Paisagens que há pelo menos 60 anos faziam parte do cotidiano de Santa Catarina começam a reaparecer nos cenários de diversas cidades. De Campos Novos, no Oeste, a Florianópolis, no Litoral – inclusive na Serra do Tabuleiro -, árvores invasoras de outros países, prejudiciais para a biodiversidade, foram, estão sendo ou serão substituídas por vegetação nativa de cada região. A Capital apresenta os exemplos mais visíveis dessa mudança.
Continua depois da publicidade
Pínus e eucaliptos que sombreiam a SC-406, que liga o Rio Vermelho à Barra da Lagoa, começam a ser retirados no ano que vem. Além disso, a mesma rodovia, no costão do Morro das Pedras, no Sul da Ilha, já não tem mais as casuarinas, mais conhecidas como chorões pelos moradores. Ali, em alguns pontos, já é possível ver o mar sem a cortina de árvores frondosas, mas altamente perigosas.
Pinus continuam crescendo no Parque Rio Vermelho, mas serão cortados. Foto: Jessé Giotti / Agência RBS
Florianópolis possui ações de dois órgãos ambientais para dar fim às invasoras. A Fundação Municipal do Meio Ambiente (Floram) já iniciou a retirada de 700 árvores na unidade de conservação municipal do Parque da Lagoa do Peri – desde o costão do Morro das Pedras até o início da praia da Armação. Mas o projeto maior está com a coordenação da Fundação Meio Ambiente (Fatma). Depois de estudos detalhados do impacto das exóticas para a biodiversidade, o órgão aguarda para abrir licitação que escolherá a empresa responsável por derrubar o equivalente a mais de 600 campos de futebol de pínus, eucaliptos e outras árvores estrangeiras plantadas no Parque do Rio Vermelho, unidade de conservação estadual.
O valor mínimo do processo ficará em R$ 5 milhões. De acordo com o tenente-coronel Márcio Luiz Alves, chefe do Parque do Rio Vermelho, o termo de referência para a retirada das árvores será publicado depois da temporada e próximo à inauguração da duplicação da SC-403, que liga a SC-401 ao bairro Ingleses. A intenção é evitar transtornos para as comunidades que vivem no entorno do parque.
Continua depois da publicidade
Por esse motivo, o carregamento das árvores será feito à noite e o Departamento Estadual de Infraestrutura (Deinfra) vai determinar o peso e número de caminhões que irão transitar por dia para o escoamento do material. Uma ação que deve levar dois anos para ser finalizada e, por esse motivo, requer planejamento.
– Essa não é uma licitação tradicional. Precisamos considerar todas as variáveis. Os valores arrecadados serão investidos no parque – garante Alves.
Com vegetação nativa restaurada, é possível que grande parte da área seja coberta de plantas rasteiras. Estima-se que as árvores mais altas terão cerca de seis metros de altura. Será um novo Parque do Rio Vermelho.
Recuperação eficaz
A primeira experiência da Fatma para a retirada das árvores invasoras deu certo. Segundo a bióloga Beloni Terezinha Pauli Marterer, em 2005 foram retirados pinus que estavam no meio das araucárias, plantas nativas do Parque Estadual do Rio Canoas, em Campos Novos. O número de árvores era menor do que no Parque do Rio Vermelho, mas a vegetação conseguiu se reconstituir naturalmente e o pinus foi extinto.
Continua depois da publicidade
O mesmo deve acontecer na unidade de conservação estadual da Capital. A fase inicial de restauração da vegetação deve levar cinco anos. No entanto, o Parque já apresenta espécies nativas que lutam para sobreviver no meio dos pínus.
– Essa área (Parque do Rio Vermelho) era de florestas baixa, com dunas com ou sem vegetação rasteira, com banhados. Na década de 60, houve iniciativa de testar espécies exóticas para a silvicultura, como uma agricultura de árvores – explica a bióloga.
