A Câmara dos Deputados aprovou o texto-base do projeto que regulamenta a prática da educação domiciliar no Brasil. A proposta prevê a obrigação do poder público de zelar pelo adequado desenvolvimento da aprendizagem do estudante.
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Para usufruir da educação domiciliar, o estudante deve estar regularmente matriculado em instituição de ensino, que deverá acompanhar a evolução do aprendizado.
Oplenário começará a analisar os destaques apresentados pelos partidos nesta quinta-feira (18).
Atualmente, a educação domiciliar não é considerada uma modalidade educacional no Brasil. A Constituição obriga as famílias a matricularem seus filhos entre quatro e 17 anos em escolas. Em 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o modelo não é inconstitucional. Assim, sua oferta dependeria de regulamentação legislativa.
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O tema é pauta histórica de grupos conservadores e religiosos. Com o projeto, Bolsonaro busca agradar sua base de apoio guiada por princípios cristãos e ideológicos.
Apesar disso, pesquisa Datafolha divulgada em maio mostrou que oito em cada 10 brasileiros demonstram rejeição ao ensino domiciliar. Um total de 78,5% discorda de os pais terem o direito de tirar os filhos da escola para ensiná-los em casa –62,5% totalmente, e 16% em parte. A pesquisa foi coordenada pela Ação Educativa e Cenpec.
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Defensores, que vão na contramão da grande maioria dos especialistas, argumentam que regularizar o tema atende ao direito das famílias de decidir como educar os filhos e que milhares de adeptos vivem sob insegurança jurídica.
Críticos defendem que oficializar a opção fere o direito de frequentar a escola, considerada por eles crucial para a educação integral e para a socialização.
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Relatado pela deputada Luisa Canziani (PSD-PR), o texto prevê alguns mecanismos de controle, como a necessidade de um dos responsáveis, ou preceptor, ter ensino superior, de a matrícula estar vinculada a uma escola, além de avaliações periódicas.
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Também é prevista a perda do direito à educação domiciliar caso haja reprovações. A proposta exige que pais ou responsáveis apresentem certidões criminais da Justiça federal e estadual e cumpram os conteúdos curriculares referentes ao ano escolar do aluno, seguindo a Base Nacional Comum Curricular –apesar de admitir a inclusão de conteúdos adicionais considerados pertinentes.
Conforme o projeto, pais ou responsáveis legais deverão garantir a convivência familiar e comunitária do estudante. Esse é um dos pontos tidos como sensíveis por quem rejeita o modelo de ensino, pela avaliação de que a socialização promovida pela escola é importante para o desenvolvimento do aluno.
De acordo com o texto, a escola ou rede de ensino deverão promover encontros semestrais das famílias optantes pela educação domiciliar, para que troquem experiências.
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A proposta veda discriminação entre crianças e adolescentes que recebam educação domiciliar, inclusive no que se refere à participação em concursos, competições, eventos pedagógicos, esportivos e culturais.
Há ainda a previsão de perda do direito à opção pelo ensino domiciliar caso os pais ou responsáveis incorram em crimes previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente ou se a avaliação evidenciar progresso insuficiente do aluno.
A escola ficará responsável por controlar a frequência do aluno –o mínimo é de 75% do total de horas letivas para aprovação. Caso aprovada, a lei entra em vigor após decorridos 90 dias de sua publicação.
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Não há informações precisas sobre o número de famílias na educação domiciliar. O próprio governo chegou a divulgar que a quantidade estava entre 5.000 e 31 mil.
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Algumas famílias praticantes do ensino domiciliar estiveram na Câmara nesta terça-feira (17) a convite de parlamentares favoráveis. Presente na casa, a advogada Barbara Reis, 29, afirma que seus três filhos (de 9, 12 e 13 anos) não frequentam a escola.
— O mais novo nunca foi à escola, fala inglês e português, é uma criança totalmente normal, faz esporte, música e socializa normalmente com outras crianças — diz.
— Os pais escolhem muitas coisas pelos filhos até a adolescência e juventude. Os pais escolhem segundo esse amor que sentem e segundo o pátrio poder que o sistema legislativo confere aos pais — afirmou ela, ao ser questionada sobre o entendimento predominante de educadores de que as crianças é que são os sujeitos do direito da educação.
O ensino domiciliar é emblemático sobre o teor ideológico da pauta de educação no governo Bolsonaro, a despeito das prioridades da educação brasileira. O MEC esteve ausente no apoio às redes de ensino na pandemia e ficou distante do debate sobre a renovação do Fundeb, mecanismo de financiamento da educação básica.
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Iniciativas de educação do governo foram classificadas como retrocessos em diagnóstico elaborado pelo movimento Agenda 227, que envolve 18 organizações. Além de elencar a educação domiciliar entre os pontos negativos, o grupo cita a política de educação especial lançada em decreto em 2020.
Entidades ligadas ao te ma da educação, como a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, se posicionaram contra o projeto. Para a entidade, a regulamentação seria inconstitucional e uma afronta ao direito à educação.
*Reportagem de Danielle Brant e Paulo Saldaña com informações da Agência Câmara