A identidade Bolaño
O escritor Roberto Bolaño (1953-2003) deixou catorze mil páginas inéditas, distribuídas em pilhas e pilhas de papel. Seu livro mais famoso, a obra-prima 2666, veio dessas pilhas, assim como o razoável As agruras do verdadeiro tira. Mas a saga das publicações póstumas continua, e O espírito da ficção científica ( Companhia das Letras, 184 págs, R$ 39,90, tradução de Eduardo Brandão) acaba de chegar às prateleiras das livrarias brasileiras.
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Escrito entre 1980 e 1984, o livro já traz o embrião da efervescência juvenil que despontará mais tarde em Os detetives selvagens, outro dos grandes livros do escritor chileno.
O enredo de O espírito da ficção científica investiga a relação dos jovens Jan Schrella e Remo Morán. O primeiro é um ermitão viciado em livros de ficção científica que escreve cartas alucinadas para autores do gênero. Já o segundo, um poeta cheio de esperanças na vida e na literatura que começa a sentir uma pontada do amargor futuro (o personagem aparecerá mais tarde em outros livros de Bolaño).
As expectativas deles enchem a obra com um certo otimismo, ainda que frágil, diante das condições pouco confortáveis que os cercam. Mesmo que não tenha a potência de uma obra como Estrela distante, é um autêntico Bolaño, o que não é pouca coisa.
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A volta do rei
Escrito em 1998 e publicado três anos depois no Brasil, o clássico de Pedro Juan Gutierrez estava esgotado há alguns anos. Mas os fãs do cubano podem sossegar: a Alfaguara anunciou uma nova edição de O Rei de Havana (184 páginas, R$ 39,90, tradução de José Rubens Siqueira) com data prevista para chegar às livrarias no dia 20 de fevereiro.
O livro é a biografia do anti-herói Reynaldo, ou Rey, que perde no mesmo dia a mãe, o irmão e avó, em situações bizarras, e precisa encarar a vida de frente. Internado em um reformatório, Rey segue a moda e instala em sua glande duas argolas, chamadas de “perlonas”. Quando consegue fugir do reformatório, tenta a vida como pedinte, até conhecer Fredesbinda, uma senhora de 52 anos que o ajuda em troca de favores sexuais. Mas não demora até a chegada de Magda, uma prostituta disfarçada de vendedora de amendoins. O texto é marcado pelo coloquialismo, principalmente nas cenas de sexo. É uma história de amor, de dois perdidos numa Havana suja, que culmina numa tragédia kafkiana
Pedro Juan Gutierrez é uma das vozes mais provocadoras da literatura contemporânea. Sua narrativa crua expõe o submundo cubano: golpistas de todas as espécies e prostitutas para lá de espertas, tudo regado a muito rum, salsa e sexo.
Razão e sensibilidade
E um dos melhores lançamentos deste trimestre vem do Japão: A fórmula preferida do Professor (Estação Liberdade, 232 páginas, R$ 43, tradução de Shintaro Hayashi), romance que fez decolar a carreira internacional da japonesa Yoko Ogawa e vendeu mais de quatro milhões de exemplares desde seu lançamento, em 2003.
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Um velho docente de matemática, uma empregada doméstica e o pequeno filho de dez anos formam a trinca protagonista deste sensível retrato.
A desconstrução do viés amedrontador e academicista da matemática, pelo olhar afetivo de quem trafega pelo universo das fórmulas e dos números com o mesmo entusiasmo de uma criança num parque de diversões. Trata-se do personagem nomeado simplesmente como Professor, um velho idiossincrático que, em função de um peculiar problema de memória, vive recluso em casa, dedicando a maior parte de seu tempo a resolver desafios matemáticos propostos por revistas especializadas.
Por ser um sujeito de trato difícil, nenhuma empregada contratada para limpar a casa e preparar suas refeições perdura no serviço por muito tempo. Ao conhecer o filho de uma delas, um perspicaz garotinho de dez anos de idade, o Professor irá revelar que, tanto quanto pela matemática, ele também é capaz de nutrir outra paixão incondicional: por crianças. A partir desse curioso encontro de gerações, Raiz – o apelido que o menino ganha do Professor em referência à raiz quadrada – irá absorver não só o amor por contas e equações, como também valores sobre respeito às diferenças, amizade e tolerância. Uma história verdadeiramente edificante, mas sem sentimentalismos. O livro foi adaptado para o cinema por Takashi Koizumi, ex-assistente de Akira Kurosawa, em 2016.
