No Brasil, os mais importantes movimentos sociais e políticos sempre tiveram algum envolvimento da classe artística. Músicos, atores e intelectuais marcharam contra a ditadura e nos comícios por Diretas Já.

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Nas manifestações de 2013, não há um nome à frente das reivindicações – seja pela incipiência do movimento ou pelo desejo de horizontalização da hierarquia.

Em movimentos políticos anteriores, classe artística já serviu como porta-voz

A rejeição por líderes e a fragmentação do movimento podem explicar a dificuldade em associar um artista às diferentes causas que estão sendo defendidas. Ainda que alguns grupos tenham tomado a frente no diálogo com governantes – como, em um primeiro momento, o Movimento Passe Livre, em São Paulo -, não há representantes. Para o professor Luís Augusto Fischer, essa iconoclastia é uma das características da geração que puxou o movimento.

– A fragmentação é uma virtude da internet, mas um limite das passeatas. Não consigo ver qualquer necessidade por parte dos manifestantes de ter uma figura de referência, mas acho que a melhor coisa que poderia acontecer seria aparecerem representantes, mesmo que autoescolhidos. Porque, sem interlocução, não há com quem conversar. E a essência da vida em sociedade é ter cara, saber com quem falar – diz Fischer.

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Quando 1 milhão de pessoas foram à Candelária, no Rio de Janeiro, em 1984, pedir por eleições diretas para presidente, Fafá de Belém tornou-se a voz do país. Ficou célebre a imagem da cantora liberando uma pomba branca antes de cantar Menestrel das Alagoas. Daquela época, a lição que tirou é de que é preciso organização.

– Sem liderança e com tantas reivindicações, o movimento pode se perder. Ou se organiza e se tem consciência da importância deste momento ou começa a descambar para saques e violência, que é o que não queremos em hipótese alguma – diz Fafá. – É hora de as lideranças políticas refletirem suprapartidariamente sobre o clamor das ruas.

Artistas voltam às ruas para tomar parte nos protestos

Circula na internet um vídeo, produzido por Biel Gomes, que traz imagens dos protestos em Porto Alegre ao som da música Reinação, do mais recente disco da Apanhador Só, Antes que Tu Conte Outra. O vocalista Alexandre Kumpinski reconhece que a banda tem potencial para virar trilha sonora deste momento, contudo rechaça qualquer protagonismo do grupo no movimento.

– É bom que as pessoas percebam a conexão entre o nosso disco e as manifestações. Em momentos como este, é necessário que a arte se envolva. De que adianta uma arte que não se comunica com o que está acontecendo à sua volta? Torna-se estéril, vira só entretenimento. E não pode ser – avalia Kumpinski, para quem a nomeação de um porta-voz “não vai chegar a acontecer”. – Gostaria de ver os artistas indo para as manifestações e fazendo com seus atos o que as músicas só podem propor.

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O músico Zumbira Silva, da banda Zumbira e os Palmares, convocou um misto de apresentações culturais e protesto para este sábado, às 17h, na Redenção. Ele acredita ser próprio do artista o questionamento:

– No momento em que as coisas estão se definindo, quando não se sabe para que caminho se vai, a gente (os artistas) tem esse papel. (O fato de não ter líderes) É natural de um movimento que está começando, o processo é assim. No começo, pode parecer confuso, caótico, mas é aquela velha frase: “Confundindo para esclarecer”.