O governo, falido e inepto, pensa em voltar ao voto em papel. Sou desse tempo, quando o folclore rolava solto. Ficava sabendo das divertidas asneiras escritas nas cédulas anuladas – de xingações a declarações de amor aos candidatos – pelo amigo Maurício que, muito jovem, fora convocado para mesário. Uma vez chamado, nunca mais largaram do pé. A cada biênio, lá estava o Maurício de domingo empatado. Ou, no dia seguinte, metido nas apurações voto a voto. Naquela era “romântica”, de urnas lacradas e fortemente guardadas até o escrutínio, sem dúvida havia fraudes, sim. Era do jogo, implícito, todos sabiam. A contravenção é da natureza humana e, mais amiúde, do caráter político.
Continua depois da publicidade
::: Leia outros artigos do colunista Cao Hering
No entanto, era uma guerra campal aberta, física, palpável, passível de suprimir dúvidas por palavras, testemunhas ou mesmo a tapa. Os sufrágios, assinalados com um visível X, eram derramados sobre as mesas apuradoras. Durante a contagem, na hora do vamos ver, um juiz e auxiliares intermediavam, ao vivo, eventuais escaramuças entre os capangas dos partidos. O confronto entre as siglas, limpo ou sujo, deixava rastros analógicos que, por mais camuflados, podiam sempre ser recuperados com maior ou menor vontade. Emoção em todas as etapas. Ao implantarem a primeira urna eletrônica experimental em Brusque (SC) – com direito a alvíssaras no Jornal Nacional – fiquei ressabiado. Sou burro em informática até hoje. Na ocasião, porém, me ocorreram prontamente votações dirigidas, a chance de sacanagens sem pegadas. O que impediria um aparato eletrônico de registrar 8 em se apertando o 5? Pois é… Foram-se décadas, e não há mais grotão “nesse país” realizando pleitos sem as caixinhas mágicas do TSE. Orgulho nacional!
A capilaridade da imensa nuvem eleitoral brasileira, totalmente à mercê de programadores, digam o que quiserem, é convite à mais elementar das fraudes. A fisicidade na escolha do candidato se resume às teclas. Depois, o voto mergulha no enorme e insondável ciberespaço, monitorado pelo seja-o-que-o-programador-apadrinhado-quiser.
A mais analógica e surrada das perguntas: o que fez potências mundiais – de calibre científico e social extremamente mais desenvolvido que o Bananão – nunca adotarem as geringonças? O caro e paciente leitor certamente tem a resposta. Lula, o néscio-mor, vociferou ano passado: “vocês não sabem do que somos capazes para ganhar as eleições”. E o “graduado” Toffoli, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, já é caso de impeachment.
Continua depois da publicidade
Aqui, muitos rotulam o voto em cédula de retrocesso. A discussão é longa. Enfim, seja no papel ou no intrincado sistema binário, teimosamente sempre damos um jeito de sermos retrocedentes.