O que se sabe internamente no país ganha o mundo lá fora. Quando o assunto é direitos humanos o Brasil piorou no governo Jair Bolsonaro. A denúncia foi feita nesta quinta-feira (27) pela alta comissária da ONU, Michelle Bachelet, à Comissão de Direitos Humanos da entidade.
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No discurso anual sobre a situação global, a ex-presidente do Chile incluiu o Brasil entre os cerca de 30 locais do mundo onde o tema mais preocupa. Para a Anistia Internacional o relatório "Direitos Humanos nas Américas: Retrospectiva 2019" mostra que o exemplo não está vindo de onde deveria:
— A retórica anti-direitos humanos assumiu altos cargos na República e tenta, a todo o instante, enfraquecer o que temos como garantia para uma sociedade justa, a Constituição Federal de 1988 — diz a ativista Jurema Werneck, diretora-executiva do escritório da Anistia Internacional no Brasil.
Durante o discurso na ONU, Bachelet lamentou o que chamou de "retrocessos importantes nas políticas de proteção ao meio ambiente e dos direitos dos povos indígenas". No capítulo sobre o Brasil, citou a crise na Amazônia, a pressão contra povos indígenas e perseguição a ativistas.
Além do aumento das requisições das terras de indígenas e afrodescendentes e o esforços para deslegitimar o trabalho da sociedade civil e seus movimentos. A denúncia não chega a surpreender quem acompanha a realidade dos ativistas dos direitos humanos no país, como a Anistia Internacional.
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Em dezembro, a entidade já havia denunciado ataques e ameaças contra ativistas. Também houve alerta sobre a impunidade. Um dos exemplos são os assassinatos da vereadora Marielle Franco, em 14 de março de 2018, e do motorista Anderson Gomes. Quase dois anos depois, os mandantes dos assassinatos não foram presos.
No mesmo relatório, a Anistia Internacional denunciou o crescimento da violência policial, especialmente contra jovens negros das periferias.
Ao portal G1, o Itamaraty disse que Bachelet "está desinformada". "Não há retrocessos nas políticas para proteger o meio-ambiente, muito menos os povos indígenas". Já o Palácio do Planalto disse que não vai comentar a declaração da alta comissária da ONU.
Movimentos espontâneos encabeçados por mulheres e jovens são sinal de esperança e um recado para líderes autoritários
Confira a entrevista com Jurema Werneck, diretora-executiva da Anistia Internacional no Brasil.
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Na sua opinião, ao que devemos este retrocesso apontado no relatório?
Em 2019, vimos a emergência de líderes autoritários e intolerantes em toda a América. Aqueles que deveriam garantir direitos humanos de seus cidadãos foram os violadores desses direitos. Assim também no Brasil, a retórica anti-direitos humanos assumiu altos cargos na república e tenta a todo o instante enfraquecer o que temos como garantia para uma sociedade justa, a Constituição Federal de 1988.
O que cada brasileiro comprometido com a cultura da paz pode fazer pra melhorar está realidade?
Apesar do retrocesso vivido na garantia dos direitos humanos, vimos que existem pessoas dispostas a lutar pelos seus direitos e com reivindicações justas. Quando uma pessoa luta e consegue alcançar seu objetivo, toda sociedade é beneficiada.
Parte da sociedade brasileira parece não entender a questão dos direitos humanos?
A luta de defensores e defensores de direitos humanos é também uma luta de toda a sociedade. Continuar lutando é acreditar na democracia, na garantia dos direitos e numa sociedade mais justa.
A princípio, este relatório apresenta dados muito perigosos na questão dos direitos humanos e sociais. Ainda assim é possível ter alguma esperança?
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Mesmo com graves violações e retrocessos em relação aos direitos humanos temos muitas pessoas indo às ruas para se manifestar. Esses movimentos espontâneos encabeçados por mulheres e jovens são um sinal de esperança e um recado para líderes autoritários e intolerantes de que basta de retrocesso.
O que se pode fazer para que o medo não assalte os brasileiros e devolva-lhes a capacidade de continuar solidário?
Devemos continuar lutando e apontando para que as autoridades públicas cumpram suas funções de trabalhar tendo a Constituição Federal como norte, pois ali estão previstos e assegurados os direitos fundamentais.