Costuma-se afirmar que uma mãe é capaz de distinguir o choro do próprio filho de longe, mesmo que outras crianças estejam chorando ao mesmo tempo. A explicação é que, para ela, o som é tão peculiar como inimitável.
Continua depois da publicidade
Essa definição é um sinal de identidade do rebento, tão inconfundível como a cor de seu cabelo e de seus olhos, o aroma de sua pele ou seu sorriso. Agora, descobriu-se que o choro dos bebês também tem um traço característico e sutil que permite diferenciá-los de outros. Um traço que antes era considerado um atributo que só se manifestava quando aprendiam a falar nos anos posteriores a sua vinda ao mundo: o idioma.
O certo é que os bebês, antes de pronunciar os primeiros balbucios, choram de maneira diferente segundo os países em que nascem, e, sobretudo, segundo a língua que falam seus pais. Eles fazem isso desde os primeiros minutos de vida, quando recebem o tapa no bumbum que os impulsiona a chorar e aspirar as primeiras baforadas de ar, fora do ventre materno, após ser cortado o cordão umbilical que os oxigenava e nutria.
Até agora, acreditava-se que os bebês eram capazes de imitar os sons de vogais pronunciadas pelos adultos, mas isso só acontece a partir de sua 12ª semana de vida. Portanto, o impacto do idioma nativo é muito precoce.
Um grupo de pesquisadores comprovou a afirmativa mediante um estudo feito com 60 bebês. Também foi descoberto que seus choros contêm uma série de características distintivas e reconhecíveis de sua língua materna.
Continua depois da publicidade
Devido ao fenômeno, cada bebê mostra uma preferência pela voz da mãe, a qual reconhece frente às de outras pessoas. O grupo de pesquisadores dirigidos pela médica Kathleen Wermke, da Universidade Wurzburg, na Alemanha, acredita que o choro dos bebês são sua primeira tentativa de se comunicar com a mãe, e que “provavelmente, ao chorar, procuram imitar o comportamento dela para atraí-la e fomentar o vínculo”.
Segundo a diretora da pesquisa, publicada na revista Current Biology, os fetos começam a aprender aspectos do que será sua língua materna quando ainda estão no útero, embora não seja necessário que as grávidas falem ou cantem para seus filhos antes de eles nascerem para estimular esta aprendizagem pré-natal. De todo modo, se as futuras mães o fazem, o feto desfrutará disso.
Comunicação pelas lágrimas
Muitas das diferenças dos choros estão relacionadas à língua que falamos. Pode-se fazer uma comparação, por exemplo, entre os bebês franceses e alemães. Aquelas crianças que vieram ao mundo e têm pais franceses, tendem a chorar com uma curva melódica ascendente, enquanto que os recém-nascidos de origem germânica se caracterizam por emitir uma forma melódica descendente.
Os bebês franceses de três dias aumentam a intensidade do choro progressivamente e também a frequência. Vão passando de um tom mais grave para outro mais agudo, até alcançar o ponto culminante no final do choro. Os alemães começam chorando a todo volume e com frequência aguda, e depois diminuem a intensidade.
Continua depois da publicidade
Segundo os autores da pesquisa, estes perfis melódicos de som se encaixam com as diferentes características entre ambas as línguas europeias. Para a médica Kathleen Wermke, da Universidade Wurzburg, na Alemanha, que comandou o estudo, os recém-nascidos são capazes de produzir diferentes melodias de choro e preferem aquelas que se encaixam no padrão do idioma que escutam habitualmente.
A equipe de Kathleen gravou os choros de 60 bebês saudáveis, quando tinham entre três e cinco dias de vida. A metade deles de famílias francesas e a outra metade de grupos familiares alemães. O estudo detalhado das gravações permitiu comprovar a presença de diferenças muito claras nas melodias dos recém-nascidos.
A descoberta é coerente com outros trabalhos prévios que indicam que os fetos humanos memorizam sons do mundo exterior captados nos últimos três meses da gestação – período decisivo para o desenvolvimento do sistema nervoso – e que se adaptam às melodias da música e do idioma.