Marilene Poli, 50, moradora de Palhoça, convive com o câncer há seis anos. Dos seios, a doença evoluiu para a coluna vertebral. O impacto de receber o diagnóstico do câncer de mama em metástase – estágio em que a doença se espalha para outros órgãos, principalmente ossos, pulmões, fígado e cérebro – foi grande. Isso porque após quimioterapia, radioterapia e mastectomia ela imaginava ter superado o tumor, mas as células cancerígenas atingiram os ossos há três meses.
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– Eu não imaginava. Foi difícil superar pela primeira vez, quando veio a notícia que a doença havia se espalhado, eu me desesperei. Mas é preciso continuar lutando. A família e o Grupo de Apoio à Mulher Mastectomizada (Gama) foram fundamentais nesse processo. Hoje está tudo muito bem – persevera Marilene com um sorriso no rosto.
Algumas mulheres já são diagnosticadas com câncer de mama metastático, mas o mais comum é que a metástase ocorra meses ou anos após a paciente identificar o câncer de mama. Segundo o oncologista do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo, Dr. Max Mano, trata-se de uma doença incurável, mas tratável:
– Aproximadamente 40% dos casos de câncer de mama no Brasil são diagnosticados em fase intermediária, quando o tumor está grande, mas ainda não se espalhou. De 14 a 15% das ocorrências são metástase. Esse número é o dobro de países desenvolvidos – avalia.
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Enquanto trata o carcinoma ductal infiltrante (ou invasivo) com sessões de radioterapia e injeção de cálcio para fortalecimento ósseo no Centro de Pesquisas Oncológicas (Cepon), em Florianópolis, a dona de casa faz planos:
– Eu ainda tenho sonhos. Ver meus filhos e netos felizes é um deles. O outro é mergulhar. Eu quero muito fazer isso um dia – conta, deixando escapar algumas lágrimas.
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Mais cinco anos de vida
A situação de Edilene Aparecida Bolkart, 35, moradora do Oeste de Santa Catarina, é mais severa. Ela foi diagnosticada com o câncer de mama HER-2 positivo avançado – forma mais agressiva que acomete 25% das pacientes com tumor nos seios, conforme dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca). Geralmente, o anúncio da doença é feito junto da estimativa de vida:
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– Além do diagnóstico errado, que causou retração em minha mama, me avisaram que terei no máximo mais cinco anos de vida. Isso é muito cruel – conta.
Edilene faz tratamento de controle com injeção venosa de pamidronato anastrozol, medicamento oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
– Ninguém sabe se vai surtir efeito. Mas é o que pode me dar mais qualidade de vida. Quero poder ver meu filho crescer o quanto eu puder – torce.
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As campanhas Por mais tempo e Para todas as Marias, realizadas pela Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama), tentam ampliar a variedade de medicamentos oferecidos gratuitamente à mulher com câncer de mama em metástase. Por meio de ações, principalmente online, as iniciativas querem que as pacientes recebam tratamentos que aumentem tanto expectativa quanto qualidade de vida. A petição disponível no site da campanha Por mais tempo para inclusão de novos remédios é um exemplo das ações.
– Nós já estamos condenadas. Queremos ter opções avançadas para viver mais e com mais qualidade de vida. Queremos tratamento igualitário na rede privada e pública – define a presidente da Associação brasileira de Portadores de Câncer (Amucc), Leoni Margarida Simm, que também tem diagnóstico de metástase.
Leoni também trata câncer de mama que se espalhou para o pulmão. Foto: Marco Favero/Agência RBS
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Novos tratamentos
Tratamentos modernos para enfrentar o câncer de mama metastático são específicos contra o tumor e funcionam como chave e fechadura. As terapias-alvo, foco do que hoje é conhecido como medicina personalizada, atacam prioritariamente as células cancerígenas, resguardando as saudáveis e, com isso, minimizando os efeitos colaterais. Trastuzumabe, Pertuzumabe, Lapatinib e T-DM1 são quatro exemplos desses remédios citados pelo oncologista Max Mano.
