Mais de 20 milhões de exemplares vendidos em todo o mundo, o romance erótico 50 Tons de Cinza derrubou um tabu: as mulheres gostam, sim, de pornografia. Mas desde que feita da maneira certa. Ou da maneira que elas acham correta. E o mundo, claro, está se adaptando.
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>>> Leia entrevista com Erika Lust,
diretora de filmes pornô para mulheres
Na literatura, as aventuras sadomasoquistas de uma garota inexperiente e um milionário sedutor não só tornaram a britânica E. L. James rica, mas deram início à tendência que deve dominar o mercado literário por um bom tempo. Na lista de mais vendidos do The New York Times, por exemplo, os relatos picantes voltados para mulheres ocupam quatro das 10 primeiras posições. No Brasil, 70% da tiragem de 150 mil exemplares de 50 Tons saíram vendidos da gráfica, obrigando a editora Intrínseca a imprimir outros 150 mil.
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– São números muito impressionantes para um livro de conteúdo adulto – destaca a gerente de comunicação da editora, Juliana Cirne. – Além de ser uma forte tendência de mercado, mostra que as mulheres também consomem esse universo desde que se identifiquem com a proposta. É exatamente o caso de 50 Tons, um livro escrito por uma mulher para outras mulheres.
O raciocínio se aplica também ao conteúdo apresentado em filmes e programas de TV. Canal por assinatura voltado para mulheres das classes A e B, de 25 a 49 anos, o GNT reserva suas noites e madrugadas para o público adulto. A faixa Noites Quentes, que traz talk-shows, documentários e filmes, registrou 16,6 milhões de telespectadores entre janeiro e julho deste ano – sendo que mais da metade desta audiência foi composta por mulheres.
– A Noites Quentes já é tradicional no GNT, e sempre dedicamos espaço na nossa programação para esse tipo de conteúdo. Os números comprovam interesse constante do público – pontua Mariana Novaes, gerente de Marketing do canal pago, ressaltando que “a preocupação é com a qualidade da produção (conteúdo e técnica) e que ela seja relevante para o nosso público”.
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A emissora, no entanto, não exibe conteúdo pornográfico, optando, no máximo, pelo chamado pornô soft – filmes sem cenas de sexo explícito, por exemplo. Esse tipo de produção, facilmente encontrado na internet, é um filão que também vem despertando o interesse das mulheres dentro de um subgênero próprio, como explica a pesquisadora Érica Sarmet, da Universidade Federal Fluminense (UFF):
– O que existe é uma indústria pornográfica historicamente dominada por homens e pensada apenas para o homem enquanto consumidor. Por isso, algumas diretoras feministas como Erika Lust e Petra Joy resolveram criar algo que denominaram de pornô para mulheres.
As diferenças entre o cinema pornô para homens e para mulheres são claras e começam a mudar a indústria tradicional. Segundo números da Vivid Entertainment, uma das maiores produtoras do gênero, de 30% a 40% do mercado pornô norte-americano são atualmente compostos por mulheres, indicando que novos rumos terão que ser tomados num futuro não tão distante.
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– Há um determinado tipo de estilo de filme, você pode até chamar de movimento, que se autointitula “pornô para mulheres”, mas há várias mulheres dirigindo pornografia que não necessariamente segue esse estilo – esclarece Érica Sarmet. – A pornografia está mudando, e nós estamos mudando com ela.
Antes um território predominantemente masculino, a pornografia é cada vez mais assunto de mulher até mesmo por trás das câmeras. Diretoras partiram para a criação de filmes eróticos feitos por e para mulheres.
Uma das pioneiras foi a americana Annie Sprinkle, atriz pornô que nos anos 1980 passou a dirigir filmes diferentes daqueles em que atuava. A principal mudança proposta por ela foi tirar a mulher do papel de coadjuvante e colocá-la como protagonista das cenas. A partir de Annie, o prazer feminino no cinema pornô estava liberado, e uma nova designação, criada: o pornô feminino.
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– O objetivo é fazer uma pornografia diferente da tradicional, se preocupando em mostrar na tela o prazer sexual da mulher, e investir em elementos que excitem também as mulheres. Não quer dizer fazer um filme romântico, ou com história, mas que esses filmes se preocupam, por exemplo, em enfatizar o orgasmo da mulher, e não o do homem, como é mais comum na pornografia tradicional – esclarece a pesquisadora Érica Sarmet, da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Hoje, três nomes se destacam nesse meio: a americana Candida Royalle, a alemã Petra Joy e a sueca Erika Lust (leia entrevista). Todas produzem um cinema pornô que faz sucesso nas principais premiações do gênero, além de ter angariado um público fiel e que não para de crescer.
– O mercado pornô feminino é enorme e subestimado. As mulheres estão sedentas por erotismo feito sob medida para elas, que mostre os homens, antes donos do pedaço, como objetos de desejo – defende Petra em seu site.
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Candida é mais incisiva:
– A indústria pornô é um dinossauro incapaz de enxergar além de sua própria sombra. Precisamos de mais mulheres com coragem para quebrar esse tabu e colocar suas habilidades cinematográficas em prática, uma vez que a indústria pornô oferece mais oportunidades do que a indústria do cinema convencional.