Beloni Marterer comemora crescimento da nativa vassoura vermelha no Parque Rio Vermelho. Foto: Jessé Giotti / Agência RBS
Em 1990, começou-se a questionar a presença das plantas. Em 2007 o parque foi transformado em Parque Estadual do Rio Vermelho e uma legislação federal passou a proteger o espaço. O conceito “proteger” significa “garantir a biodiversidade nativa da região”. Por esse motivo, iniciaram-se estudos em todas as unidades de conservação para a retirada das exóticas, que impedem o crescimento das nativas.
Continua depois da publicidade
A segunda que terá vegetação retirada será a do Rio Vermelho, mas a intenção é que todos os parques do Estado passem por esse processo. O da Serra do Tabuleiro, que passou pelo mesmo processo de plantio de exóticas em algumas áreas, é um deles. Segundo a Fatma, após concluir o processo do Rio Vermelho, será iniciado o processo na Serra do Tabuleiro e no Parque Fritz Plaumann.
Paisagem de 60 anos atrás
Em Florianópolis, algumas espécies de árvores do Parque do Rio Vermelho também foram plantadas na mesma época em outros locais, como no Morro das Pedras. As casuarinas do costão têm a mesma idade das que estão presentes no parque estadual. Com grande poder de dispersão das sementes, as exóticas plantadas nessas regiões começaram a crescer em outros pontos da Ilha. O Morro da Galheta, no Leste da Ilha, ficou tomado de pínus.
Por esse motivo, o projeto piloto para retiradas dessas árvores pela Floram iniciou pelo Parque da Lagoa do Peri, mas será expandido para outras áreas. Com lei aprovada na Câmara em 2012, a Floram pode executar a retirada com mais facilidade. As 700 primeiras árvores retiradas serão doadas para o Grupo de Apoio à Prevenção da Aids (Gapa). As outras serão entregues a qualquer entidade que precisar e tiver interesse em vender o material.
– Fazer isso é uma necessidade. As exóticas fizeram sumir a gralha-azul do Sul da Ilha, porque ela não tem mais alimento – revela João da Luz, diretor de gestão ambiental da Floram.
Continua depois da publicidade
No local das exóticas, 2.800 mudas de plantas nativas serão plantadas. O biólogo Danilo Funke diz que as novas árvores do costão do Morro das Pedras terão cerca de um metro e meio de altura, por ser área próxima ao mar. Não irão crescer como as casuarinas.
– A paisagem voltará a ser como era antes – comenta.
Funke conta que seis projetos já foram executados na região da Lagoa do Peri para recuperação de áreas com plantas nativas. Todas deram certo. A aroeira-vermelha e as pitangueiras são as que mais se adaptam ao ambiente. Para ele, no entanto, a maior concentração de exóticas está justamente no Morro da Galheta e em áreas particulares no entorno das dunas da Lagoa da Conceição. Por esse motivo, um decreto assinado pelo prefeito Cesar Souza Júnior deve possibilitar que a Floram entre em propriedades privadas para a retirada das exóticas.
Saiba mais
A Fatma é responsável pela gestão de 10 unidades de conservação no estado de Santa Catarina. As unidades de conservação são espaços territoriais destinados a conservação da biodiversidade e são regidas pela Lei Federal Nº 9.985 de 18 de julho de 2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC; o Decreto federal Nº 4.340 de 22 de agosto de 2002 que regulamenta a Lei Nº 9.985/00 e ainda a Lei Estadual Nº 14.675, de 13 de abril de 2009 que institui o Código Estadual do Meio Ambiente e que contem o Sistema Estadual de Unidades de Conservação.
A Lei do SNUC traz no Art. 31. É proibida a introdução nas unidades de conservação de espécies não autóctones (não nativas daquele ecossistema).
Continua depois da publicidade
§ 1o Excetuam-se do disposto neste artigo as Áreas de Proteção Ambiental, as Florestas Nacionais, as Reservas Extrativistas e as Reservas de Desenvolvimento Sustentável, bem como os animais e plantas necessários à administração e às atividades das demais categorias de unidades de conservação, de acordo com o que se dispuser em regulamento e no Plano de Manejo da unidade.
Lei municipal
Lei 9097/2012 – Institui a política municipal de remoção e substituição de pinus, eucalyptus e casuarina spp por espécies nativas no município de Florianópolis e dá outras providências.