No início de outubro, o movimento O Sul é o Meu País divulgou o resultado de um plebiscito feito nos três estados. Os separatistas queriam saber se com o apoio dos habitantes do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul seria possível formar uma nação à parte. Dos mais de 600 mil votantes em 1.278 urnas cadastradas e espalhadas por 386 municípios, o “sim, quero me separar” deu de lavada, 95%. Tenho um palpite: a turma que saiu pra votar foi de alegre. No íntimo sabiam: vencesse o sim, vencesse o não, o day after nada traria de novo debaixo do sol tropical, porquanto a “Suíça Sul-Americana” – lotada no imaginário dos pagadores de impostos pesados e voláteis – jamais acontecerá sem grossa pancadaria. É histórico. Alguém aí aponte uma secessão resultante de gentilezas e salamaleques.

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O enorme Galinheiro Brasil, de especialíssimas idiossincrasias, precisa, isto sim, depurar sua índole. A Lei de Gerson está atavicamente inscrita nas cinco regiões, independente de etnias e desenvolvimento. Nosso DNA traz uma lista com delitos de toda sorte. Outra fronteira, mais uma aduana e passaportes diferenciados apenas gerariam duas seleções de futebol, justo nosso mais forte ponto de união. A independência, declarada fosse, de cara exigiria um urgente acordo bilateral para resolver velhas necessidades recíprocas. Passando a régua, seguiríamos sendo “brasileiros”.

Tensões sempre haverá. Semana passada, jovem senhora foi a um salão de beleza aqui em Blumenau e notou haver uma nova proprietária, de sotaque diferenciado. Enquanto era atendida pela manicure chegou outra cliente, anunciando ser de São Paulo. Ao sabê-la “estrangeira”, a dona do estabelecimento imediatamente se uniu a ela iniciando uma descontrolada e raivosa fiada de desabafos sobre o jeito “duro e fechado” dos sulistas. Entre outros impropérios, enquanto aumentava o sertanejo universitário na caixa, sugeria para quem quisesse ouvir que o pessoal daqui fizesse um tour pelo Norte e Nordeste para aprender a ser gente, ter alegria de viver, dançar e abraçar as pessoas pelas ruas. Ironicamente naquele instante a cidade se preparava para mais um desfile da Oktoberfest.

Penso que o carnaval alemão não deixa dúvidas sobre como nos divertimos e nos abraçamos aqui, especialmente levando-se em conta o encanto dos conterrâneos da proprietária do salão, que não perdem por nada essa folia da alemoada “dura e fechada”. Enfim, já não é mais possível dividir o país entre “nós” e “eles” – como provocou insistentemente Lula. Nossas cores se misturam faz tempo. Com elas, a gastronomia e a música – samba, forró e até o tal sertanejo universitário.

Se nem acertarmos nossa noção de cidadania, não é por causa do “Sexta-Feira Sua Linda” versus “Zicke-Zacke” que vamos dividir o país.

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