Na noite de segunda-feira (19), aconteceu a audiência pública convocada pela Comissão Especial da Saúde a fim de ouvir a reclamação dos moradores no que diz respeito a falhas no sistema público da cidade. Iniciada com atraso, além das reivindicações de praxe, o encontro foi marcado por críticas ao hiato na realização de concurso público, à falta de oposição ao governo, e à ausência de vereadores que não compareceram na reunião — dos 19, apenas oito estiveram presentes, sendo que três deles compõem a comissão.
Continua depois da publicidade
Acesse para receber notícias de Joinville e região pelo WhatsApp
Vereadores ampliam prazo de Comissão da Saúde de Joinville: “Identificamos erros graves”
Estiveram presentes na Casa, além dos parlamentares, a secretária de Saúde Tânia Eberhardt e outros profissionais que atuam na pasta, líderes comunitários, representantes de movimentos sociais e demais moradores. Por conta do projeto Minha Casa, Minha Vida que estava sendo votado, a audiência aconteceria no Plenarinho, mas como não coube todos os participantes no espaço, a discussão voltou ao Plenário.
A falta de medicamentos e materiais básicos foi um dos pontos mais levantados pelos munícipes. Conforme o advogado Ricardo Bretanha, quando questiona, a reposta da prefeitura é que os insumos não chegam por conta de problemas na licitação ou com fornecedor. Para ele, não tem cabimento não ter psicotrópicos nas unidades e que a gestão deveria ter outras alternativas para driblar contornar essas barreiras.
Continua depois da publicidade
Nelson Faria, cadeirante que faz parte da Associação dos Deficientes Físicos de Joinville (Adej), comentou que, quando Jean Rodrigues ainda era secretário da pasta, teve a medicação diosmina — utilizada para tratar patologias relacionadas à coagulação sanguínea — cortada sob o argumento de que o remédio não tinha efeito.
Por conta disso, Nelson diz que passou a comprar Diosmina na farmácia e reclama que o custo não é baixo e, por isso, teve de substituir por um mais barato. No entanto, o efeito não é o mesmo.
— Eu queria perguntar por que que eu comprando na farmácia faz efeito e dado pelo SUS não. Conversando com a minha médica, ela receitou outra medicação similar, mais fraca, e disse que não posso aumentar a dose porque, se aumentar, em vez de eu suar suor, eu vou suar sangue, porque afina o sangue. Diante disso, me deu outra medicação similar, mas estão voltando todas as minhas feridas — reivindicou.
Ao final da reunião, Tânia Eberhardt chamou uma profissional de farmácia que estava no local para conversar com Nelson, na tentativa de resolver o problema.
Continua depois da publicidade
Sim ao concurso público, não à OS
Jane Becker, presidenta do Sinsej e outros servidores que pediram direto à palavra destacaram o hiato de quase dez anos sem a realização de concursos públicos na Saúde. A questão é uma consequência direta para a falta de profissionais nas unidades de saúde, o que gera as filas, demora para consultas e até a falta de atendimento. Ela destaca que os servidores têm feito “milagre” para atender a demanda da população.
O sindicato chegou a protocolar um ofício junto ao Ministério Público, Tribunal de Contas do Estado e demais órgãos competentes exigindo a realização imediata de concurso público e o cancelamento do processo de transferência da gestão da UPA Sul e do Hospital Municipal São José para as Organizações Sociais (OS).
O historiador Rhuan Carlos Fernandes trouxe dados sobre a dengue na cidade, que beira os 20 mil casos e chegou a 22 mortes pela doença. O morador da zona Sul argumentou que Joinville é o terceiro município do país com maior índice de infestação do mosquito, no entanto não figura entre as maiores regiões metropolitanas.
— A gente está falando de município que tem problema com a dengue, com os hospitais, com filas. E é necessário falar do (hospital) Infantil também. Não é de responsabilidade da prefeitura, mas é o modelo de gestão que a prefeitura quer. Se esse modelo de OS não dá certo no Infantil, que tem quase dez horas de fila, por que daria certo nas outras unidades de saúde de Joinville? — questionou.
Continua depois da publicidade
Outro problema acarretado com o déficit no quadro de profissionais, segundo os munícipes, é a falta de segurança dos moradores e também dos profissionais de Saúde. Segundo Miguel de Oliveira, presidente da associação de moradores do Ulysses Guimarães, é comum que agentes da Guarda Municipal sejam acionados para o postinho do bairro, já que há episódios de desentendimento por causa da demora e falta de vagas.