Mais lançamentos
A coluna preparou uma lista com os principais lançamentos (por editora) deste 2017. Prepare o bolso, pois o ano promete. Confira:
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Aleph
Solaris, de Stanis¿aw Lem
Alfaguara
Romancista como vocação, de Harumi Murakami
A canção do pássaro de corda, de Harumi Murakami
Cobertor de estrelas e Duas praças, de Ricardo Lísias (reedição)
Menina escrevendo com o pai, de João Anzanello Carrascoza
Arte e Letra
Azul, de Rubén Darío
As lembras do porvir, de Elena Garro
Autêntica
Vaca de nariz sutil, de Campos de Carvalho
A chuva imóvel, de Campos de Carvalho
O púcaro búlgaro, de Campos de Carvalho
O espantalho inquieto, de Campos de Carvalho (org. Noel Arantes)
Âyiné
O que é a poesia?, de Paul Valéry
A marca do editor, de Roberto Calasso
Biblioteca Azul
Obras completas – vol. B e C, de Adolfo Bioy Casares (vários tradutores)
História da menina perdida, de Elena Ferrante (trad. Maurício S. Dias)
Fim de caso, de Graham Greene
O progresso do amor, de Alice Munro
A Ilha, de Aldous Huxley
Boitempo
Escritos sobre Brecht, de Walter Benjamin
Caminhos divergentes: judaicidade e crítica do sionismo, de Judith Butler
O Jovem Hegel, de György Lukács
Carambaia
A maravilhosa viagem de Nils Holgersson através da Suécia, de Selma Lagerlöf
O testamento de um excêntrico, de Júlio Verne
Companhia das Letras
Memórias (título provisório), de Ai Weiwei
O rei pálido, de David Foster Wallace (trad. Caetano Galindo)
Como se o mundo fosse um bom lugar, de Marçal Aquino
O lugar mais sombrio, de Milton Hatoum
Noite dentro da noite, de Joca Reiners Terron
Um sentimento estranho, de Orhan Pamuk
Queer, de William S. Burroughs
Editora 34
Contos de Kolimá (vol 6), de Varlam Chalámov
Sátántangó, de László Krasznahorkai
Contos reunidos, de João Antônio
Conversas de Refugiados, de Bertolt Brecht
Estação Liberdade
Ensaio sobre o maníaco dos cogumelos, de Peter Handke
No país do cervo branco, de Chen Zhongshi
Divã ocidental-oriental, de J. W. Goethe
O reflexo perdido e outros contos, de E.T.A. Hoffmann
Com toda franqueza, de Richard Ford
Cartas, de Yukio Mishima e Yasunari Kawabata
Grua
O Cristo recrucificado, de Nikos Kazantzákis
Intrínseca
A brief history of seven killings, de Marlon James
Quatro estações em Roma, de Anthony Doerr
Las cosas que perdimos en el fuego, de Mariana Enríquez
Iluminuras
A idolatria poética ou a febre de imagens, de Sérgio Medeiros
As emas do general Stroessner, de Sérgio Medeiros
Contos frios, de Virgilio Piñera
José Olympio
Pescar truta na América, de Richard Brautigan
Nós
Conto de dois grandes Amores, de Paulo Lins
Projeto para psicomapeamento de Hamlet, de Marcia Tiburi
Lições de vertigem, de Micheliny Verunschk
Baleia assassina, de Cintia Moscovich
Planeta
Tarântula, de Bob Dylan
Múltipla escolha, de Alejandro Zambra
Heather, the totality, de Matthew Weiner
Rádio Londres
O refugiado, de Arnon Grunberg
Marcas de nascença, de Arnon Grunberg
Augustus, de John Williams
Record
A hipótese humana, de Alberto Mussa
Assim na Terra Como Embaixo da Terra, de Ana Paula Maia
Ladainha, de Bruna Beber
O fantasma, de Jo Nesbo
Rocco
Aqui estou, de Jonathan Safran Foer
O ruído do tempo, de Julian Barnes
40 histórias, de Donald Barthelme
10:04, de Ben Lerner
UBU
Metafísicas canibais, de Eduardo Viveiros de Castro