“Foram momentos difíceis”. Essa foi a primeira frase dita pelo caminhoneiro Renato Varela de Oliveira, 43 anos, ao receber o telefonema do Grupo RBS ainda no Hospital Carolina Lupion, de Jaguariaíva, no Paraná, na manhã desta sexta-feira.
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Ele ficou quase cinco dias preso às ferragens do caminhão que dirigia após descer duas ribanceiras na rodovia PR-151, na madrugada do último domingo. Natural de Santa Catarina, mas morador de São Sebastião do Caí, no interior do Rio Grande do Sul, Oliveira disse que chovia no momento do acidente.
A carga de laranjas que deveria chegar à cidade de Harmonia (RS) ficou espalhada na volta do veículo acidentado. Uma parte dela rolou para o interior da cabine. Com as pernas presas às ferragens, o caminhoneiro alcançou frutas para se manter vivo. Mas o estoque durou pouco. Dois dias depois, sua mão não encontrava nada.
De terça até o final da tarde de quinta-feira, com a garganta fechada e com muitas dores, Oliveira apelou para a religião para suportar as dificuldades. Confira trechos da entrevista concedida por telefone a Zero Hora:
Grupo RBS – Como foi o acidente?
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Renato Varela de Oliveira – Eu voltava de São Paulo. É uma viagem que faço toda a semana para entregar cargas de frutas. Queria ter saído às 18h (de sábado), mas acabei pegando a estrada às 21h. Aquele trecho tem curvas complicadas e, como chovia na hora, o caminhão deslizou na pista. Tentei segurar, mas acabei descendo o barranco. Desci duas ribanceiras e o caminhão parou num lugar praticamente inóspito. A cabine praticamente despedaçou. Era por volta de 1h15min (de domingo).

Grupo RBS – Você estava cansado no momento do acidente?
Oliveira – Um pouco. Pretendia parar para descansar mais à frente. Mas naquela região há poucos postos de combustíveis. O sinal de celular é péssimo, não conseguia contato com ninguém. Via os veículos passando na estrada, mas, daquela altura, era muito difícil alguém enxergar. Choveu em dois dias em que fiquei preso. Ao lado do local do acidente, tinha um arroio e, quando chovia, a água subia até o pescoço.
Grupo RBS – E como você se sentia preso às ferragens?
Oliveira – Achei que não ia sobreviver. Sentia muita dor. Quebrei duas costelas. Como as laranjas caíram para a cabine, conseguia comê-las, pois era fácil descascá-las com as mãos. Porém, a partir da segunda noite, não conseguia mais alcançá-las. Mas na hora da fome a gente faz de tudo. Posso dizer que as laranjas foram a minha salvação.

Grupo RBS – Como encontraram o senhor?
Oliveira – Como eu saí no sábado à noite, no mais tardar chegaria ao Rio Grande do Sul na segunda-feira de manhã. Como eu sumi, saíram à minha procura. Achavam que eu pudesse ter sido vítima de assalto, sequestro… Sorte que eu recém tinha passado pela divisa do Paraná com São Paulo, então eles conseguiram achar uma referência. Eram meu patrão, familiares e mais pessoas que ajudaram nas buscas, além dos bombeiros.
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Grupo RBS – O que aconteceu quando você percebeu que eles estavam por perto?
Oliveira – Ouvi as vozes deles. Tentava gritar, mas já estava com a garganta fechada. Daí comecei a bater na lataria do caminhão, fazer barulho. Quem me encontrou foi o meu patrão. Percebi de imediato que era ele. Depois disso foram mais três horas para me retirarem das ferragens.

Grupo RBS – Qual foi sua reação?
Oliveira – Foi um alívio total. Agradeci a Deus. Todo o tempo em que fiquei preso me apeguei em reza. Minha família é muito religiosa. Já considero o meu patrão como parte dela, trabalho com ele há 10 anos. Graças a Deus não era a minha hora.
Grupo RBS – E você pretende deixar de viajar?
Oliveira – Não tenho como abandonar. Vou seguir viajando, talvez tendo mais cuidado a partir de agora. É essa a minha vida.