Ausência de vereadores e falta de oposição
De 19 vereadores que ocupam as cadeiras da Câmara de Vereadores de Joinville, apenas oito estavam presentes na audiência: Ana Lúcia Martins (PT), Brandel Júnior (Podemos), Cassiano Ucker (União Brasil), Cláudio Aragão (MDB), Diego Machado (PSDB), Henrique Deckmann (MDB), Lucas Souza (PDT) e Pastor Ascendino (PSD) – três deles (Aragão, Brandel e Cassiano) fazem parte da Comissão de Saúde.

Para os moradores, a ausência desses parlamentares, principalmente da legenda do Novo, representa a falta de preocupação e indiferença aos problemas enfrentados na saúde.
Otávio Taborna ainda destacou que só escuta elogios por parte dos parlamentares ao prefeito, “mas não tem cobrança”.
Continua depois da publicidade
Tânia reclama do tempo resposta e repete discurso
Ao final das reivindicações dos moradores, Tânia Eberhardt teve o direto a resposta de dez minutos concedidos por Aragão, presidente da Comissão. O tempo foi estendido para 21 minutos, mas não foi suficiente para a secretária, que reclamou ser “injusto diante a tantos questionamentos”.
Durante a fala, reforçou que foi servidora pública há 33 anos e que, por este motivo, entende as reclamações da classe. Ela culpou a pandemia da Covid-19 pelos atrasos e defasagens no sistema público em todo país e, repetindo um discurso dado anteriormente, alegou ser a favor de concurso público, mas que o município ultrapassou o limite prudencial de despesas com pessoal e, abrir uma nova disputa agora, violaria a lei de responsabilidade fiscal.
Para a secretária, algumas falas mais inflamadas podem ter sido feitas pela aproximação do pleito eleitoral, quando “o sangue ferve um pouco mais, e isso faz parte”. Tânia voltou a dizer que a questão de saúde, principalmente com relação à dengue e baixa cobertura vacinal, também é de responsabilidade da população e que em dois meses à frente da pasta já conseguiu fazer alguns ajustes.
A ideia inicial dela era de apresentar dados do que já foi feito até então sob sua responsabilidade, no entanto, não conseguiu passar do primeiro slide por ter estourado o tempo de fala.
Continua depois da publicidade
— Eu não sou uma fada que pode resolver tudo nos 60 dias que estou à frente da Saúde. Algumas coisas eu não tiraria e não tiro a responsabilidade do governo, mas sempre lembrando que a saúde se faz pelas três esferas: municipal, estadual e federal. Precisamos fazer concurso público, sem sombra de dúvidas. Mas chegamos num limite prudencial. […] O meu papel como gestora é, amanhã, voltar pra secretaria e ver porque algumas dessas questões levantadas não estão sendo resolvidas — destacou.
O que esperar do relatório da Comissão
Até então, o que se tem de concreto por parte da Comissão são as visitas que foram feitas de forma surpresa às UPAs e as demais unidades de saúde de Joinville, além das oitivas a profissionais que ocupam cargos de chefia na pasta. Em primeiro momento, o vereador Cláudio Aragão chegou a levar à Casa a proposta de abertura de uma CPI para investigar o sistema público da cidade, mas não levou à frente.
CPI da Saúde não se concretiza e vereadores de Joinville optam por comissão de acompanhamento
Com um mês da Comissão Especial instaurada, o parlamentar chegou a dizer, em entrevista ao A Notícia, que haviam sido identificadas “falhas graves” na gestão da pasta. Cassiano Ucker, no entanto, ouvido pela reportagem no final da audiência, foi na contramão de Aragão e, em tom mais ameno, disse que o relatório tem como objetivo trazer apontamentos de melhorias ao governo Adriano Silva, sem necessariamente trazer críticas ou apontar culpados.
No próximo dia 26 de junho, completa-se dois meses da Comissão e o prazo para finalizar o documento se encerra. Após ser concluído, será encaminhado Ministério Público e também ao Poder Judiciário. Conforme o relator, sem adiantar informações, os dados levantados serão apresentados no dia 17 de julho.
Continua depois da publicidade
O principal problema detectado pela comissão não é novidade: a falta de profissionais.
— Nós também vemos algumas dificuldades em processos administrativos, no sentido de ter que ser oportunizado um maior número de atendimentos. E a gente viu algumas dificuldades que são levantadas devido à legislação, mas que nós vamos ter que aprender a dar voltas, porque a legislação não vai mudar em um curto espaço de tempo. Nosso relatório vai vir no sentido de corroborar com sugestões a curto, médio e longo prazo para a secretaria, a fim de que a gente oportunize mais saúde pra nossa população— explicou Cassiano.
Leia também
Falta de materiais atrasa cirurgia de pacientes internados em hospital de Joinville
Tânia assume Saúde com foco em postos e aberta a discutir OS no São José de Joinville