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– São tratamentos inovadores da medicina personalizada. O quinto medicamento deve estar chegando ao mercado. Se há 20 anos o paciente com câncer metastático vivia apenas um ano, hoje pode-se chegar até a seis, e com qualidade de vida. Mas são drogas de alto custo que não estão disponíveis pelo SUS – pontua.
Quem avalia a entrada desses medicamentos na rede pública de Saúde é a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec). Por telefone, a assessoria do órgão informou que médicos mastologistas podem receitar qualquer medicamento para tratamento de câncer de mama em metástase – seja garantido pelo SUS ou não. Caso se trate de uma droga não incorporada, o hospital pode ser ressarcido.
Conforme a Conitec, o Trastuzumabe é oferecido pelo SUS desde 2013 para o tratamento de câncer de mama HER-2 positivo no estágio de doença inicial e localmente avançada. Sobre a indicação para a fase metastática, a Conitec avaliou que a relação entre os benefícios e os riscos do uso é desfavorável. Em Santa Catarina, o mesmo medicamento foi garantido ainda em 2012 por meio de uma ação civil pública que elaborou um protocolo clínico de diretrizes terapêuticas no SUS.
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Já o pedido do Pertuzumabe (trastuzumabe+docetaxel) foi feito em junho deste ano pelo Instituto Oncoguia. Mas, segundo a Comissão, a demanda foi encerrada por não conformidade formal da documentação apresentada. Para os medicamentos Lapatinibe e T-DM1, o Ministério da Saúde não registrou pedidos para avaliação.
Esperança vinda de Itajaí
Um novo medicamento está sendo desenvolvido em Itajaí, no litoral Norte do Estado. Pacientes diagnosticados com câncer de mama do tipo HER-2 positivo podem ter acesso a tratamento gratuito por meio dos testes já em fase de conclusão no Centro de Novos Tratamentos Itajaí, que disponibilizará a aplicação do medicamento para combater as células cancerígenas até o final do ano.
– A intenção é aprovar um medicamento novo com formulação quase igual ao Trastuzumabe, cuja eficácia no tratamento de câncer metastático já foi comprovada. Assim, abriremos o leque de opções para esses pacientes e poderemos baratear o custo dos remédios – garante a enfermeira e coordenadora de estudos clínicos, Karyn de Maman.
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O medicamento testado em Itajaí é do tipo biossimilar, feito com material biológico que pode bloquear a ação de células ou proteínas que causam doenças de origem imunológica como o câncer, e por isso não prevê fases inicias de testes em animais, por exemplo. O remédio é um anticorpo que age no alvo específico, destruindo a célula que tem uma proteína encontrada em excesso, evitando o efeito colateral decorrente da quimioterapia.
– Para identificarmos vários tipos de anticorpos, temos que fazer um protocolo de biossimilar para provarmos que esses remédios têm os mesmos efeitos e talvez com algumas pequenas mudanças, melhorem a toxidade com o medicamento – explica o médico Giuliano Santos Borges, oncologista responsável pelas pesquisas do Centro de Novos Tratamentos Itajaí.
Câncer de mama em números
– O câncer de mama é o tipo mais comum entre as mulheres no mundo e representa 22% dos novos casos de câncer a cada ano, segundo o Inca;
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– No mundo, a cada hora, seis novos casos são diagnosticados;
– Cerca de um quarto das mulheres diagnosticadas têm menos de 50 anos, conforme estimativas da instituição Susan G. Komen for the Cure;
– Só no Brasil são esperados 57 mil novos casos de câncer de mama em 2015, segundo dados do Inca.
– Especificamente sobre o câncer de mama metastático não há estatísticas que demonstrem a dimensão real da doença. Relatório do TCU de 2011 deduz que cerca de 50% dos casos de câncer de mama sejam diagnosticados já em estágio metastático avançado (estágios 3 e 4) no SUS.
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– Estudo publicado na revista científica The Oncologist em maio de 2015 diz que aproximadamente 30% dos casos evoluem para o estágio metastático.