Vender mais ou evitar abrir o freezer? Está cada vez mais difícil agradar o chefe da peixaria. Marcelo Jacques tem um box no Mercado Público de Florianópolis e é chamado de “sarna” pelos funcionários, porque fica o dia inteiro pedindo para fecharem a porta do refrigerador:

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– É uma briga, né? Tem que ficar o dia todo neles, explicando que tem que fechar. Muito cara a luz, né? Não só a nossa aqui, a de casa a de todos os nossos clientes. 

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A maior parte da energia consumida no Brasil, cerca de 70%, vem de usinas hidrelétricas. Só que se os reservatórios estão baixos, falta água, falta força e as usinas não produzem tudo o que podem. A falta de chuvas foi maior no Sudeste e o Centro-Oeste do país, justamente onde estão os grandes reservatórios.

Mas o problema não fica limitado a essas regiões, já que a geração e transmissão de energia funcionam dentro do chamado Sistema Interligado Nacional (SIN). 

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O diretor-presidente da Celesc, Cleicio Poleto Martins, explica que não existe uma usina principal em um determinado estado: 

– Por exemplo, Itaipu é a maior usina elétrica do mundo e ela distribui energia elétrica para o Sul, para o Sudeste, para o Centro-Oeste. Aqui em Santa Catarina com a divisa do Rio Grande do Sul ou com Paraná temos também outras usinas hidrelétricas, mas não tão grandes capazes de fornecer energia pra todo o Estado. 

Com os reservatórios se esvaziando, o Brasil passa a acionar mais as termoelétricas. O custo de geração de energia nessas usinas é maior porque a produção é pela queima de combustíveis ou outras fontes, como madeira, por exemplo. Clarice Campelo de Melo Ferraz é professora da Escola de Química da UFRJ e diretora do Instituto Ilumina. Ela explica que a geração termoelétrica coloca o país na contramão do mundo. 

– Além de cara, ela é extremamente poluente e a gente vê aí iniciativas ao redor do mundo todo querendo fazer o que: adotar incentivos, mecanismos, até normativos que impeçam ou pelo menos limitem a geração muito poluente. A gente está falando de toda essa eletricidade contratada de forma emergencial a preço, 10, 20 vezes mais elevados do que se tivesse sido planejado corretamente anteriormente – pondera a professora. 

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O aumento da energia vem estampado na conta que chega todo mês. Quando a bandeira é vermelha, o aumento é o mais pesado e ela ainda tem dois patamares. A situação está tão complicada este ano que bandeira vermelha patamar 2 ficou ainda mais cara, com um reajuste de 52%. A taxa foi de R$ 6,243 por 100 kWh para R$ 9,49. Mas o aumento não acabou por aí. O que era muito ruim, piorou. O governo criou a bandeira de escassez hídrica. Um novo adicional de R$ 14,20 para cada 100 kWh, que equivale a mais ou menos o consumo de uma geladeira ligada no mês. 

A conta de luz fica mais cara para todo mundo, inclusive para quem produz. Quase metade do custo da caixinha do leite é energia. Mais de 30% do custo do frango é para pagar o gasto com energia. Na carne, 34% do custo é da conta de luz. No pacote de cimento, 25% do custo é da energia. E a conta não é a única consequência da pior seca dos últimos 91 anos no Brasil. 

Os especialistas alertam para uma situação ainda pior, faltar energia. Para o professor Fabiano Ferreira Andrade, doutor em Planejamento Energético, o plano B do país hoje seria o do racionamento: 

– Infelizmente, temos uma chance muito grande de passar por um processo de racionamento como já aconteceu no país. O aumento de energia seja por bandeira tarifária, demora um pouco. Se a gente vai para o posto de combustível abastecer e olha o preço da bomba a gente tem um impacto, a gente vai lá e talvez a gente deixa de fazer um passeio, circula menos. Não temos esse efeito em casa, a gente não chega ali no disjuntor na entrada das nossas casas e vê o preço da energia ali. Agora, vou reabastecer a energia da minha casa. Não existe esse aspecto. Então, demora muito para as pessoas perceberem isso – avalia. 

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A professora Clarice ainda acrescenta: 

– Pra deixar bem claro o que está acontecendo, a gente está flertando com o caos social. Se a gente não conseguir encontrar formas de equilibrar e de atender essa demanda, a gente vai ter apagões, que ao contrário de 2000 e 2001 não estão sendo gerenciados. 

O governo federal diz que não haverá racionamento de energia, como ocorreu em 2001. E, por enquanto, faz um apelo por uma redução de consumo. 

As alternativas que temos para a geração de energia

A solução para o futuro tem a engenharia que se aprende na infância. O catavento imita a técnica dos moinhos, que aproveitam a força do vento para fazer girar as pás e produzir uma energia renovável e limpa. A energia eólica representa 10,9% da matriz elétrica brasileira. 

Os maiores parques estão na região Nordeste, mas Santa Catarina também investe nessa energia. Em Água Doce fica o maior conjunto eólico do Estado, com 109 aerogeradores, suficientes pra abastecer aproximadamente 500 mil habitantes. 

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A energia solar é outra fonte renovável de geração energética. As placas brilhantes nos telhados não causam mais estranheza. Santa Catarina ocupa a 7ª posição no ranking que avalia a produção de energia solar entre os estados, conforme a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar). 

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Segundo o professor Ricardo Rüther, especialista em energia solar fotovoltaica, em Santa Catarina um telhado solar que se paga em torno de quatro a cinco anos, gera energia por cerca de 30 anos. 

– Então ele vai gerar energia seis vezes mais do que você pagou pra investir nele. É a fonte mais econômica, mais barata que temos hoje no Brasil inteiro e aqui em SC também – afirma. 

Apesar do avanço e do mercado em expansão, a energia solar ainda representa apenas 2% da matriz elétrica do país. As energias renováveis ganham espaço, mas em SC representam menos de 5% da capacidade de geração. 

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– As fontes solar e eólica elas servem muito bem para complementar e mitigar o risco hídrico. Então, se nós tivéssemos adotado a energia solar numa escala maior ainda do que a gente já adotou até hoje teríamos mitigado esse problema que temos até agora. Toda a energia solar que você botar no telhado você acaba economizando água lá no reservatório da usina hidrelétrica – conclui Rüther. 

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