponibiliza on-line um manual sobre emergências aquáticas. Conforme o documento, há diferentes graus de asfixia por água. Eles permitem ao socorrista estabelecer a gravidade de cada caso e definir a conduta a ser seguida. O subtenente do Corpo de Bombeiros Militar, Dirceu Rodrigues, conversou com a equipe do Santa sobre os procedimentos que devem ser adotados por pessoas em situações envolvendo afogamento em piscinas.
Com 33 anos dedicados a salvar vidas e um dos responsáveis pelo treinamento aquático dos soldados, ele faz dois alertas. O primeiro é que a pessoa só entre na água se souber nadar. Caso contrário, o recomendado é jogar algo na piscina para a vítima segurar, se ela estiver consciente. Outra observação é quanto à respiração boca a boca, que deve ser feita com o nariz da vitima obstruído com o polegar e o indicador.