A Venezuela vai se aproximando das cruciais eleições legislativas de 6 de dezembro, e o tempo passa com o opositor Leopoldo López preso por questões políticas desde fevereiro de 2014. Analistas como o argentino Héctor Schamis, professor do Centro de Estudos Latino-americanos da Universidade de Georgetown, identificam a situação venezuelana, sob o governo chavista de Nicolás Maduro desde 2013, como “o rompimento de uma linha divisória” que separa a democracia do autoritarismo.

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Nelson Jobim comenta veto da Venezuela a seu nome

Em meio a uma crise com desabastecimento de quase metade dos produtos básicos, inflação projetada em 200% para 2016 e retração econômica estimada em 10%, pesquisas de quatro institutos dão vantagem para a oposição nas eleições de dezembro, com margens que variam de 18 a 25 pontos percentuais.

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– Vivemos sob ditadura, ainda que muitos sigam cegos em relação a essa situação – disse a irmã de López, Diana López, consultada por ZH a respeito da possibilidade de enviar perguntas para ele na prisão de Ramo Verde. Diana disse que tentaria, mas que, “neste momento, não permitem entregas de documentos e correspondências” a seu irmão.

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Na semana passada, ocorreu um episódio que incrementa a discussão sobre o motivo para a prisão de López. O procurador Franklin Nieves, que fugiu da Venezuela para Miami, contou que o opositor foi condenado com provas falsas para ser afastado do “jogo político”.

– Quem fez a ata policial de apreensão de Leopoldo López foi Diosdado Cabello (presidente do Legislativo e número dois do chavismo), que dá as instruções no gabinete dos promotores – disse.

Desconforto na diplomacia brasileira

Nieves, um dos procuradores do caso, assegura: o general Manuel Bernal teria orientado a tramitação da ordem de captura contra López em fevereiro de 2014. Depois, López foi condenado a 13 anos e nove meses de prisão. Também aí teria havido conspiração oficial.

O Ministério Público venezuelano nega ter pressionado e forjado provas. A procuradora-geral, Luisa Ortega, define como “gerais e vagas” as denúncias de Nieves. Diz também que a pressão sobre o procurador teria se originado do Exterior e da oposição, com viés golpista.

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Héctor Schamis discorda:

– Há uma tentativa de Maduro se manter no poder. Na população, reina um cansaço com a corrupção, a perpetuação no poder e o autoritarismo.

O isolamento carcerário de López se intensificou depois que ele divulgou dois vídeos de dentro da prisão. No primeiro, em maio, faz uma manifesto e anuncia o início de uma greve de fome. No outro, em agosto, pendura-se na balaustrada de uma janela e grita, batendo nas grades. Cada vídeo tem pouco mais que três minutos e provocou inconformidade por parte do governo venezuelano.

– Há um ano e três meses, eu e 70 venezuelanos estamos presos por denunciar o Estado como corrupto, ineficiente, repressor e antidemocrático – diz no vídeo.

A alegação para a prisão de López é de que ele teria incitado a violência nos protestos de fevereiro de 2014, que deixaram 43 mortos. Detalhe: a maioria das mortes se deu pela repressão policial.

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O governo brasileiro centralizou no assessor especial para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, a condução das relações com os vizinhos. Trata do tema com cautela, para não interferir em assuntos alheios e preservar aliados. Um diplomata brasileiro fala em desconforto pelo “desencanto” dos colegas, que se sentiriam “desprestigiados”.

Outro foi mais específico:

– Não vem ao caso a forma como pensam López e outros presos políticos. Eles deveriam ter o direito de pensar do seu jeito em liberdade. Prisão política é algo intolerável, independentemente de o governo brasileiro ser mais ou menos alinhado ao do país onde isso ocorre. Esse é o pensamento de muitos diplomatas.

Outro elemento que envolve o Brasil é a rejeição ao ex-ministro Nelson Jobim para participar da observação internacional nas eleições parlamentares. Com essa decisão, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) desistiu de acompanhar o processo. E aumentaram ainda mais as dúvidas sobre a sua lisura.

A palavra dos ex-presidentes

Na quarta-feira, ex-presidentes latino-americanos pediram, em Madri, a anulação do processo contra o opositor Leopoldo López e reiteraram a necessidade de observadores internacionais nas eleições de dezembro. Os ex-presidentes estavam acompanhados pelo pai do opositor venezuelano, também chamado Leopoldo López, que agradeceu o apoio recebido e criticou a “indolência” dos governos vizinhos.

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O ex-presidente mexicano Felipe Calderón lembrou a declaração do procurador Franklin Nieves sobre a suposta falsidade da acusação. O peruano Alejandro Toledo disse que “o silêncio de ex-presidentes e presidentes os levará a serem julgados pela história como cúmplices do autoritarismo”.

No Brasil, sessão especial do Senado em maio dedicada a analisar a violação de direitos humanos na Venezuela foi marcada pela ausência de autoridades do Executivo. A Comissão de Relações Exteriores ouviu Lilian Tintori López – mulher de López -, Mitzy de Ledezma – mulher do prefeito de Caracas, Antonio Ledezma, também preso – e Rosa Orozco – mãe da estudante Geraldin Moreno, morta por efetivos da polícia após ter sido alvejada no rosto durante as manifestações contra o governo.