O Brasil precisa reduzir a exposição da população à fumaça gerada pelas queimadas para evitar um aumento do número de casos de câncer nas próximas décadas. O alerta foi feito nesta terça-feira (17) pela epidemiologista Ubirani Otero, chefe da Área Técnica Ambiente, Trabalho e Câncer do Instituto Nacional de Câncer (Inca), que define o cenário atual como “muito preocupante”.
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“Se a gente não prevenir essas questões hoje, a gente corre risco de ter um aumento dos tipos câncer relacionados ao sistema respiratório em um futuro próximo”, afirma Ubirani Otero.
Para evitar esse crescimento de casos, a especialista afirma que “a melhor prevenção contra o câncer é a eliminação da exposição. Se cessar o quanto antes, a gente pode prevenir muitos casos no futuro”.
A epidemiologista explica que a fumaça proveniente dos incêndios florestais é formada por inúmeros compostos químicos, o que a torna cancerígena.
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“As queimadas geram muito material particulado. Estamos falando de liberação de monóxido de carbono, solventes, metais pesados, hidrocarbonetos aromáticos, fuligem, uma gama de material que fica suspenso no ar”.
Riscos à saúde
O tipo de câncer mais diretamente ligado à exposição prolongada à fumaça e poluição do ar é o de pulmão e outras partes do sistema respiratório. Ubirani Otero aponta que, diferentemente de outras doenças agudas causadas pela exposição prolongada, como síndromes respiratórias, os cânceres podem levar de 20 a 30 anos para serem identificados.
“O período de latência é grande, então os efeitos dessa poluição de hoje para câncer a gente só vai ver depois de 20, 30 anos”, alerta a epidemiologista.
A especialista do Inca direciona a preocupação de saúde, incluindo doenças respiratórias, principalmente para crianças, idosos e trabalhadores que atuam em áreas abertas, com destaque para os bombeiros que combatem diretamente as chamas.
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“Eles [os bombeiros] precisam estar totalmente equipados, bem protegidos, com as máscaras e devidos equipamentos de proteção individual, para que eles não sofram efeitos dessa fumaça”, orienta ela, acrescentando que é preciso cuidado também com a lavagem das roupas usadas em serviço. “Está cheia de fuligem. Todo cuidado tem que ser tomado.”
A pesquisadora defende ainda medidas como a suspensão de aulas em locais e período críticos, para diminuir a exposição prolongada de crianças à fumaça.
“As crianças têm uma atividade física maior, elas acabam aspirando mais essa fumaça que os adultos. Os efeitos para elas são maiores, principalmente respiratórios”, explica.
A epidemiologista aponta que a fumaça das queimadas é tão maléfica quanto a do tabaco. Ao evidenciar que o câncer é uma doença multifatorial, ela chama atenção para o perigo de se acumular fatores de risco, por exemplo, o fato de ser fumante.
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“De um risco que seria dez vezes maior em relação à população geral, passa a 20 vezes maior ou até mais [entre fumantes]”, afirma.
A chefe da Área Técnica Ambiente, Trabalho e Câncer do Inca orienta que pessoas em áreas afetadas pela fumaça das queimadas tomem precauções, como evitar sair de casa, para diminuir a exposição, usar máscara de proteção, beber bastante água e fazer lavagem das narinas.
Incêndios e queimadas
O Brasil enfrenta um cenário grave de queimadas e incêndios florestais em 2024. De janeiro a agosto, os incêndios atingiram 11,39 milhões de hectares, segundo dados do Monitor do Fogo Mapbiomas, divulgados no último dia 12. De acordo com o levantamento, 5,65 milhões de hectares – área equivalente ao estado da Paraíba – foram consumidos pelo fogo apenas no mês de agosto, o que equivale a 49% do total do ano.
Na tarde desta terça-feira (17), está marcada uma reunião dos chefes dos Três Poderes da República para tratar da questão. O encontro foi proposto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que passou o início da semana em reunião com ministros do governo.
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Em junho, o governo criou uma sala de situação preventiva para tratar sobre a seca e o combate a incêndios, especialmente no Pantanal e na Amazônia.
Enquanto nuvens de fumaça se espalham pelo país, a Polícia Federal abriu investigação para apurar se as queimadas têm origem criminosa, já que há indícios de ações coordenadas.
Incêndios também surgiram em outras regiões, como o Sudeste. Em São Paulo e no Rio de Janeiro, também foram criados gabinetes de crise pelos governos locais. Na região serrana do Rio de Janeiro, o chefe do Parque Nacional da Serra dos Órgãos afirma que o fogo consome áreas raramente atingidas por incêndios.
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