Pressionado pelo recorde de mortes e pela escassez de leitos de UTI, de medicamentos para intubação e de vacinas contra Covid-19, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse em pronunciamento em cadeia nacional de rádio e TV na noite desta terça-feira (23) que 2021 será “o ano da vacinação dos brasileiros”. 

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— Estamos fazendo e vamos fazer de 2021 o ano da vacinação dos brasileiros. Somos incansáveis na luta contra o coronavírus — afirmou Bolsonaro, que distorceu ações do governo durante o combate da pandemia e mentiu sobre a sua atuação. 

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O pronunciamento foi veiculado no dia em que, em apenas 24 horas, 3.158 mortes por Covid-19 foram registradas no país. Apesar do lento ritmo de vacinação, o presidente prometeu ainda imunizar toda a população até o final de 2021. 

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— Ao final do ano, teremos alcançado mais de 500 milhões de doses para vacinar toda a população. Muito em breve, retomaremos nossa vida normal — afirmou.
Bolsonaro repetiu o discurso de que, desde o começo da pandemia, há um ano, tem dito que os desafios são dois, o vírus e o desemprego.

Ele afirmou que “em nenhum momento, o governo deixou de tomar medidas importantes tanto para combater o coronavírus como para combater o caos na economia, que poderia gerar desemprego e fome”. 

O governo lançou uma série de medidas econômicas, mas Bolsonaro, durante os últimos 12 meses, minimizou a pandemia, provocou aglomerações, falou contra o uso de máscaras, brecou negociações de imunizantes e, por diversas vezes, manifestou-se contra as vacinas. 

No pronunciamento, o presidente afirmou ainda que o Brasil é o quinto país que mais vacina no mundo e que mais de 32 milhões de doses foram distribuídas a todos os estados “graças às ações que tomamos logo no início da pandemia”. 

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Se considerarmos a taxa de vacinação por habitantes, o país está na 58ª posição, segundo dados do projeto Our World in Data, ligado à Universidade de Oxford. 

Bolsonaro ignorou ter acelerado as negociações para compra de imunizantes depois que o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), começou a articular a compra da chinesa Coronavac. 

— Sempre afirmei que adotaríamos qualquer vacina, desde que aprovada pela Anvisa. E assim foi feito — afirmou Bolsonaro, omitindo que até mesmo sua principal aposta, a vacina Oxford/AstraZeneca, foi contratada antes da aprovação pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). 

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O presidente disse no pronunciamento que “em julho de 2020, assinamos um acordo com a Universidade de Oxford para a produção, na Fiocruz, de 100 milhões de doses da vacina AstraZeneca e liberamos, em agosto, R$ 1,9 bilhão”. 

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A autorização para o uso emergencial só foi concedida pela Anvisa em 17 de janeiro, junto com a da Coronavac. 

No pronunciamento, Bolsonaro cita a adesão ao consórcio Covax Facility, mas não menciona que, por opção do governo, foram adquiridas doses para apenas 10% da população por meio da iniciativa. Documentos mostram que cada país poderia optar por doses para 20% da população ou mais. 

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O presidente também afirmou que intercedeu pessoalmente junto a Pfizer para antecipar o calendário de entrega de 100 milhões de doses. 

Ele, porém, não menciona que, como o jornal Folha de S.Paulo mostrou, o governo brasileiro rejeitou no ano passado proposta da farmacêutica que previa 70 milhões de doses de vacinas até dezembro deste ano. Do total, 3 milhões estavam previstos até fevereiro, o equivalente a cerca de 20% das doses distribuídas no país até o início de março. 

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O pronunciamento foi gravado na tarde desta terça. É o primeiro sob a orientação do almirante Flávio Rocha como titular da Secom (Secretaria Especial de Comunicação Social). 

Apenas em março, Bolsonaro cancelou três pronunciamentos que faria na cadeia de rádio e televisão. Nesses episódios, ele foi convencido a recuar diante da intenção de usar a cadeia nacional para criticar medidas de restrição de deslocamento adotadas por governadores e prefeitos. 

Desde o início do ano passado, quando o coronavírus começava a se espalhar pelo mundo, Bolsonaro tem dado declarações nas quais busca minimizar os impactos da pandemia da Covid-19, que já deixou 298.843 mortos no Brasil. 

Ele já usou as palavras histeria e fantasia para classificar a reação da população e da imprensa à pandemia. Tem criticado as medidas de isolamento social no país e disse que os problemas precisam ser enfrentados pela população. 

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— Nós temos que enfrentar os nossos problemas, chega de frescura e de mimimi. Vão ficar chorando até quando? Temos de enfrentar os problemas. Respeitar, obviamente, os mais idosos, aqueles que têm doenças, comorbidades, mas onde vai parar o Brasil se nós pararmos? — questionou no começo de março. 

No início deste ano, quando os números apontavam para novo avanço da Covid-19 no país, Bolsonaro afirmou que o Brasil estava vivendo “um finalzinho de pandemia”. 

Discurso pró-vacina

No início do mês, o governo lançou o que ficou informalmente conhecido como “Plano Vacina”, uma tentativa de guinada no discurso contrário à vacinação que Bolsonaro, filhos e ministros vinham sustentando. 

A iniciativa inclui uma campanha nacional de vacinação, que deve ser veiculada ainda neste mês, com intuito de estimular a população a se informar sobre a imunização de sua faixa etária. O material deve explorar a imagem do Zé Gotinha. 

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Aos 66 anos, Bolsonaro também decidiu se vacinar quando chegar o momento de imunização de sua faixa etária. Ele deve ser vacinado pelo recém-empossado ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, com uma dose da Oxford/AstraZeneca. O presidente entendeu que era preciso flexibilizar seu discurso radical diante da queda de popularidade e da fuga de apoio nas redes sociais, sua principal bússola. 

Reunião discute novas medidas de combate à pandemia nesta quarta

Nesta quarta-feira (24), Bolsonaro receberá no Palácio da Alvorada os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux. 

Também participam do encontro o Procurador-Geral da República, Augusto Aras, ministros do governo e alguns governadores que representarão cada uma das cinco regiões do país. A ideia é discutir medidas de combate à pandemia do coronavírus​. No Legislativo e no Judiciário, porém, o gesto é visto com ceticismo. 

A intenção do presidente é usar o encontro para anunciar medidas de saúde que envolvam todo o poder público, como a criação de um gabinete de emergência. Esta é mais uma tentativa de reverter o derretimento de sua própria imagem. 

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​​Mas tanto integrantes do Congresso como do STF veem com ceticismo esta nova roupagem, já que Bolsonaro insiste em acenar para sua base radical e a atacar governadores e prefeitos que adotam medidas restritivas para tentar frear a disseminação do vírus.