O ano era 1990, eu tinha dez anos. Meus pais recém tinham se separado, vivia com minha mãe e meus dois irmãos.
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Passávamos dificuldades financeiras. Dinheiro contado para aluguel e gasolina. Tive que deixar a escola particular por não termos dinheiro para pagar. Os finais de semana, principalmente de inverno, sempre rigoroso no Rio Grande do Sul, eram de família reunida. Mentira, família grudada. Passávamos os domingos os quatro no sofá assistindo televisão. Do início da manhã até o fim da noite. No sábado, tinha o Gugu.
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Tinha um programa específico me chamava muito a atenção. Era o Porta da Esperança. Silvio Santos lia as cartas com histórias das pessoas e depois uma porta se abria. Algumas vezes, sem nada. Outras, com aquele pedido especial que mudava a vida da pessoa. Eu desejei muito estar naquele quadro. Cheguei a mandar cartas com o nome da minha mãe sem ela nunca saber. Queria dar uma vida nova pra ela, pra nós.
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O Silvio era um bálsamo de diversão para a dona Vera. Trinta e poucos anos, divorciada, sozinha, com três filhos menores para criar e encaminhar no mundo. Um caso típico de mãe solo. Era bancária, trabalhava como caixa, muitas vezes no fim do dia “marchava”, como ela dizia, com a diferença no caixa. Aquilo era motivo para velório na nossa casa. Cada centavo fazia muita, mas muita falta.
Certa semana, passamos alguns dias sem ter o que comer. Restavam ovos e farinha na geladeira, vimos o Silvio Santos comendo bolo frito no domingo. Podia ser um lanche especial, mas era só o que tinha. Segunda, terça e etc foi assim também. Até ela receber o salário de novo.
Os programas do Silvio nos tiravam da realidade dura. Vai que um avião com dinheiro pousava na nossa sala repleta de cobertas e aconchego, não é mesmo? Queríamos muito. Comentávamos o que faríamos com o dinheiro. Para minha mãe, era sonho. Para nós, crianças, eram planos.
O Silvio leva consigo uma parte da minha infância. Da memória de união com a minha mãe, falecida há 25 anos. E hoje vi que estava no coração de muita gente também. Ele deixa um legado na comunicação que abriu portas e deu espaço para famílias como a minha. Um afago de entretenimento que acolhia quem passava dificuldade.
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Obrigada, Silvio Santos, por fazer crescer em mim a esperança.
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