Em um teatro no centro de Kazan, cidade russa a 800 quilômetros de Moscou, uma bailarina recebe buquês de flores e é ovacionada ao fim de um espetáculo de balé. Ela tem cabelos e olhos negros, bem diferentes das moças loiras de olhos azuis que costumam tornar-se princesas sobre as sapatilhas nos palcos da Rússia. Amanda Gomes é brasileira, nasceu em Goiânia, cresceu em Joinville, e atualmente é uma das maiores estrelas em ascensão da dança no Brasil — e é justamente no país do balé que ela brilha.
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A jovem de 24 anos não só é primeira bailarina no principal teatro de Kazan, fundado no fim do século 18, como também conquistou alguns dos maiores prêmios do balé na Rússia nos últimos cinco anos e meio, desde que iniciou definitivamente sua carreira profissional.
O balé talvez fosse apenas mais um hobby que perderia-se com o fim da infância se uma professora de dança de Goiânia não tivesse percebido: aquela menina de nove anos podia tornar-se uma estrela. Foi ela quem, ao ouvir de Amanda que seu sonho era ser uma bailarina profissional, contou à família sobre a existência da Escola Bolshoi em Joinville.
— Ela disse “em Joinville, tem uma escola profissionalizante. Ela tem que ser uma profissional, se é isso que ela quer” — recorda a bailarina.
Amanda queria ser uma profissional, e fez a primeira grande mudança de vida com apenas dez anos. Passou na audição e, ao lado dos pais, mudou para Joinville. Não demorou para que o talento e a precocidade despontassem: pulou duas séries dos oitos anos necessários para a formação completa e foi a aluna mais jovem a se formar na história da escola, aos 16 anos. Foi também a mais jovem contratada da Cia. Jovem Bolshoi Brasil e passou a conciliar o Ensino Médio com o trabalho como como bailarina profissional.
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Os prêmios também vieram cedo: aos 15 anos, foi bailarina revelação no International Ballet Competition, nos Estados Unidos; aos 17, foi medalha de ouro na Competição Internacional de Balé em Istambul, na Turquia, e os 18 anos chegaram com um primeiro lugar no tradicional Youth America Grand Prix (YAGP), em Nova Iorque.
Não foi surpresa, portanto, que ela fosse a primeira brasileira contratada por um tradicional teatro russo aos 19 anos, ou que virasse solista da companhia em poucos meses e que, em três anos, ascendesse à posição de protagonista dos espetáculos do Balé de Kazan.
— A Escola Bolshoi me deu uma base que é para o resto da vida. Eu não senti muita dificuldade porque aprendemos o método Vaganova na escola e, em questão de técnica, eu sabia que estava preparada para trabalhar em um teatro, principalmente na Rússia — analisa ela.
Jovem já tinha fã-clubes quando dançava em Joinville
Mesmo quando ainda era uma bailarina da companhia semiprofissional do Bolshoi Brasil, posição importante mas com pouco "glamour", Amanda já tinha fã-clubes nas redes sociais. Agora, apesar da pouca idade, é nela que muitas meninas brasileiras se espelham quando sonham em virar bailarinas. Entre os 20 e os 23 anos, ela conquistou a medalha de ouro no 26º Varna International Ballet Competition, na Bulgária, a mais antiga e uma das mais importantes competições de Balé Clássico do mundo.
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Ao lado de Wagner Carvalho, jovem de Rio Negrinho também formado pelo Bolshoi Brasil, venceu a competição "Big Ballet", uma espécie de reality show na TV da Rússia que coloca bailarinos das melhores companhias do mundo para apresentarem coreografias de diferentes gêneros enquanto são avaliados por uma banca. Também foi indicada ao "Oscar" da dança, o Prêmio Benois de La Danse, considerado o "Oscar da Dança", por sua performance como protagonista do balé “Esmeralda”
— Varna foi o primeiro concurso de balé do mundo. Meus ídolos foram os primeiros a vencer, então, quando vi meu nome no livro [dos medalhistas de ouro] e a primeira que recebeu esta medalha de ouro foi Ekaterina Maximova, por quem sou apaixonada pela dança, foi um choque. Me senti muito orgulhosa quando vi meu nome neste livro de grandes estrelas do passado — conta Amanda.
Ekaterina Maximova foi uma estrela do Balé Bolshoi de Moscou entre os anos 50 e 70. Casada com o bailarino Vladimir Vasiliev — que recebeu o apelido de "Deus da Dança" do século 20 — colaborou na abertura da Escola Bolshoi Brasil. Por isso, também não é estranho que, hoje, Vasiliev também tenha na jovem bailarina uma referência. Quando precisa de uma estrela para os espetáculos que ainda monta na Rússia, a menina do Brasil é a primeira escolha.
— Nos últimos anos de seu aprendizado na escola, e principalmente quando ela já veio para Kazan, eu via que essa menina se tornou uma talentosa bailarina. Bailarina que teve sua beleza dada por Deus mas também foi lhe dada inteligência, capacidade de compreender, sentir, raciocinar, interpretar, e tudo isso se torna um só no palco — afirma Vasiliev.
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Ao lado de Vladimir Vasiliev e do namorado, o primeiro-bailarino da Opera de Kazan, Mikhail Timaev.