Celebrado nesta terça-feira, 10, o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio serve para refletir e mostrar que a vida é um bem precioso e devemos escolher valorizá-la em vez de desistir diante dos obstáculos. Os transtornos de humor, que incluem depressão ou bipolaridade, o abuso de álcool e drogas, e quadros de esquizofrenia requerem atenção especial, porque são considerados os maiores desencadeadores de tentativas e suicídios no mundo. Por isso, olhar para o próximo e perceber nele características que, em conjunto, podem dar sinais de que esta pessoa precisa de ajuda pode ser o primeiro passo para um suporte a quem necessita, e isso pode começar já na primeira infância.

Continua depois da publicidade

O desenvolvimento psíquico durante essa fase e a adolescência é extremamente complexo, porque o paciente geralmente não demonstra sinais tão claros quanto os adultos de que está doente e precisa de ajuda. Referência no atendimento de pacientes de até 15 anos com necessidade de algum tipo de acompanhamento psiquiátrico, o Hospital Infantil Dr. Jeser Amarante Faria, vivencia diariamente histórias de crianças e adolescentes que enfrentam problemas de saúde mental pelas mais diversas situações.

De acordo com Felipe Becker, psiquiatra e coordenador do Serviço de Internação Psiquiátrica do Hospital Infantil, no adulto é perceptível mais facilmente um quadro depressivo, por exemplo. Já na infância, a primeira possível demonstração de depressão está na perda de interesse de atividades que antes o paciente costumava gostar. Mas isso isoladamente não quer dizer muita coisa, no entanto, vale o alerta quando associado a outros sinais como aumento da irritabilidade, isolamento e falta de rotina.

10 de setembro: dia para falar sobre a prevenção do suicídio

​Onde encontrar ajuda para a saúde mental em Joinville

Continua depois da publicidade

— É muito sensível essa avaliação. É preciso entender como funciona o pensamento dessa criança e o que está acontecendo para ela agir assim. É importante que todo o contexto familiar seja analisado, porque muitas vezes a estruturação neuropsíquica se dá principalmente na primeira infância e a gente tem que considerar todos os fatores: genético, ambiental, traumas, funcionamento familiar e como a criança está lidando com as informações que está recebendo — aponta o médico.

Na visão dele, apesar de ainda serem necessários mais estudos na área um dos fatores que pode estar contribuindo para o crescente número de crianças e adolescentes que necessitam de acompanhamento psiquiátrico ou psicológico é o uso excessivo da tecnologia, como celulares, televisores, tablets e videogames.

Segundo o médico, em muitos casos, quando há algum indicativo relacionado a uma possível dependência desses aparelhos, quando retirados das crianças elas ficam agitadas e inseguras. Muitas delas passam horas a fio com as ferramentas tecnológicas e inclusive tem a rotina e o sono afetados por isso, o que pode desencadear mudanças comportamentais e emocionais. Dentre cerca de 70 pacientes atendidos e pesquisados este ano no hospital internados no setor, 92% fazem uso frequente e 73% deles passam mais de 8 horas conectados ao celular, por exemplo.

– A tecnologia está diretamente ligada com a questão de interação social, porque as pessoas com o aparelho celular na mão, por exemplo, estão juntas fisicamente, mas sem se relacionar. Então a criança vai se desenvolvendo e crescendo, entendendo o mundo de acordo com o que ela está tendo acesso, e para lidar com as questões dela fica sempre uma interrogação para o futuro. Isso pode trazer angústia, dificuldade, ansiedade, que é o perfil de quem tende a ter propensão para o isolamento e o próprio suicídio – explica.

Continua depois da publicidade

A tecnologia é uma dificuldade, talvez até um atraso no desenvolvimento emocional, porque ele dá a capacidade de enfrentamento da criança para a vida adulta. Então um dos caminhos é impor regras e limites, porque eu não permitindo esse isolamento pela tecnologia eu passo a enxergar melhor o meu filho e a dar o suporte que ele precisa

Criar uma rotina também ajuda no desenvolvimento cerebral da criança, uma vez que o mesmo se desenvolve até o início da vida adulta por volta dos 21 aos 25 anos, e a criança ainda não tem ela ainda não tem maturidade e autocontrole suficiente nesta fase, bem como naturalmente pode apresentar impulsividade e dificuldade na tomada de decisão.

