Advogada por formação, a blumenauense Eduarda Fonseca Coelho decidiu trocar o escritório pelo universo da moda. E ela entrou direto em um segmento que ganha cada vez mais adeptas: o de brechós. Se muita gente já torceu o nariz para peças de “segunda mão”, é bom saber que os tempos são outros e esse mercado reserva, sim, muito luxo.
Continua depois da publicidade
Receba notícias de Blumenau e região direto no Whatsapp
Nas prateleiras da sala antes destinada à advocacia, a empreendedora de 26 anos tem bolsas, sapatos e óculos de grifes importadas e com pouco tempo — ou quase nada — de uso. Quando o negócio começou, em 2019, era apenas para faturar um dinheiro extra com as peças paradas no guarda-roupas, mas quando se deu conta estava vendendo os itens das amigas também.
Hoje, Eduarda recebe mercadorias de mulheres do Brasil inteiro e ganha um percentual ao efetivar a venda. Ela conta que via de regra os produtos comercializados no DesapeFashion são 50% mais baratos do que na loja da marca, mas o percentual pode variar conforme o estado e a exclusividade da peça. Tudo tem garantia de originalidade e nota fiscal.
— Já se desmistificou muito o termo brechó, coisa antiga. Tanto é que tudo aqui é muito novinho e bem cuidado — frisa a empreendedora.
Continua depois da publicidade
A bolsa Prada que a jovem mostra custa no site da fabricante R$ 16 mil. Foi comprada por alguém que rapidamente deixou de curtir a peça luxuosa e agora o item está à venda por R$ 12,5 mil. E quem compra? O perfil indica mulheres a partir dos 25 anos que estão se autopresenteando. A metade das clientes é de Blumenau e as demais, de fora. Quem compra no brechó pode até parcelar.
O negócio deu tão certo que ganhou CNPJ, funcionárias com carteira assinada e agora Eduarda vai dar o próximo passo: abrir um e-commerce. Não à toa, dados do Sebrae indicam que pequenos negócios como o de Eduarda concentraram quase 80% dos empregos formais gerados no Brasil em 2022.
Sebrae mira no empreendedorismo como saída para desenvolvimento em encontro nacional

Efeito pandemia
Tice Grotmann entrou no universo dos brechós de luxo no meio da pandemia de Covid-19, justamente quando houve o boom do segmento. A abertura de estabelecimentos que comercializam produtos de segunda mão cresceu 48,6% no Brasil, entre os primeiros semestres de 2020 e 2021, conforme levantamento feito a partir de dados da Receita Federal.
Com muitas parcerias de lojas de roupas, a influenciadora digital acumulava bastante coisa. Aí resolveu fazer uma renda extra com a venda das peças. Viu no isolamento social e no período de lojas fechadas uma oportunidade no universo on-line. Ao mesmo tempo, quem estava do outro lado da tela do celular encontrou um jeito de continuar comprando sem pagar tanto.
Continua depois da publicidade
Parecia via de mão única — da vendedora à cliente —, mas não demorou para que as próprias consumidoras do Direto do Cabide pedissem para colocar itens que tinham guardado no armário de casa para vender com Tice. A parceria deu certo. Ela ganha um percentual sobre as negociações e atualmente a venda de bolsas, óculos e relógios representa metade da renda da empreendedora.
Resultado? O negócio cresceu 30% no último ano.
— Foi tudo muito orgânico e rápido — afirma.
O segredo para o sucesso do ponto de vista financeiro está ancorado na garantia da qualidade das peças e no preço 60% abaixo do praticado na loja. Mas Tice destaca outro aspecto: está feliz também pela conscientização do público para a moda sustentável e sem tabus.
Essa abertura das clientes confirma a informação do Sebrae de que os brechós são tendência mundial e que o mercado de usados ainda tem espaço para crescer. A empresa thredUP, de moda on-line, com sede nos Estados Unidos, estima que o mercado global de roupas usadas deve chegar perto de 80 bilhões de dólares em 2025.
Dona de brechó encontrou oportunidade de formalizar empresa durante a pandemia

Crescimento de 1.000%
Amigas há décadas, Daniela Testoni e Carla Falchetti começaram no mercado de brechós quase sem querer. A princípio foi uma troca de peças entre amigas, em casa mesmo. Passados três anos do que era “só” uma brincadeira, elas viram o negócio crescer 1.000% e sair de uma sala de 45 metros quadrados para um andar inteiro de um prédio em umas das principais ruas de Blumenau, a Antônio da Veiga.
Continua depois da publicidade
Elas não abrem os números de faturamento, mas deixam claro que o desempenho tem sido bem satisfatório. Isso fica claro nos fatos: antes do primeiro ano de Guarda Roupa Brechó, já tinham deixado os empregos de bancária e gerente imobiliária para mergulhar no mundo da moda circular. Hoje são cerca de 1,6 mil fornecedoras para colocar à venda desde peças lojas de departamento até alta costura.
— A gente trabalha com peças de loja de departamento a alta costura. Temos Gucci, Prada, Renner, Hering, Zara. O principal é que estejam em perfeito estado de conservação — conta Daniela.
Quão barato um item é depende do estado e da qualidade do produto. Mas uma peça nova, com etiqueta, por exemplo, custa cerca de 30% a menos do que na loja original. Quem escolhe comprar com elas costuma gastar, em média, pelo menos R$ 350. O público, conta a empreendedora, é de mulheres entre 25 e 50 anos e 60% das vendas é online.
As redes sociais se tornaram propulsoras do negócio e hoje é no Instagram que as sócias fazem fast-lives e montagem de looks para atrair clientes. É um caminho que dá muito certo, pontua a analista técnica do Sebrae no Vale do Itajaí, Fernanda Rosa:
Continua depois da publicidade
— O marketing digital tem contribuído muito para a divulgação dos brechós. Os empreendedores utilizam essas ferramentas de forma estratégica, através de parcerias com influenciadores digitais.
Daniela, aliás, é uma consumidora de brechós, mas agora, claro, a maioria das peças que usa sai do próprio espaço. Tanto ela quanto a sócia sempre levaram em conta a pegada sustentável do negócio, de considerar o impacto ambiental que a produção de novas peças de roupa causa.
— O mercado do brechó é um mundo sem volta. Existe uma consciência muito grande, principalmente na nova geração, que faz entender que o reuso das coisas é necessário. A indústria da moda é a segunda em poluição, só perde para o petróleo. A sustentabilidade é fundamental — frisa.
Empreender é o segundo maior sonho do brasileiro, diz pesquisa

Um novo momento da moda
Francisco Ponciano Vieira, professor do curso de Moda da Furb, acredita que o aumento da popularidade dos brechós em Blumenau pode ser atribuído a diversos fatores. Um deles é a mudança de mentalidade em relação ao consumo, com um número crescente de pessoas buscando alternativas sustentáveis e conscientes. O que, na visão dele, só deve crescer nos próximos anos.
Continua depois da publicidade
— Os brechós se destacam como uma opção acessível para adquirir roupas e acessórios de qualidade, promovendo a reutilização e evitando o desperdício. Essa nova perspectiva de consumo alinha-se com valores de sustentabilidade e contribui para a construção de uma moda mais consciente e responsável — pontua.
Além disso, Vieira destaca que os brechós têm um impacto econômico significativo em Blumenau.
— Eles oferecem oportunidades para empreendedores locais, impulsionando a economia criativa e gerando empregos. Muitos brechós são pequenos negócios familiares que contribuem para a renda das famílias e fortalecem a economia local, a exemplo do brechó Mundo Barth — exemplifica.