Com menos de 1 ano, os bebês já são capazes de entender uma regra muito comum entre irmãos: os maiores mandam. Uma pesquisa desenvolvida na Universidade de Harvard (EUA) e divulgada na revista especializada Science mostrou que as crianças percebem cedo o domínio social e usam o tamanho para adivinhar quem se sairá melhor em um conflito.
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A principal autora da pesquisa, Lotte Thomsen, diz que o trabalho sugere que as pessoas já nascem com – ou desenvolvem precocemente – o entendimento sobre a hierarquia no meio social. Elas também usam a correlação de que tamanho é documento, princípio onipresente na cultura humana e no mundo animal. Essa noção ajuda as crianças a encararem a difícil tarefa de aprender a sobreviver em seu meio, identificando quem está no comando.
– Tradicionalmente, os reis sentam-se em tronos grandes e elevados, usam coroas e mantos que os fazem parecer maiores do que realmente são. Além disso, os subordinados devem se envergar ou se ajoelhar perante eles – argumenta, em entrevista, a professora do Departamento de Psicologia de Harvard. – Muitos animais estufam o peito para que os adversários pensem que são maiores.
Segundo Lotte, a pesquisa sugere que, mesmo com um nível de socialização limitado, crianças que nem sequer falam conseguem entender esses simbolismos. A equipe da psicóloga trabalhou com colaboradores da Universidade da Califórnia para estudar as reações de crianças entre 8 e 16 meses enquanto elas assistiam a vídeos com cenas de interação entre personagens de diversos tamanhos.
Lotte explica que, como crianças na fase pré-verbal não podem ser entrevistadas, suas experiências e expectativas devem ser avaliadas por meio de seus comportamentos. Nessa idade, as crianças tendem a olhar por mais tempo algo que as surpreende.
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– Podemos testar hipóteses sobre o que elas esperam, medindo quanto tempo levam olhando para cenários que tanto podem confirmar quanto contradizer suas expectativas – diz a pesquisadora.
Vídeos
Os cientistas mostraram às crianças vídeos nos quais apareciam grandes e pequenos blocos com olhos e boca, posicionados em direções opostas. Depois, os bebês viam os blocos se encontrarem no meio da tela, um impedindo o outro de progredir. Então, eles assistiam aos blocos grandes e pequenos se curvar e dar um passo ao lado.
– Como o previsto por nossa teoria, as crianças concentravam-se muito mais quando um agente grande rendia-se ao pequeno – conta Lotte.
Em média, elas fixavam o olhar nesse evento inesperado por 20 segundos, comparando-se a apenas 12 segundos despendidos quando um bloco menor dava as costas e voltava ao lugar de origem, desistindo da briga. O curioso, porém, foi notar que as crianças com 8 meses não estranhavam quando um bloco grande se rendia a um pequeno. Essa reação só era manifestada pelos participantes com idades entre 10 e 16 meses, o que sugere que esse entendimento conceitual se desenvolve entre os 8 e 10 meses.
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– Entender o que forma o repertório conceitual humano é um dos formidáveis desafios da ciência cognitiva – afirma a coautora da pesquisa Susan Carey, também professora de Harvard. – Parte desse desafio encontra-se no estado inicial: que fontes representativas já nascem com o indivíduo e permitem um futuro aprendizado? Nosso trabalho mostra que, aparentemente, as crianças já vêm ao mundo preparadas para entender aspectos sociais abstratos.
Nas últimas décadas, os cientistas descobriram que a mente infantil cria representações abstratas e intuitivas relativas à física, à psicologia e à matemática. Também já foi demonstrado que os pequenos representam aspectos do mundo social. Essas representações, explica Susan, constituem parte do que os bebês precisam para entender os conceitos de colaboração e de cooperação.
– Os estudos que descrevemos na Science foram os primeiros a mostrar que crianças muito novas também entendem eventos em que os agentes estão em uma disputa final e que elas conseguem prever qual dos dois vai prevalecer – diz a cientista.