Patrimônio histórico de Florianópolis, a Casa do Vigário, construída há 263 anos nos fundos do Santuário Imaculada Conceição, na Lagoa, está prestes a se transformar em espaço de divulgação da cultura açoriana. Com recursos liberados pelo governo federal para elaboração do projeto de restauro, a Casa dos Açores Ilha de Santa Catarina (Caisc) estuda a melhor forma para captar recursos e executar a obra. Fechado há cerca de 20 anos, o local sofre com a ação do tempo e da chuva.

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Quando entra na antiga casa dos fundos do santuário, o aposentado Irdu Manoel Vicente, 79 anos, volta 40 anos na memória, para a época em que morou no lugar para zelar pelo patrimônio da comunidade religiosa. Na cozinha, ao olhar para o que sobrou do velho fogão a lenha, retorna aos tempos em que ele e a mulher ainda tinham os filhos pequenos e ao pé do fogo fugiam do frio do vento sul.

_ Essa casa era muito boa, fui muito feliz aqui. É uma pena estar se estragando assim, com essa parte da frente desmoronando. Sinto saudades da minha vida aqui _ recorda.

Construído para receber a família zeladora da paróquia, com a condição de reservar um quarto para o padre por duas ou três vezes ao ano, o lugar é chamado de Casa do Vigário. O religioso vinha da Trindade à cavalo para celebrar festas religiosas e dar os sacramentos. Foi assim que seu Irdu foi batizado e se casou na Igreja da Imaculada Conceição há mais de cinco décadas antes do espaço ser alçado a santuário.

O local, somado à igreja e à Capelinha do Espírito Santo, integra um conjunto arquitetônico de inspiração açoriana colonial. Construído em 1750, foi tombado pelo Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis em 1975 como patrimônio histórico. Seu Irdu nem lembra mais quem foi o último a morar lá, só sabe que há pelo menos 20 anos a casa está fechada. O tempo foi danificando as telhas, abriu goteiras e se encarregou de causar estragos nas paredes, janelas e assoalho.

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_ A água da chuva provocou um inchaço nas paredes com alvenaria de pedra e barro, o que ocasionou o desmoronamento de uma parte da fachada _ explica o arquiteto Jonathan Marcelo Carvalho responsável pelo projeto de restauração.

Apesar de estar nas dependências da igreja católica, a casa é uma responsabilidade da Caisc desde 2010.

_ Restaurar o local não é de competência da mitra diocesana, foi entregue em comodato por 15 anos à associação que trabalha para captar recursos e melhorá-lo _ esclarece o pároco Valdeci Vieira.

Casa tem alcova para proteção em tempos de guerra

A construção de 1750 está dividida em cinco ambientes _ uma cozinha, com piso de tijolos de cerâmica e fogão à lenha, dois dormitórios e uma alcova (quarto sem janelas, a prova de invasões, útil em tempos de guerra e para trancar as filhas solteiras).

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Com influências da arquitetura colonial portuguesa, tem paredes de alvenaria de pedra e barro. A cobertura é de madeira e telha de cerâmica com estilo português. As paredes do interior da casa foram feitas de pau a pique, revestido por fibras de palmeira entrelaçadas e barro.

A cor é dada por argamassa a base de cal. O piso é de tabuado corrido. As janelas são de duas folhas de madeira com postigo, tranca horizontal para dificultar a abertura externa.

Execução da obra depende da captação de recursos

O projeto de restauro para transformar o ambiente em espaço cultural açoriano recebeu recursos do governo federal para elaboração. O custo foi de R$ 110 mil.

Além da restauração, contempla projetos complementares, que compreendem projeto elétrico, hidrossanitário, exigências de segurança. Estão previstos construção de banheiros, facilitação do acesso para portadores de necessidades especiais e a manutenção da estrutura. Segundo o arquiteto responsável pelo trabalho, Jonathan Carvalho, a execução da obra deve custar em torno de R$ 600 mil.

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_ A restauração é fundamental para divulgar a origem cultural de Santa Catarina. A casa é testemunha dos povoadores açorianos. A próxima etapa agora é conseguir recursos para realizar a obra _ contextualiza a diretora cultural da Caisc, Carin Heloisa Hahn da Silva Machado.

Membro de uma das famílias colonizadoras da Lagoa da Conceição e responsáveis pela construção do conjunto arquitetônico, o empresário Sílvio Souza se emociona com a ideia da recuperação.

_ Meu medo sempre foi que a casa virasse ruína, fico feliz em saber que a memória não será perdida_ comemora.