Para Sérgio Linz, genro e causeur indispensável. Os circos mambembes, que pululavam em Florianópolis até 1960, armando-se no largo Treze de Maio, então vago, porque não tinham animais, nem domadores, muito menos trapezistas ou motociclistas no globo da morte, catavam os coadjuvantes pela cidade, particularmente no Mercado Público, pagando-lhes uma merreca, substituindo os espetáculos circenses pelas suas peças teatrais, por atores, igualmente, improvisados.
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E foi lá que o contrataram. Era um mulato atarracado que vivia de fazer carretos das compras à casa dos fregueses e nunca usara calçados de qualquer espécie. Razão do seu gracioso apelido que o deixava furioso, reagindo com violência ao chamado: Chulé!
O Circo Teatro Guarani o contratara para ser centurião romano na peça “Vida, Paixão e Morte de Jesus Cristo”. Os três atos em quinze quadros atraíram enorme público, ainda mais que se estava na Semana Santa, quando havia a Procissão do Senhor dos Passos, descendo da sua capela em direção à catedral para criar clima, percorrendo o Centro da cidade, onde Verônica mostrava o sudário e cantava a nossa dor. Mais da metade da população da Capital se espremia para assistir à tradicional e emocionante cerimônia e os da Opa carregando o andor com o Senhor dos Passos. Uma honra disputadíssima, mas reservada aos membros da Fraternidade, não raro muitos filhos da viúva.
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Um senhor que atendia pelo apelido de Rosa do Adro, porque era catolicíssimo e vivia na missa diariamente, convidou um amigo – o Pau de Apagar Velas – que lhe era par na religiosidade, para ir ao circo e assistir à peça.
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Ao subir o pano e aparecer o Cristo amarrado num tronco, com a coroa de espinhos e brutalmente ensanguentado, foi arrastado, deitado e pregado na cruz, que teria de carregar até o Calvário, pintado no telão ao fundo; foi emocionante. Um legionário romano, empunhando um azorrague, castigou-o aos berros para que se levantasse e carregasse o pesado madeiro.
Na plateia, alguém reconheceu o legionário e gritou-lhe: “Dá-lhe, Chulé!” Era o apelido do carregador do mercado. E este respondeu, deixando o Cristo de lado, quebrando a emoção da cena: “Chulé é a tua mãe!”