Michel Temer sabe que dispõe de apenas um tiro para provar que tem condições de restabelecer o clima de estabilidade no país. Acabou a temporada de filas e reuniões animadas no Jaburu. Com a aprovação da admissibilidade do impeachment, a pressão começa. Por isso, ele se programou para fazer, ainda hoje, anúncios no salão leste do Palácio do Planalto. Quer apresentar o novo ministério completo e medidas de impacto na área econômica, inclusive com números de cortes e redução de gastos. Se não começar de maneira firme, com novidades, será o anticlímax:

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– O que não pode ficar é aquela sensação de “eu era feliz e não sabia” – dizia o ex-senador tucano Leonel Pavan (SC), que acompanhava ontem a votação no plenário do Senado.

O Brasil vive o momento histórico do impeachment de um presidente da República e não pode ser à toa. O governo petista chegou ao fundo do poço, tanto na política quanto na economia. A sessão de votação no Senado só demorou porque todos os parlamentares queriam se manifestar, mas o resultado já era conhecido desde cedo. E a presidente Dilma sai derrotada e ainda mais desgastada deste processo. Se não errar, Temer fica até 2018.

Também a partir da aprovação do impeachment e do afastamento de Dilma para cuidar da defesa, o PT retorna para a oposição. Depois de 13 anos no poder, voltará a fazer o que exercia com maestria e virulência. Temer terá no seu pescoço um partido que sabe fazer oposição e que quer recuperar prestígio para se reinventar. Não será fácil para nenhum dos lados.

A favor de Temer há um time de articuladores políticos experientes. Eliseu Padilha, Romero Jucá e Geddel Vieira Lima conhecem as manhas do Congresso de cor. No entanto, o jeito de fazer política continua exatamente o mesmo, na base da barganha. Foi para tentar mostrar que pode fazer diferente, que Temer voltou atrás e resolveu cortar ministérios e deixar alguns aliados mais esfomeados com menos do que queriam. Todas as fichas do peemedebista, no entanto, estão nas mãos do novo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Na capacidade do ex-presidente do Banco Central de Lula estará o céu ou o inferno do presidente interino.

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EXÉRCITO DO IMPEACHMENT

O Palácio do Jaburu destacou um exército de aliados para garantir que a sessão de votação do impeachment não fosse interrompida. Liderados pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR), esses parlamentares conversaram várias vezes com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para que a sessão seguisse. Os discursos, 15 minutos para cada senador, foram desinteressantes até mesmo para os parlamentares que ali estavam. Por várias vezes durante a sessão, o plenário ficou vazio. O Palácio do Jaburu, no entanto, monitorava os movimentos dos senadores. Não queria adiamentos.

Até mesmo a equipe da presidente Dilma se preparou para o desfecho nesta quinta-feira. Ministros foram chamados ao Palácio do Planalto. Ontem, já preparavam o discurso de quem vai para a oposição. Os mais fiéis à presidente, como Miguel Rossetto, afirmam que vão para seus Estados defender a presidente da República. Todos já estão cuidando do futuro.

Para um país que está há um ano e cinco meses parado, qualquer minuto é fundamental. Embora os ritos precisem ser respeitados, há necessidade de agilizar a conclusão do processo de impeachment no Senado.

SANTA INVEJA

Em meio a ternos e gravatas, apareceu uma batina preta. O padre Lázaro Brito Couto, da Arquidiocese de Aracaju, viajou a Brasília no histórico dia da votação do impeachment para levar proteção a alguns políticos e virou sensação nos corredores do Senado. Um rosário foi escolhido para o senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), do qual tem ¿uma santa inveja pela serenidade¿. Para a senadora Ana Amélia (PP-RS), entregou uma relíquia de Madre Tereza de Calcutá. E fez questão de garantir:

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– Não foi nenhum senador que me deu a passagem. Eu paguei, pesquisei passagem bem baratinha.

PREVIDÊNCIA

Um dia antes da votação do impeachment no Senado, Michel Temer promoveu um almoço no Palácio do Jaburu com lideranças de PMDB, PPS e PSDB. Henrique Meirelles, pronto para assumir o Ministério da Fazenda, sentou à mesa com deputados peemedebistas. Além de afastar antigas resistências e antipatias, aproveitou para pedir apoio a uma das tarefas mais difíceis: a reforma da Previdência.

– Vou precisar de vocês – avisou Meirelles.

Aliás, já tem deputado preferindo que temas complicados fiquem para 2017. Às vésperas das eleições municipais, os parlamentares querem distância de assuntos espinhosos.

GAUCHÉRIO

O PTB bancou a indicação do nome do deputado Ronaldo Nogueira (RS) para o Ministério do Trabalho. Ligado à bancada evangélica, Ronaldo estava na lista dos cotados há mais de uma semana, mas enfrentava a concorrência de Benito Gama (BA), até então o nome da preferência do presidente do partido, Roberto Jefferson. Jefferson acabou abraçando a ideia de defender o gaúcho e levou a proposta ao Palácio do Jaburu. O petebista e o líder da bancada na Câmara, Jovair Arantes (PTB-GO), têm sido assíduos nas reuniões com a cúpula do PMDB, negociando a presença do partido na Esplanada. Com isso, são cinco gaúchos na equipe de Temer, contando com Eliseu Padilha (Casa Civil), Osmar Terra (Social e Agrário), Fábio Medina Osório (AGU) e Blairo Maggi (Agricultura). Já tem gente reclamando do gauchério.

CRIADOR E CRIATURA

Uma das ideias do PT é que o ex-presidente Lula lidere a resistência. Isso mesmo. O bunker será formado no Palácio da Alvorada, com a presença de ministros e parlamentares, e a presidente Dilma vai cuidar de sua defesa. Mas aqueles que são lulistas até o fim, que enxergam no ex-presidente a chance de voltar ao poder em 2018, acreditam que Lula deve aproveitar a narrativa do golpe para tentar reerguer o partido. Um plano que até seria possível se o grande líder petista não estivesse mergulhado na Lava-Jato até o pescoço.

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Ontem, até o meio da tarde, ele não havia conversado novamente com a afilhada. A candidatura de Dilma à Presidência foi uma invenção de Lula, que teve sucesso em duas campanhas. Chegou a hora de o ex-presidente também dividir o fracasso com a sua criatura.