Em meio a uma campanha para sensibilizar os chineses a ajudarem o próximo, um exemplo brasileiro foi adotado pelo governo como modelo de conduta. Mozer Rhian Oliveira, 27 anos, recebeu do governo uma placa de honra ao mérito e o equivalente a R$ 15,2 mil ao ser ferido após ter impedido um assalto na cidade de Dongguan, na província de Guangdong (Cantão).
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O episódio repercutiu em sites e jornais na China porque consideram inusitado alguém se importar com um desconhecido. Raridade que se comprovou no mesmo caso: dezenas de pessoas que assistiram passivas Oliveira sendo agredido pelos ladrões.
O caso reacendeu o debate sobre a indiferença em situações semelhantes que têm sido flagradas na China. A mais chocante delas foi captada em outubro, pelas câmeras da cidade de Foshan. A menina Yueyue, de dois anos, foi atropelada por uma van e depois por um caminhão em um mercado público. Pelo menos 18 pessoas passaram pelo local – além dos motoristas – e, embora tenham visto a garota ferida, ninguém parou para socorrê-la. Ela foi retirada do meio da rua por uma catadora de lixo e depois levada por outra mulher. A menina morreu dias depois.
O episódio motivou uma campanha que tenta estimular os chineses a serem “bons samaritanos”, e exemplos de estrangeiros que se comportaram de maneira exemplar tiveram ampla repercussão na imprensa, conforme reportagem do jornal O Estado de S.Paulo. O jovem, que é gaúcho, depois de se arriscar ao evitar o assalto a uma mulher, transformou-se em símbolo dessa tentativa de humanização e um fenômeno na internet.
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Publicada em um dos maiores sites da China, a notícia sobre a atitude de Oliveira foi comentada por mais de 2 milhões de pessoas indignadas com a falta de ajuda, relata o gaúcho.
Para a professora Rosana Pinheiro Machado, doutora em antropologia pela UFRGS, autora do livro Made in China, resultado de uma pesquisa de 10 anos, a frieza mostrada nos episódios tem um nome: “Guanxi”. Trata-se de um fundamento milenar de organização da sociedade chinesa de prezar por suas próprias redes. Ou seja, o princípio é ajudar quem faz parte das próprias relações e ignorar quem está fora:
– O chinês é solidário com as pessoas de sua rede. Em geral, não sente como um dever ajudar quem está fora dela.
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Em um mundo cada vez mais dependente da China, ter “guanxi” se tornou palavra de ordem para quem quer penetrar no mundo dos chineses. É preciso ter “guanxi” nos negócios, na política e assim por diante. No período maoísta, o governo chinês lutou contra o “guanxi”, com uma campanha na tentativa de disciplinar a sociedade uma visão coletivista, mas não funcionou, recorda a professora:
– É cruel, mas é um povo que se fechou de tanto sofrer. É uma maneira de se proteger.