As benzedeiras são figuras muito tradicionais em Santa Catarina e muitas pessoas recorrem a elas, que empenham conhecimentos e fé, para ajuda na cura física e emocional. Em Florianópolis, a grande maioria das benzedeiras em atuação é idosa. Por conta da pandemia de Covid-19, estão no grupo de risco e precisaram parar com os atendimentos. Dona Ondina, de 88 anos, que costumava receber mais de 60 pessoas por dia – vindas de todo o Estado e até de fora dele – ficou sem condições de dar a benção presencialmente. Por isso, com ajuda de uma das filhas e de uma neta, teve a ideia de fazer as benzedura através das redes sociais.

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A adaptação tecnológica foi só uma forma que Dona Ondina encontrou para transmitir o dom que recebeu ainda pequena, aos nove anos de idade.

– Eu estava brincando e uma amiga me falou que estava com muita dor na perna, me contou que não conseguia dormir, que queimava e coçava. Olhei para ela e disse: “Isso aí é cobreiro”. Peguei um galhinho de mato e benzi. No outro dia ela apareceu lá em casa me pedindo para benzer novamente porque estava melhorando. Fiz por três dias e ela ficou boa – conta a benzedeira, que nasceu e foi criada no bairro Ribeirão da Ilha, no Sul da Ilha.

Até março, Dona Ondina atendia as pessoas em casa, local onde formou família, criou cinco filhos – um já falecido – que lhe deram 12 netos, 10 bisnetos e 1 tataraneto. Os atendimentos vieram depois que os filhos já estavam criados. Os vizinhos procuravam a benzedeira para curar cobreiro, arca caída, dores na coluna e também para orações para mal olhado, para conseguir emprego, para deixar de beber e até para que a espinha de peixe espetada na garganta fosse eliminada.

Na mão ela carrega um terço e no pescoço um colar feito de sementes que a protege das energias ruins. Galhos de arruda, azeite de oliva e até linha e agulha são usados durante as rezas que são repetidas algumas vezes durante a benzedura.

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– Eu tinha uma tia que benzia também, a irmã da minha mãe. Ela nunca me ensinou, mas eu ficava acompanhando e foi assim que aprendi.

Com a voz baixa e em um ritmo acelerado, pouco se entende do que ela recita, mas segundo ela não é necessário entender, mas ter fé no que está sendo pedido. As bênçãos pelas redes sociais iniciaram há pouco mais de uma semana. A filha Jaci Siqueira conta que precisou pedir para mãe parar com os atendimentos após as primeiras notícias sobre coronavírus em Florianópolis, mesmo contrariada Dona Ondina cessou os atendimentos presenciais, mas diariamente lamentava não conseguir compartilhar as orações. Foi então que surgiu a ideia das lives por Facebook e Instagram, inspirada nas transmissões que ficaram tão populares entre os cantores.

– Precisei explicar para ela que na reza ela ficava muito próxima das pessoas e que essa doença era transmissível – conta Jaci, que acompanha a mãe e que, segundo a própria Dona Ondina, deve ser quem irá lhe substituir no futuro.

– Tenho o dom, mas vou passar para a minha filha. Para quando eu partir desse mundo ter uma benzedeira aqui na terra – planeja Dona Ondina.

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Dona Ondina recebe auxílio da filha para quem irá passar os ensinamentos.
Dona Ondina recebe auxílio da filha para quem irá passar os ensinamentos. (Foto: Diorgenes Pandini)

Retorno positivo das rezas on-line

As primeiras lives reuniram cerca de mil pessoas. Mãe e filha relatam que receberam mensagens até de brasileiros que estão morando fora do país e que acompanharam as transmissões. Sentada em uma cadeira na companhia da filha, na frente de um pequeno altar com uma imagem maior de Nossa Senhora, a benzedeira intercala rezas: cada enfermidade tem a própria reza e não são todas as benzedeiras que fazem todas elas, um dos diferenciais de Dona Ondina.

Com o retorno positivo e o relato de várias pessoas que tiveram alguma graça alcançada, elas resolveram criar uma programação para as transmissões, que agora ocorrem semanalmente às terças-feiras, às 20h, no Facebook de Jaci (@jaci.siqueira.7) e também no Instagram da neta Victória (@victoria_machado17). Pelo menos, até que a pandemia deixe de preocupar a população.

Perguntada sobre a força da reza pela internet, Dona Ondina é categórica:

– Sim! Tenho recebido relato de várias pessoas que estão recebendo bênçãos com as rezas que fiz. Estou muito grata por isso.

Jaci, que deve seguir os passos da mãe e levar a tradição adiante, conta orgulhosa vários relatos que recebeu de pessoas curadas e até animais de estimação que melhoraram de enfermidades. Mãe e filha reforçam que os cuidados médicos não devem ser abandonados, mas que com a força da fé é possível ter essa resposta tão positiva.

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– Não por nada, mas ela é realmente uma pessoa muito abençoada – finaliza a filha.