Os questionamentos foram centrados no modo de atuação do ministro e não são alheios às atividades do Supremo. Mas o que acontece desta vez ultrapassa questões do meio jurídico.

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Ainda que não tenha um significado financeiro expressivo, o gasto com diárias pagas ao ministro Joaquim Barbosa, durante o período em que fará duas palestras na Europa, arranha a imagem do homem que saiu do processo do mensalão como paladino da moralidade e da ética. É dispensável que se discuta a legalidade de tal concessão, porque certamente o ministro recorreu a um subsídio sustentado por norma reguladora das funções públicas. Também não é preciso que se trate da necessidade ou não do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) contar com tal ajuda, considerando-se sua remuneração como chefe da mais alta Corte do país.

O que o episódio suscita, pelo seu aspecto negativo, é a comparação com casos semelhantes, envolvendo autoridades que provocaram constrangimentos e desencadearam duras avaliações críticas. As dúvidas sobre as diárias oferecem um componente novo. Não se trata, com o questionamento do pagamento, de abordar mais uma vez a atitude de alguma figura pública reincidente por desrespeitar o decoro de suas funções. O ministro em férias tem o privilégio de desfrutar da admiração da maioria da população brasileira, em consequência da forma categórica com que defendeu seus pontos de vista no julgamento do mais rumoroso caso de corrupção da política brasileira. O presidente do STF tem o benefício e o ônus dessa distinção. É um exemplo de integridade a ser preservado, para que cidadãos comuns não se vejam frustrados por atitudes incoerentes com uma imagem pública inatacável.

O respeito ao ministro não significa unanimidade, pois seu comportamento, quando da atuação como relator do mensalão, provocou discordâncias inclusive entre juristas, além das previsíveis reações políticas. Os questionamentos foram centrados no modo de atuação do ministro e não são alheios às atividades do Supremo. Mas o que acontece desta vez, com as interpretações em torno das 11 diárias, ultrapassa questões restritas ao meio jurídico. Joaquim Barbosa se torna personagem de uma controvérsia quando se encontrava em férias, interrompidas para que sua estada na Europa seja aproveitada para as palestras, nos dias 24 e 29 de janeiro, em Paris e Londres. O que contribui para as dúvidas em torno do assunto é o fato de que os dois eventos não constavam da agenda oficial do ministro, que deverá falar sobre a experiência das transmissões ao vivo das sessões do Supremo e sobre o funcionamento da Corte.

As interrogações que o caso provoca merecem resposta: por que Barbosa saiu oficialmente em férias, sem previsão das conferências, e por que vai dispor de 11 diárias nesse período, se o tempo entre um acontecimento e outro é de cinco dias? O ministro retorna a Brasília no início de fevereiro, quando poderá esclarecer as dúvidas, em respeito principalmente aos que se inspiram em seus atos como exemplos de coerência e de transparência.

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