Desde sempre, um fenômeno oftalmológico me intrigou sobremaneira: o daltonismo. Como me sentiria se tivesse sido privado da maravilha das cores, ou parte delas? Claro, quem nasceu vendo o mundo predominantemente em escala de cinza de modo algum liga para isso, pois na sua memória visual o efeito da policromia está ausente. Aliás, estranhamente, essa encucação só tem quem vê em cores.
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O daltônico por sua vez aprende a decorá-las. Um bife dificilmente deixaria de ser vermelho antes de ir para a frigideira e, até onde se sabe, não existem gramados azuis. Assim, também aprende que a gema do ovo é amarela; o pó de café, marrom e a seleção holandesa veste camisetas laranja.
Ainda há os providos de um funcionamento parcial dos bastonetes (as células do olho responsáveis pela visão colorida). Um exemplo: o olho pode estar apto a captar o amarelo, mas não vê o azul. Como resultado, o verde – a mistura dessas duas cores – permanecerá amarelo. Enfim, quem tem o privilégio de distinguir as infinitas tonalidades da natureza de quebra ainda consegue saber como enxerga um daltônico (basta manipular a imagem da TV ou as opções na câmera do celular). Talvez por isso se preocupe mais com o daltonismo que o próprio daltônico.
Você, caro e paciente leitor, eventualmente um daltônico, deve estar achando essa conversa meio chata. Concordo. Mas há uma boa notícia por aí. Esta semana recebi por e-mail um vídeo em inglês que muito me impressionou. São situações que mostram a reação de pessoas daltônicas tendo a experiência de enxergar a vida em cores pela primeira vez.
A mágica: óculos especialmente desenvolvidos para este fim. Nas cenas, uma criança tira e põe as lentes repetidamente para comparar o que via antes e o que vê agora. Outra jovem não acredita, leva as mãos à boca, exclama “meu Deus, é realmente lindo!” e chora. O rapaz gesticula, quase grita “é tão real, eu não posso sequer imaginar o quão diferente o mundo se parece!”. Um senhor examina sua camisa e se surpreende, rindo muito, ser ela roxa e verde em lugar de amarela e azul, conforme supunha. Dê uma olhada: bit.ly/OculosDaltonicos
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Revoluções assim, saídas do campo das improbabilidades, inevitavelmente levam a um pensamento: onde estão nossos limites e o que a humanidade, valendo-se da ciência e tecnologia, ainda tem pela frente? É fascinante saber que neste instante há cérebros vasculhando o universo desde as partículas subatômicas até seus inimagináveis confins. Em contrapartida, por azar, um número exponencialmente maior de imbecis pensa em reduzir tudo a escombros.
Bom, pelo menos me conforta saber que dois amigos meus, daltônicos, lerão esta coluna. Um dia, tomara, possamos sentar para falar longamente sobre as diferentes explosões de cores de um pôr-do-sol.