Nascido em Blumenau, o arquiteto e urbanista Dietmar Starke tem uma carreira extensa como inovador no desenvolvimento de cidades pelo mundo. Morou por 13 anos em Berlim, na Alemanha, depois trabalhou no Egito e projetou o Centro de Mulheres do Mundo Islâmico. Trouxe para o Brasil o primeiro projeto da Bauhaus – uma das maiores escolas de design do mundo – e o construiu numa favela no Rio de Janeiro, onde hoje trabalha para a prefeitura em projetos de inovação, como o da Nave do Conhecimento, que rendeu a ele um prêmio internacional no começo deste ano. Nas “naves”, prédios com design futurista, a prefeitura do Rio oferece computadores de ponta para uso das comunidades com cursos e oficinas gratuitas. Em Blumenau para uma palestra sobre cidades inteligentes na Semana Global de Empreendedorismo, Starke encontrou a reportagem do Santa no Centro para uma conversa sobre arquitetura, mobilidade urbana e desenvolvimento da cidade.
Continua depois da publicidade
Santa – O que define uma cidade inteligente?
Dietmar Starke – A questão é a conexão com a tecnologia, a inclusão social, a conexão com a natureza, uma arquitetura que tenha uma relação com as pessoas, que seja bonita, que emocione. O que fazemos no Rio de Janeiro atualmente é pegar as tecnologias mais avançadas e entregar para as pessoas que não têm possibilidade de acessá-las. O conhecimento é o valor mais importante dos nossos tempos, e é isso que entregamos para as comunidades, criamos uma comunicação nunca antes vista na cidade. E é isso que forma a smart city, pois uma cidade hoje só pode ser moderna se tiver uma inclusão. Não podemos ser um país desenvolvido e ter acorrentado nos nossos pés os laços sociais. Ela só é inclusão social quando é 100%. Você não pode fazer intervenção social como se fosse faz de conta, tem que transformar de verdade.
Santa – E o que pode ser feito em Blumenau para tornar a cidade inteligente?
Starke – Blumenau não pode dar as costas para o rio, focar na Rua XV e esquecer da Beira-Rio. O espaço público tem que ser tomado pelas pessoas. O futuro da cidade está conectado com a natureza, tem que olhar pro rio. Blumenau precisa de um centro de ciência e tecnologia que crie, inove. Não reivindicamos tanto a descendência europeia? O europeu não consome, ele produz; por que nós temos que só consumir? Já vi cidades de médio porte como Blumenau fazendo coisas incríveis quando assumem esse ponto da criação, e o mundo é isso. A ciência é importante e não nasce só pelos cientistas, ela nasce com a arte. Primeiro o artista tem a visão, o cientista concretiza. Blumenau tem jovens inovadores que podem se unir e criar coisas novas, não precisa ficar preso à Oktoberfest e ao enxaimel falso. Por que Blumenau não pode ter um grande museu e as pessoas têm que ir para São Paulo ver uma exposição?
Continua depois da publicidade
Santa – Um dos pontos altos das smart cities é a mobilidade urbana. O que pode ser feito em Blumenau?
Starke – Para o congestionamento a resposta é tirar o carro, não tem outra solução. A melhor maneira de se locomover foi inventada faz tempo, são as pernas. A cidade tem que ser moderna, ser pensada pra pessoa caminhar por ela. Mesmo que você transforme os carros em elétricos que não poluem, tem que deixar o centro livre para as pessoas. Não adianta fazer novas pontes, novos viadutos. Esquece do carro! Mobilidade urbana é andar a pé, é transporte público bom, um VLT (veículo leve sobre trilhos) moderno. Mas tem que começar a reurbanização da cidade com uma mudança na cabeça das pessoas, não adianta só botar ciclovia e não mudar o pensamento.
Santa – E em outras construções? O relevo de Blumenau aumenta a dificuldade…
Starke – Tem que parar de construir na beira de morro, não adianta. Se muda o pensamento, as mudanças físicas começam a aparecer. Quando você começa a estabelecer essa conexão com a natureza, desperta uma consciência e as coisas vão acontecer naturalmente. Abre a rua, coloca uma praça bonita, faz um centro de cultura. Isso contagia as pessoas, os próprios moradores vão mudar sua casa e seus hábitos.
Santa – Você fala do enxaimel falso. Como Blumenau pode trabalhar na arquitetura moderna a tradição alemã?
Continua depois da publicidade
Starke – Foi importante, a cidade é um modelo de muita coisa boa graças a essa história, mas o patrimônio histórico tem que ser preservado de verdade, não criar um enxaimel falso, assim você desrespeita a história. Arriscamos que assim Blumenau vai virar uma caricatura. Não podemos ser caricatura de alemão que mora no Sul e bebe cerveja. Tem que ser imagem de uma cidade em nível alto que serve de modelo para cidades contemporâneas. Uma Blumenau sincera e real, com potencial para muito mais.