O relógio se aproxima das 18h quando a Avenida Beira-Rio, uma das artérias mais importantes do trânsito de Blumenau, pulsa da forma mais intensa. No lado esquerdo, inércia. As duas pistas destinadas a automóveis estão ocupadas por carros que, quando não estão parados, deslocam-se em velocidade de primeira marcha. Os que conseguem se movimentar estão à direita. Em intervalos de poucos minutos, os ônibus preenchem a pista vazia dos corredores exclusivos e liberam espaço nas estações de pré-embarque. Na calçada, pedestres e ciclistas, que conseguem boa velocidade para um horário de pico, dividem espaço e movem-se à margem do rio a caminho de casa.
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A cena se repete basicamente todo fim da tarde no trânsito de Blumenau e não é exclusiva à Avenida Beira-Rio. Ocorre de forma semelhante em vias próximas, como a Alameda Rio Branco, e também em pontos mais distantes, como a Rua Amazonas, principal acesso ao bairro Garcia, e o Morro da Companhia, ligação da Velha com o Bom Retiro.
Não é difícil entender as razões. Na cidade de Santa Catarina com a maior taxa de veículos por morador, a frota de Blumenau chegou este mês a 259,5 mil veículos – um carro para cada 1,36 habitante, segundo números do Departamento Estadual de Transportes de Santa Catarina (Detran-SC) e a estimativa populacional do IBGE. Há inclusive quase 50 mil veículos a mais do que condutores habilitados – estes somam 210 mil segundo dados do mesmo Detran-SC. A proporção de pessoas que usam carros no dia a dia, que em 2001 era de 42%, em 2015 saltou para 58%, fazendo a participação do transporte coletivo cair de 31% para 21%, segundo dados do Plano de Mobilidade de Blumenau.
O diretor-presidente do Seterb, Marcelo Althoff, reconhece que os congestionamentos já existiam em condições normais, mas defende que o período de obras em ruas como a República Argentina e Humberto de Campos agravaram a situação, exigindo “quase um plano de contingência por dia”.
Há três exemplos de situações mais críticas que agravam os congestionamentos na cidade. Os 10 primeiros dias do mês, quando há mais movimento no comércio. Os dias de chuva – como o último 12 de junho, Dia dos Namorados em que muitos jantares ficaram comprometidos pelo transito completamente parado com mais carros nas ruas. Ou quando algum veículo estraga em um ponto delicado – em dezembro do ano passado a cidade praticamente “parou” depois que um caminhão teve problema mecânico no Morro da Companhia, via de pista simples que é usada como rota alternativa para quem vai ou vem do bairro da Velha.
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Nesses casos, o Seterb atua com mais guardas de trânsito, presentes nas ruas desde mais cedo para medidas como liberação do corredor de ônibus na Rua Martin Luther e controle em cruzamentos problemáticos, como os da Rua São Paulo com a rua Indaial e com a Rua Carlos Rischbieter. Outro ponto que costuma receber atenção especial é o cruzamento das Ruas XV de Novembro com a Rua das Palmeiras e Rua Itajaí – esta última, via de entrada na cidade, costuma registrar filas de até dois quilômetros entre o fim da tarde e início da noite. O setor de Planejamento Viário acrescenta à lista de pontos mais delicados a BR-470 – para fugir da rodovia estrangulada, muitos motoristas acabam sobrecarregando vias como Rua Bahia, República Argentina e 2 de Setembro.
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Prefeitura estuda mudanças em ruas da área central
Além da maior presença de guardas em horários críticos, o monitoramento e a fiscalização por câmeras – que hoje permitem 90 posições diferentes e devem ter ampliação no ano que vem – são vistos pelo presidente do Seterb como aliados para mitigar o problema dos congestionamentos em Blumenau. As obras de infraestrutura, como o recém-entregue prolongamento da Rua Humberto de Campos ou a extensão da Rua Chile e a recuperação da Rua República Argentina são outras ações que tentam corrigir problemas como o da Rua Itajaí. Mas para o dirigente, a solução completa para este problema de mobilidade só se dará com mais estímulo ao transporte coletivo.
– Vamos pegar como exemplo São Paulo, com tantas obras viárias que foram feitas e o trânsito continua caótico. Eles lá optaram pelo rodízio. Cidades como Nova Iorque têm dificuldade para as pessoas chegarem à área central com o carro particular. É um modal do transporte coletivo ou de táxi e aplicativo. Estamos colocando corredores para fazer todo um circuito na região central da cidade porque quanto mais a gente estimular pessoas a usarem o transporte público, menos carro a gente tem na rua.
Um estudo de mudanças de circulação na região central da cidade está em análise há cerca de cinco meses pela prefeitura. Entre algumas ações estão previstas duas novas pontes – uma no Biergarten, para acessar a Avenida Beira-Rio, e outra na Praça do Estudante, ligando a região da lanchonete Farol com a Rua 7 de Setembro. Algumas inversões de sentido devem afetar ao menos cinco ruas, na região entre a Rua das Palmeiras e a Rua Antônio da Veiga.
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O diretor de Planejamento Viário, Julian Plautz, afirma que essas mudanças devem melhorar o deslocamento de carros e também tornar a região da Rua XV, onde hoje passam 15 mil carros por dia, mais calmas para pedestres e comércio. No entanto, ele confirma que essas medidas visam amenizar o problema. A solução, para ele, só com o transporte coletivo e mudança na mentalidade dos condutores para aderir mais a esse modelo e menos ao transporte individual.
FROTA
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Mudança passa por novo comportamento
A Semana Nacional do Trânsito, que ocorre até terça-feira, e o Dia Mundial Sem Carro, celebrado neste sábado, são vistos como oportunidades de reflexão sobre os problemas de mobilidade e do trânsito em geral. Para a especialista em Segurança no Trânsito Márcia Pontes, o fator cultural é a principal razão dos congestionamentos registrados na cidade. O alto poder aquisitivo e a preferência do blumenauense por se deslocar de carro ajuda a explicar o excesso de automóveis nas vias, sobretudo em intervalos de ida e volta do trabalho em horário comercial. A busca por obras, sozinha, não é a saída para resolver a questão.
– As obras, quando saem, já estão atrasadas. Não é construindo mais vias que se vai resolver. Assim como os ciclistas dizem: façam a ciclovia que os ciclistas aparecerão, basta abrir uma nova via que mais motoristas também aparecerão – compara.
Para Márcia, o uso racional do carro, com mudanças que permitam conhecer mais a cidade, caminhar mais e aderir a bicicleta, transporte coletivo ou carona solidária são os primeiros passos para a mudança de comportamento que pode resultar em menos filas e menos tempo desperdiçado em congestionamentos.
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