— A gente percebe que é uma geração que está mudando o perfil e isso é uma dificuldade maior também para quem atende a infância, porque diferente de tratar o adulto é preciso entender qual seria o desenvolvimento esperado para cada idade. Por isso encaro o psiquiatra da infância como o protetor da criança e busco a confiança da família, pois se não tenho isso o tratamento não acontece e ela pular de psiquiatra em psiquiatra e quem perde é a criança — ressalta.

O Hospital Infantil de Joinville aposta no atendimento humanizado, no qual o paciente passa por avaliação clínica e é prescrito o tratamento de acordo com cada caso e durante o período de internação, tanto a criança ou adolescente quanto a família passam por acompanhamento psicológico e a alta acontece somente quando a criança atinge a estabilidade emocional.

— Apesar deste paciente sair do Hospital Infantil estável, a função é de proteger e reduzir ao máximo o risco (de uma automutilação ou mesmo tentativa de suicídio). Não é um tratamento definitivo, porque como essa criança ou adolescente está em fase de desenvolvimento, vai precisar de acompanhamento qualificado ambulatorialmente, com médico psiquiatra ou ajuda terapêutica de um psicólogo — explica.

Continua depois da publicidade

Com essa conexão em torno de restabelecer a rotina normal do público infanto-juvenil, a curva de desenvolvimento psíquico deste paciente muda, ou seja, com um tratamento e um segmento adequado, a equipe médica do hospital atende o objetivo de proteger a criança.

— Eu costumo dizer que o futuro dessa geração é o investimento na inteligência emocional, a criança pode ser super inteligente e ter um baita conhecimento, mas se ela não consegue se relacionar com outras pessoas ou lidar com o mínimo de frustração, ela larga tudo. Então buscar essa ajuda e levar o tratamento a série são alguns argumentos que a gente leva para os pais para evitar uma burrice psíquica, que pode levar não só a uma depressão avançada ou ao risco de suicídio, mas levar a pessoa ficar desatenta, aérea ou sem estímulo. É na infância e na adolescência que temos a chance de fazer a melhor prevenção — conclui Felipe Becker.

FIQUE DE OLHO NOS SINAIS

Como identificar sintomas que, combinados, podem ser indícios de depressão e de comportamentos suicidas:

CRIANÇAS

. Choro fácil

. Pensamento negativo preponderante

. Lapsos de memória

. Pensamentos catastróficos

. Baixa autoestima

. Disfunção alimentar

. Desregulação do sono

. Dificuldades de interação

ADOLESCENTES

. Mentiras e infrações compensatórias

. Ausência nas aulas

. Provocação aos professores e outras figuras de autoridades

. Baixo limiar a frustração

. Dificuldades para ouvir não

. Automutilação

. Colocar-se em situações de risco constantemente

. Isolamento

. Mudança abrupta de comportamento

ADULTOS

. Sentir-se triste, durante a maior parte do dia, quase todos os dias

. Perder o prazer ou o interesse em atividades rotineiras

. Irritabilidade

. Desesperança

. Queda da libido

. Disfunção alimentar e do sono (perda ou aumento de peso)

. Sensação de cansaço e fraqueza o tempo todo

. Baixa autoestima

. Ansiedade excessiva

. Dificuldade de concentração, de tomar decisões e de memória

. Pensamentos frequentes de morte e suicídio

FATORES DE RISCO

. Transtornos de humor (depressão; bipolaridade)

. Abuso de álcool e drogas

. Esquizofrenia

. Traumas emocionais

ATITUDES PROTETORAS

. Limitar o uso da tecnologia

. Praticar atividade física

. Promover adequação de rotinas

. Estimular a interação social

SAIBA O QUE FAZER PARA AJUDAR

. Ouça o pedido de ajuda com atenção e respeito

. Tenha empatia em entender os sentimentos da pessoa

. Demonstre preocupação e dê suporte emocional

. Evite perguntas indiscretas

. Converse com familiares e amigos

. Dê abertura para que a pessoa se sinta confortável em desabafar

. Ajude a pessoa a procurar atendimento especializado

FONTES: Manual para Profissionais da Saúde em Atenção Primária, da Organização Mundial de Saúde (OMS); secretarias da Saúde de Joinville e de Jaraguá do Sul; Hospital Infantil de Joinville; Ministério da Saúde.

Continua depois da publicidade

Setembro Amarelo: voluntários formam rede de apoio para prevenção ao suicídio em SC