A acomodação humana de tempos em tempos é submetida a sobressaltos, não fosse isso o planeta estaria hospedando novamente uns seres esquisitos semelhantes aos dinossauros. O homo sapiens sempre precisou de sacudidas periódicas para não definhar. Ou desaparecer. Na ciência e na arte, duas áreas nem tão incompatíveis, há exemplos emblemáticos. O Iluminismo ensinou os homens a seguir a própria razão e não mais deixar-se levar pelo despotismo eclesiástico e político – papas e reis. Essa clareada no pensamento das civilizações custou algumas guilhotinadas. Mas as rupturas são assim mesmo. Na arte, as profetizações só pagaram micos: a fotografia mataria a pintura, o cinema extinguiria o teatro, a televisão fecharia as salas de exibição, as rádios sairiam do ar… E aí? As mídias eletrônicas vão aniquilar os livros e os jornais? Eu não poria a mão fogo.
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Caro e paciente leitor, você sabe, nada disso ocorreu. Todas as formas de arte e comunicação se reinventaram, voltaram mais fortes e melhores. Uma situação pitoresca nessa avalanche eletrônica é o ressurgimento dos discos de vinil e o redesenho dos equipamentos afins. Paralelamente – pasmem! – os CDs estão desaparecendo gradativamente. Pode?
Ah, sim, o título da coluna: Uber. O aplicativo acaba de completar um mês em Blumenau. Se o Uber é o embrião do desaparecimento dos carros particulares, não sei. Nem arriscaria uma previsão. O Uber, por ora, é apenas uma boa sacudida na instituição do táxi tradicional. Afinal, Uber também é táxi. Minha experiência com o sistema até agora foi bastante satisfatória. Por outro lado, pelo fato de não dirigir e ter me valido incontáveis vezes do taxímetro, posso agora fazer com mais propriedade algumas perguntas ao sistema táxi.
Por que não se empenharam desde sempre na instalação obrigatória do ar-condicionado? Por que torcem o nariz para corridas curtas? Por que topam aplicar a bandeira 2 (concessão da Câmara) na época do Natal? Por que nunca fizeram uma campanha publicitária sugerindo o compartilhamento do táxi em lugar do carro particular? Por que não oferecem preços razoáveis em corridas para o aeroporto? Por que a tarifa aqui é tão alta? Por que o sindicato nunca questionou o sistema patrão-empregado, visivelmente desvantajoso para o motorista? Por que o carro não espera o passageiro (falo por mim) entrar em casa ou no prédio, principalmente de madrugada? Por que a “reserva de mercado” nos grandes eventos, como a Oktoberfest, não permite que os táxis vindos de fora apanhem passageiros?
Em tempo, e importante: fiz muitos amigos taxistas, sobretudo quando era proprietário de agência de propaganda. Então, nada pessoal. É apenas a confrontação de dois sistemas – Uber versus táxi. Mais uma acomodação humana submetida a um sobressalto.
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